Dívida com a União: governo federal autoriza Minas a deixar o RRF e aderir ao Propag

Despacho publicado no Diário Oficial da União (DOU) desta segunda-feira (22) é um dos passos cruciais para Minas renegociar dívida de quase R$ 180 bilhões

Nota assinada no Ministério da Fazenda permite a adesão de Minas ao Propag

O governo federal autorizou, nesta segunda-feira (22), a saída de Minas Gerais do Regime de Recuperação Fiscal (RRF) e a consequente entrada no Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag). O despacho foi assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), no Diário Oficial da União.

A medida autoriza o ingresso do estado no programa que refinancia uma dívida de quase R$ 180 bilhões de Minas Gerais junto à União. O texto cita que a adesão recebeu o aval do ministério a partir do pedido formal movido pelo Executivo Estadual, autorizado previamente pela Assembleia Legislativa (ALMG).

No início de novembro, o governador Romeu Zema (Novo) enviou ao governo federal o pedido formal de adesão ao Propag junto a uma lista de ativos que o estado pretende incluir nas negociações de refinanciamento da dívida com a União.

O Propag foi estabelecido via Projeto de Lei Complementar assinado pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), aprovado no Congresso em dezembro de 2024, sancionado por Lula em janeiro e regulamentado em abril. O programa determina o parcelamento do pagamento da dívida em 30 anos e estabelece mecanismos para reduzir os juros cobrados mensalmente. Hoje, o valor é indexado pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) — que determina a inflação — mais 4% ao ano.

Se os estados se adequarem aos mecanismos, é possível reduzir os juros apenas ao índice inflacionário. Para tanto, o governo Zema precisou autorizar, na Assembleia, um pacote de projetos que autorizam a desestatização de ativos que viabilizam o abatimento de ao menos 20% da dívida — uma das prerrogativas para eliminar pontos percentuais de juros.

Na lista enviada pelo governo estadual à Brasília, Minas incluiu R$ 96,6 bilhões em ativos, o que é quase três vezes mais que o necessário para atingir os 20%. Eles foram divididos da seguinte maneira:

  • Imóveis R$ 1,9 bilhão
  • Créditos do Sistema Comprev - R$ 6,5 bilhões
  • Juros referentes à ação do Fundef - R$ 10,8 bilhões
  • Recebíveis de compensações minerais - R$ 18 bilhões
  • Recebíveis de compensações hídricas - R$ 3,1 bilhões
  • Fundo Especial do Petróleo (FEP) - R$ 1,4 bilhão
  • Transferências da Lei Kandir - R$ 2,9 bilhões
  • Cota-parte do Fundo de Participação dos Estados (FPE) - R$ 30,1 bilhões
  • Créditos da dívida ativa estadual - R$ 2,6 bilhões
  • Participações na Cemig - ATÉ R$ 13,5 bilhões
  • Participações na Codemge - R$ 4,5 bilhões
  • Participações na MGI - R$ 1,2 bilhão

Por força de um decreto presidencial assinado por Lula em outubro os prazos para discussão acerca do abatimento da dívida com a federalização de ativos estaduais no Propag foram prorrogados. Inicialmente o limite era o fim deste ano, mas o período foi estendido até dezembro de 2026. Até lá, Minas e a União negociarão quais ativos da lista serão usados para amortizar o débito.

Dentro do Propag, o Governo de Minas já pode começar a pagar as parcelas da dívida com a redução dos juros, com previsão de começar a reduzir o estoque bilionário do débito em cerca de três anos, como explicado à Itatiaia pelo secretário de Estado de Fazenda, Luiz Cláudio Gomes.

Em 2026, Minas planeja pagar R$ 5,5 bilhões da dívida com a União. O valor é um cálculo de início da trajetória do estado no programa, que prevê parcelas mais baixas nos primeiros anos. Por conta das cifras reduzidas, o estoque devido à União não diminui imediatamente.

O que é o Propag

O Propag foi criado a partir das dificuldades encontradas pelo governador Romeu Zema (Novo) em aprovar a adesão de Minas Gerais ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) na Assembleia Legislativa (ALMG). Principal pauta do Executivo Estadual para lidar com a situação da bilionária dívida com a União, a medida foi considerada excessivamente austera pelos parlamentares e não caminhou na Casa.

O RRF foi instituído durante a presidência de Michel Temer (MDB) como uma forma de adequação orçamentária dos estados endividados. Durante nove anos de vigência do regime, os estados precisam conter investimentos, limitar os reajustes salariais dos servidores e congelar novos concursos para o funcionalismo público, por exemplo.

Sem conseguir aderir ao regime via Legislativa, Zema conseguiu o ingresso via Supremo Tribunal Federal (STF) em 2024. Minas, então, se somou a um grupo formado por Goiás, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, todos operando sob o RRF. Paralelamente à empreitada jurídica do governador, membros da oposição na Assembleia, o presidente da Casa, Tadeu Martins Leite (MDB), e o então presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), começaram a costurar o que viria a ser o Propag.

O projeto de lei complementar que propunha a criação do Propag foi aprovado no Congresso Nacional em dezembro de 2024, sancionado parcialmente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em janeiro do ano seguinte e regulamentado em abril.

O programa prevê a criação de condições para que os estados endividados com a União consigam parcelar o pagamento do débito em até 30 anos. Neste contexto, o Propag estabelece mecanismos para a redução dos juros cobrados sobre as parcelas, hoje calculados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) — que estabelece a inflação — mais 4% do estoque da dívida ao ano.

O ingresso no Propag deve ser decidido pelos estados até o fim deste ano e pode ser feito em diferentes modelagens, todas elas com a possibilidade da redução dos juros reais com a eliminação dos quatro pontos percentuais cobrados além da inflação.

O modelo escolhido pelo governo mineiro e em discussão com um pacote com mais de uma dezena de projetos enviados à Assembleia prevê a redução de dois pontos percentuais a partir do abatimento de ao menos 20% do estoque da dívida. Hoje, Minas deve cerca de R$ 175 bilhões à União e, portanto, precisaria pagar R$ 35 bilhões para atingir seu objetivo.

Esse pagamento pode ser feito a partir da federalização de ativos estatais para amortizar a dívida com seu repasse ao governo federal ou via privatização dos bens com uso do recurso para o abatimento do débito. Neste contexto estão os polêmicos debates de venda de imóveis do estado e da Copasa e da federalização da Codemig, há meses monopolizando a discussão no Legislativo mineiro.

Outro ponto percentual pode ser abatido com o compromisso de que a economia obtida com essa redução de juros seja reinvestida no estado. O uso do valor que não será pago em forma de dívida deve, portanto, ser aplicado em ações de segurança pública, ensino profissionalizante, infraestrutura e outras áreas nevrálgicas da estrutura do estado.

Por fim, mais um ponto percentual pode ser suprimido com a contribuição com o Fundo de Equalização Federativa. Instituído pelo próprio Propag, essa medida foi tomada como uma forma de negociar a aprovação do texto no Congresso junto a parlamentares de estados que não estão em dívida com a União e que viam no programa de refinanciamento uma iniciativa de favorecimento das unidades federativas em débito. Os valores destinados ao fundo serão redistribuídos entre os estados do país.

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Repórter de política da Itatiaia, é jornalista formado pela UFMG com graduação também em Relações Públicas. Foi repórter de cidades no Hoje em Dia. No jornal Estado de Minas, trabalhou na editoria de Política com contribuições para a coluna do caderno e para o suplemento de literatura.

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