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Em xeque na ALMG, referendo sobre Copasa está na Constituição de MG há mais 20 anos

Proposta do governador Romeu Zema (Novo) prevê a retirada de artigos incluídos na Constituição em 2001, quando o estado era governado por Itamar Franco

Referendo para autorizar privatização da Copasa e da Cemig foi incluído na Constituição de Minas Gerais quanto Itamar Franco (foto) era o governador

Tema de debate por mais de dez horas e votada em primeiro turno às 4h30 da madrugada desta sexta (24), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/2023, de autoria do governador Romeu Zema (Novo), tem um texto simples e curto, apenas com a designação “ficam revogados os §§ 15 e 17 do art. 14 da Constituição do Estado”. A medida, no entanto, muda significativamente a vida dos mineiros, pois retira dos eleitores a prerrogativa de decidir se uma estatal pode ou não ser privatizada.

A PEC 24/2023 foi enviada à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) como forma de viabilizar a venda de Cemig e Copasa sem a necessidade de realização de um referendo popular. O texto ganhou força com a criação do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) e a previsão de privatizar ativos como forma de refinanciar o débito de R$ 170 bilhões com a União e reduzir os juros cobrados sobre as parcelas divididas pelos próximos 30 anos. A versão atual do texto, após tratativas entre os deputados, trata apenas sobre a retirada da consulta popular acerca da venda da Copasa

O texto foi aprovado em primeiro turno e pode ter a votação definitiva em plenário já na próxima semana. Durante a extensa votação da noite de quinta-feira (23) que invadiu a madrugada do dia seguinte, vários deputados da oposição recordaram o momento em que outra PEC, a que instituiu o referendo, foi aprovada naquela mesma Assembleia.

A origem do debate sobre o referendo remonta ao início deste século, quando Minas Gerais era governada por Itamar Franco (1930-2011), então no PMBD. O governador sucedeu Eduardo Azeredo (PSDB) e reagia a um momento de avanço da pauta privatista no estado e no Brasil. Em 1997, por exemplo, 33% das ações da Cemig foram vendidas.

Eleito em 1998, Itamar enviou à Assembleia, três anos depois, a PEC 50/2001 em março. O texto tramitou na Casa durante sete meses e foi aprovado por unanimidade em outubro, alterando a Constituição de Minas Gerais para exigir um referendo popular para autorizar a venda de empresas que fornecem serviços de gás natural, energia elétrica e saneamento — primordialmente Gasmig, Cemig e Copasa, portanto.

O trecho específico da PEC de autoria de Itamar Franco que trata sobre Cemig e Copasa foi escrito desta forma:

Como foi a votação em 2001

O Diário Legislativo da ALMG de 20 de outubro de 2001 traz a ata completa da sessão de votação realizada em plenário de três dias antes, quando 51 deputados votaram a favor da PEC do Executivo e nenhum parlamentar se manifestou de forma contrária.

Alencar da Silveira Júnior (PDT), Arlen Santiago (Avante), Hely Tarquínio (PV) e Sargento Rodrigues (PL) são os únicos deputados estaduais que atualmente têm cargo na Assembleia e também estavam na Casa há 24 anos.

Arlen Santiago votou a favor do projeto de Itamar e depois também de forma favorável à proposta de Zema, que anula o primeiro. Sargento Rodrigues votou a favor do texto de 2001 e se ausentou na votação desta sexta. Alencar da Silveira Junior e Hely Tarquinio não votaram em segundo turno na PEC 50/2001 e, em 2025, o primeiro votou a favor da queda do referendo e o segundo, por sua manutenção.

A lista de parlamentares a votar a favor da PEC conta com nomes que seguem relevantes na política. Veja a lista completa:

  • Antônio Andrade
  • Ermano Batista
  • Antônio Carlos Andrada
  • Cristiano Canêdo
  • Sebastião Costa
  • Luiz Fernando Faria
  • Adelmo Carneiro Leão
  • Ivo José
  • Olinto Godinho
  • Wanderley Ávila
  • Álvaro Antônio
  • Aílton Vilela
  • Ambrósio Pinto
  • Amilcar Martins
  • Anderson Adauto
  • Arlen Santiago
  • Bené Guedes
  • Bilac Pinto
  • Cabo Morais
  • Carlos Pimenta
  • Chico Rafael
  • Dalmo Ribeiro Silva
  • Dilzon Melo
  • Dimas Rodrigues
  • Dinis Pinheiro
  • Doutor Viana
  • Durval Ângelo
  • Edson Rezende
  • Eduardo Brandão
  • Eduardo Hermeto
  • Gil Pereira
  • João Leite
  • João Paulo
  • Jorge Eduardo de Oliveira
  • José Braga
  • José Henrique
  • Kemil Kumaira
  • Luiz Menezes
  • Marcelo Gonçalves
  • Márcio Kangussu
  • Marco Régis
  • Maria José Haueisen
  • Mauro Lobo
  • Miguel Martini
  • Paulo Piau
  • Rêmolo Aloise
  • Rogério Correia
  • Sargento Rodrigues
  • Sávio Souza Cruz
  • Sebastião Navarro Vieira

O Diário do Legislativo conta também com a transcrição da declaração de voto de Rogério Correia (PT), hoje deputado federal. O parlamentar defendeu sua escolha a favor da PEC e exaltou o projeto do então governador.

“Senhor Presidente, a Assembleia Legislativa acaba de aprovar um projeto importante. A aprovação dessa emenda à Constituição, praticamente, inibe qualquer ação de governos futuros no que diz respeito à venda de empresas importantes como a Cemig e a Copasa. O povo mineiro fica resguardado da ação de governos que especulam com empresas que nos são muito caras, vendendo-as, a preço de banana, a empresas estrangeiras. Conforme o substitutivo que apresentei, essa emenda à Constituição obriga que, para qualquer venda da Cemig ou da Copasa, seja necessária, em primeiro lugar, a aprovação de três quintos dos Deputados, mesmo número necessário à aprovação de emenda à Constituição, o que dificulta a autorização da venda da Cemig e da Copasa. Mesmo assim, seria necessário um referendo popular para a concretização da venda dessas empresas estatais. É uma salvaguarda que a emenda à Constituição passa a ter. Tomara que outras Assembleias Legislativas procedam da mesma forma, para impedir que esse processo privatizante continue tendo curso em nosso país”, disse à época o deputado.

O que diz a PEC de Zema?

No início do século, durante o governo de Itamar Franco, a Assembleia aprovou por unanimidade a inclusão de um artigo na Constituição de Minas Gerais que obriga a realização de um referendo popular para aprovar a privatização das estatais de gás natural, energia elétrica e saneamento.

A PEC 24/2023 buscava retirar esse artigo e viabilizar a privatização de Cemig e Copasa. Após acordos entre os deputados, o texto foi alterado e manteve apenas a retirada do referendo para a Copasa.

A Copasa no Propag

A privatização da Copasa já integrava a pauta do governo Zema desde o primeiro mandato, mas ganhou novo fôlego com a criação do Propag. Com o projeto permitindo a privatização e federalização de ativos como forma de pagar a dívida com a União, vários projetos da pauta privatista do Executivo andaram na Assembleia após anos parados.

O Propag prevê que estados refinanciem em 30 anos a dívida com a União e estabelece mecanismos para reduzir os juros cobrados sobre as parcelas. O projeto do Executivo Estadual é ingressar no programa abatendo 20% do estoque devido.

Para obter o valor necessário na amortização da dívida, o Executivo enviou projetos para federalizar ou privatizar estatais à Assembleia. No caso da Copasa, além do texto específico que trata sobre a venda da companhia de saneamento, o governo precisa retirar da constituição a necessidade de realizar um referendo para autorização da privatização.

Hoje os juros são indexados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mais 4% ao ano. Se o estado conseguir amortizar 20% do estoque da dívida, dois pontos percentuais da cobrança adicional são abatidos.Servidores lotam a Assembleia contra a privatização da Copasa

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Repórter de política da Itatiaia, é jornalista formado pela UFMG com graduação também em Relações Públicas. Foi repórter de cidades no Hoje em Dia. No jornal Estado de Minas, trabalhou na editoria de Política com contribuições para a coluna do caderno e para o suplemento de literatura.