Leia o comunicado de Carla Zambelli após renunciar ao cargo de deputada federal

Zambelli disse que a decisão foi tomada para “denunciar que um mandato legitimado por quase um milhão de votos foi interrompido”

Deputada Carla Zambelli (PL-SP) prestará depoimento à Polícia Federal (PF) na segunda-feira

A ex-deputada Carla Zambelli (PL-SP) se manifestou, por meio de seus advogados, após anunciar a renúncia ao seu mandato na Câmara dos Deputados, neste domingo (14). Em nota, Zambelli disse que a decisão foi tomada para “denunciar que um mandato legitimado por quase um milhão de votos foi interrompido”.

“Não por medo, não por fraqueza, não por desistência. Comunico, de forma pública e solene, minha renúncia para denunciar que um mandato legitimado por quase um milhão de votos foi interrompido apesar do reconhecimento formal, por esta Casa, da inexistência de provas para sua cassação”, disse.

A decisão da renúncia foi tomada após uma determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) para que seu suplente assumisse o cargo em 48 horas. A ex-deputada criticou o ministro do STF e elogiou a atuação dos parlamentares que, na última semana, optaram pela não cassação do seu mandato.

“Contudo, ignorando a decisão soberana dos representantes do povo brasileiro, o Supremo Tribunal Federal determinou a perda do meu mandato. Onde a Casa do Povo absolveu, o Judiciário condenou”, acrescentou em um trecho do comunicado.

Condenação no STF e reviravolta na Câmara

Zambelli foi condenada a 10 anos de prisão por envolvimento na invasão de sistemas do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). A Primeira Turma do STF decidiu em junho pela perda de mandato da deputada e comunicou a Câmara. Nesta semana, após meses de análise do caso, a CCJ deu aval à perda de mandato, mas isso não se confirmou no plenário. A votação não atingiu votos suficientes para a cassação.

Em reação, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, avaliou que o ato da Câmara era nulo e determinou a perda imediata, além de fixar o prazo de 48 horas para o suplente assumir. A decisão foi confirmada por unanimidade na Primeira Turma e a Câmara foi oficialmente comunicada na sexta-feira (12).

“Mandatos podem ser interrompidos; a voz de um povo, jamais. Eu sigo viva, a verdade permanece, e o Brasil continuará a me ouvir. Que Deus abençoe o povo brasileiro, ilumine esta Nação e a conduza, sempre, pelo caminho do direito, da verdadeira justiça e da liberdade”, finalizou a ex-deputada

Leia o posicionamento da ex-deputada

“Senhoras e Senhores Deputados,

Povo brasileiro,

Eu, Carla Zambelli Salgado de Oliveira, Deputada Federal eleita para a 57ª

Legislatura, dirijo-me à Nação por intermédio de meus advogados, Dr. Fabio Pagnozzi e Dr. Pedro Pagnozzi. Impossibilitada de comparecer a esta Casa, privada de minha liberdade em território estrangeiro, faço com que minhas palavras atravessem fronteiras. Falo, portanto, não apenas por mim, não apenas como parlamentar, mas como a voz de quase um milhão de paulistas que confiaram em minha representação. O que registro neste ato não é apenas a renúncia a um mandato, mas um alerta histórico, um marco institucional.

A Câmara dos Deputados exerceu integralmente sua competência constitucional, observando o procedimento previsto no artigo 55 da Constituição Federal, especialmente seus §§ 2º e 3º, que atribuem exclusivamente ao Poder Legislativo a deliberação sobre a perda de mandato parlamentar, mediante decisão do Plenário, assegurados o contraditório e a ampla defesa.

No curso desse procedimento constitucional, o relatório elaborado pelo Relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, de autoria do Deputado Diego Garcia, foi taxativo e fundamentado: não existem provas jurídicas aptas a sustentar a perda do meu mandato, tampouco elementos capazes de embasar qualquer condenação.

O Plenário desta Casa, respeitando a soberania do voto e o devido processo legal, confirmou esse entendimento. O Parlamento disse “não”. Afirmando que não havia fundamento jurídico legítimo para suprimir um mandato conferido por quase um milhão de votos. Tal decisão constituiu um ato institucional e constitucional, no qual a Casa do Povo reafirmou a soberania do voto popular, o devido processo legal e os limites do poder punitivo do Estado.

A História constitucional ensina que os regimes livres somente subsistem quando cada Poder reconhece suas fronteiras. Montesquieu, o idealizador da Tripartição de Poderes que o Brasil adota, advertia que “todo aquele que detém poder tende a abusar dele, indo até onde encontra limites”.

O que foi vivido nos últimos meses reafirma que o Parlamento não é instância acessória, mas Poder constitucional autônomo, cuja competência não pode ser esvaziada ou suprimida pela expansão indevida de outros Poderes, sob pena de grave comprometimento do Estado Democrático de Direito. Este episódio permanecerá como referência institucional, nas situações em que se discuta a preservação do mandato popular frente a avanços que extrapolem os limites constitucionais.

Contudo, ignorando a decisão soberana dos representantes do povo brasileiro, o Supremo Tribunal Federal determinou a perda do meu mandato. Onde a Casa do Povo absolveu, o Judiciário condenou.

É diante desse quadro que tomo esta decisão extrema.

Renuncio.

Não por medo, não por fraqueza, não por desistência. Comunico, de forma pública e solene, minha renúncia para denunciar que um mandato legitimado por quase um milhão de votos foi interrompido apesar do reconhecimento formal, por esta Casa, da inexistência de provas para sua cassação.

Renuncio para que fique registrado na História que, mesmo sem provas reconhecidas pelo Parlamento, a vontade de um outro Poder se sobrepôs à vontade popular. Este gesto não é rendição. É um marco de resistência. É a afirmação de que mandatos passam, mas princípios são inegociáveis A democracia não se resume ao dia da eleição, masse sustenta no respeito às instituições, ao devido processo legal e à soberania da representação popular. Dirijo-me, por fim, ao povo brasileiro. Aos meus eleitores, afirmo: a verdade foi dita, a história foi escrita e a minha consciência permanece livre.

Convicções não se prendem, e a vontade popular não se apaga. Minha história pública não foi forjada no silêncio aveludado dos gabinetes, mas no clamor das avenidas, onde o asfalto quente testemunhou o despertar de uma nação.

Quando fundei o movimento ‘Nas Ruas’, eu não empunhava a caneta de uma autoridade, mas o megafone da cidadania, caminhando ombro a ombro com gigantes anônimos sob o céu aberto. Aquele vento de liberdade, que soprou forte nas praças e varreu o Brasil, foi o que me trouxe até aqui. E é essa mesma essência, nascida da poeira da luta e da voz rouca das multidões, que me sustenta agora; pois quem nasceu da tempestade das ruas jamais se curvará ao eco frio das sentenças.

A história registra: mandatos podem ser interrompidos; a voz de um povo, jamais. Eu sigo viva, a verdade permanece, e o Brasil continuará a me ouvir. Que Deus abençoe o povo brasileiro, ilumine esta Nação e a conduza, sempre, pelo caminho do direito, da verdadeira justiça e da liberdade.

Respeitosamente,

CARLA ZAMBELLI SALGADO DE OLIVEIRA

Deputada Federal – Brasil”

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Aline Pessanha é jornalista, com Pós-graduação em Marketing e Comunicação Integrada pela FACHA - RJ. Possui passagem pelo Grupo Bandeirantes de Comunicação, como repórter de TV e de rádio, além de ter sido repórter na Inter TV, afiliada da Rede Globo.
Repórter de política em Brasília, com foco na cobertura dos Três Poderes. É formado em Jornalismo pela Universidade de Brasília (UnB) e atuou por três anos na CNN Brasil, onde integrou a equipe de cobertura política na capital federal. Foi finalista do Prêmio de Jornalismo da Confederação Nacional do Transporte (CNT) em 2023.

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