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Cancelamento de reunião entre Haddad e Tesouro dos EUA expõe influência de aliados de Trump

Troca de e-mails obtida pelo governo brasileiro indica que encontro virtual foi suspenso horas após Eduardo Bolsonaro prometer “radicalizar” ações em Washington

Ministro Fernando Haddad

A agenda de negociações econômicas entre Brasil e Estados Unidos sofreu um revés na última semana. Troca de e-mails entre a equipe do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e auxiliares do secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, revela que uma reunião virtual, inicialmente confirmada, foi cancelada horas depois de declarações do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) sobre “radicalizar” sua atuação política nos EUA.

Haddad afirmou que a suspensão da conversa foi resultado de articulação da extrema-direita, embora sem mencionar nomes.

O que mostram as mensagens

  • Em 4 de agosto, assessores de Haddad solicitaram a reunião.
  • No mesmo dia, a equipe de Bessent sugeriu a data de 7 de agosto.
  • Horas depois, o compromisso foi remarcado para 13 de agosto, com link do Zoom enviado aos brasileiros.
  • Na manhã de 6 de agosto, veio o cancelamento, com promessa de reagendar no futuro, o que ainda não ocorreu.

Coincidentemente, no mesmo dia do cancelamento, Eduardo Bolsonaro deu entrevista ao jornal O Globo, afirmando que levaria ao conhecimento de autoridades americanas a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro. O parlamentar disse esperar “reação” do governo Trump.

Influência política e resistência às negociações

Segundo o governo brasileiro, Bessent demonstrava abertura para discutir as tarifas impostas aos produtos brasileiros, sendo considerado mais pragmático que outros membros da administração Trump. No entanto, figuras do entorno do secretário, como o chefe de gabinete Daniel Katz, indicado diretamente por Trump e com perfil ideológico, teriam atuado para barrar o diálogo.

Haddad conheceu Bessent por meio do ex-ministro Armínio Fraga, com quem o secretário trabalhou na Fundação George Soros.

Para o Planalto e o Itamaraty, Eduardo Bolsonaro, mesmo sem poder direto sobre a agenda de Bessent, teria legitimidade política para influenciar setores ideológicos da Casa Branca, dificultando as conversas comerciais. Hoje, a avaliação interna é que decisões-chave sobre o Brasil passam exclusivamente pelo Salão Oval.

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Reações e acusações

A oposição reagiu acusando o governo Lula de usar Eduardo Bolsonaro como “bode expiatório” para justificar a falta de acesso à Casa Branca. O senador Ciro Nogueira (PP-PI) questionou o prestígio internacional de Haddad e afirmou que o cancelamento pode ter ocorrido por razões diplomáticas ou estratégicas dos EUA.

Em nota conjunta com o jornalista Paulo Figueiredo, Eduardo Bolsonaro negou qualquer influência na agenda de Bessent e anunciou nova viagem a Washington para reuniões com autoridades americanas, sem revelar nomes ou temas.

Aline Pessanha é jornalista, com Pós-graduação em Marketing e Comunicação Integrada pela FACHA - RJ. Possui passagem pelo Grupo Bandeirantes de Comunicação, como repórter de TV e de rádio, além de ter sido repórter na Inter TV, afiliada da Rede Globo.