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Novo Bento Rodrigues: saiba como estão os atingidos pela lama 10 anos após o desastre

Rompimento da barragem de Fundão, em novembro de 2015, matou 19 pessoas, contaminou a bacia do Rio Doce e destruiu dois distritos de Mariana

Novo Bento Rodrigues: saiba como estão os atingidos pela lama 10 anos depois

Distritos de Mariana, na Região Central de Minas Gerais, Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo foram destruídos pela lama após o rompimento da barragem de Fundão, da Samarco, no dia 5 de novembro de 2015.

Um dos principais pontos tratados nos acordos de reparação foi a restituição do direito à moradia para as pessoas que perderam suas casas e imóveis. Foram construídos dois novos distritos, nomeados de Novo Bento Rodrigues e Paracatu.

Dez anos após o desastre e um ano depois da assinatura do Acordo de Reparação do Rio Doce, a reportagem da Itatiaia foi até o Novo Bento Rodrigues e conversou com a população.

Darlisa Azevedo, de 59 anos, mais conhecida como “Uninha” ou “Uma”, teve sua casa e comércio reconstruídos. Ela relata que, apesar de ter sido restituída de seu direito à moradia, os laços entre os moradores não são mais os mesmos.

“Estou sentindo diferença, porque a comunidade não segue mais unida como a gente era antes, mesmo por causa do tamanho que ficou. Ficou maior. Então, é até difícil a gente rever os amigos”, disse.

Segundo Antônio Gonçalves, de 56 anos, o “Da Lua”, o Novo Bento Rodrigues ainda não está concluído. O local foi entregue em partes e obras ainda são realizadas. Da Lua relata que os familiares que já se instalaram nas novas casas gostaram do resultado.

“As pessoas que estão morando lá, como a minha mãe e as minhas irmãs, estão gostando. É um uma nova ambientação. A cidade, vamos supor, é um distrito novo. Então, você tem que estar ali ambientando novamente”, contou.

O empresário Dan Mol, de 58 anos, tinha casa e plantação em Paracatu de Baixo. No entanto, optou por não integrar a nova comunidade construída. Ele revelou ter receio com o equilíbrio financeiro e emocional dos moradores diante das novas construções.

“As casas são bem construídas. Fizeram vilarejos bem estruturados, mas a gente tem muita preocupação com o ser humano, com a saúde mental. Era preciso ter uma estrutura. Psicólogo, né? Para ajudar as pessoas a voltarem à origem, a recomeçarem, depois de dez anos”, afirmou.

Mauro Marcos da Silva, de 56 anos, nasceu e foi criado em Bento Rodrigues. Perguntado sobre o futuro, Mauro avalia que ele e os demais atingidos estão condenados ao que chama de uma “prisão perpétua”.

“Um cenário de impunidade. No Brasil, existe uma pena máxima de 30 anos. Nós já cumprimos um terço disso. O projeto de repactuação tem programas previstos para durarem 20 anos. Então, somados com os 10 que já se passaram, são 30 anos. É pena máxima”, disse.

A saúde mental dos reassentados

Em entrevista à Itatiaia, o professor universitário e psicanalista Renê Dentz, que acompanhou diretamente os núcleos de atingidos, houve dificuldade em entender o que seria necessário fazer para que, neste novo Bento, as pessoas se sentissem minimamente em casa de novo.

“Houve um grande esforço, né? A fundação responsável reuniu profissionais especialistas competentes do Brasil todo, que foram para a cidade Mariana atuar, mas faltou uma sensibilidade de entender o que era Bento”, analisou o especialista.

Segundo Dentz, o Novo Bento Rodrigues foi projetado como um conjunto de casas, quase um condomínio, mas não reproduz o espírito da comunidade rural que existia antes. “As pessoas ali perderam duas coisas principais: a terra e a comunidade. E a terra, para elas, é quase uma extensão do corpo”, explicou.

“Ouvi senhores de mais de 80 anos dizendo: ‘Minha vida perdeu o sentido. Não consigo mais plantar, nem criar meus animais. Fico o dia inteiro olhando para o teto de uma casa no centro de Mariana”, relatou o professor.

O que diz a Samarco?

Segundo a Samarco, as entregas começaram em 2023. Até o momento, foram finalizadas as obras de 389 imóveis, entre moradias, comércios, sítios, lotes e outros bens privados. Além disso, foram construídos equipamentos públicos, como escolas, postos de saúde, cemitérios e praças, que fazem parte da nova infraestrutura dos distritos.

A empresa diz que 100% das construções que estavam previstas antes do Acordo de Reparação do Rio Doce, assinado em outubro de 2024, foram entregues. Após a homologação do acordo, foi iniciada a execução de seis imóveis adicionais, com previsão de conclusão até o fim de 2026.

Dez anos do desastre em Mariana

Por volta das 16h do dia 5 de novembro de 2015, a barragem de Fundão, da Samarco, localizada no distrito de Bento Rodrigues, a 35 km do centro de Mariana, se rompeu.

O colapso da estrutura causou a morte de 19 pessoas, deixou mais de 600 desabrigadas e despejou mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério no meio ambiente.

Leia mais:

A lama contaminou a bacia do Rio Doce, nos estados de Minas Gerais e do Espírito Santo, e alcançou o mar. Essa é considerada a maior catástrofe ambiental na história do Brasil.

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Allãn Passos é jornalista, nascido em Mariana, formado pela UFOP em 2012. Atuou como assessor de comunicação na Prefeitura de Mariana e na Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Entre 2015 e 2018 foi repórter aéreo de trânsito. Desde abril de 2018 é editor e apresentador do Jornal da Itatiaia Noite. Integrante do PodTudo, atua como repórter e apresenta os programas Chamada Geral e Plantão da Cidade nas férias e folgas dos titulares.
Mineiro de Urucânia, na Zona da Mata. Mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Ouro Preto (2024), mesma instituição onde diplomou-se jornalista (2013). Na Itatiaia desde 2016, faz reportagens diversas, com destaque para Política e Cidades.
Jornalista formado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Na Itatiaia, escreve para Cidades, Brasil e Mundo. Apaixonado por boas histórias e música brasileira.