Representantes de comunidades tradicionais, lideranças quilombolas, integrantes do Ministério Público Federal e de órgãos como a Fundação Palmares e o Incra denunciaram, nesta sexta-feira (13), em uma audiência pública da Comissão de Direitos Humanos na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) a falta de diálogo com o governo estadual sobre os impactos do
O encontro também questionou a concessão da
Na audiência, os participantes denunciaram violações a direitos humanos e à liberdade de fé dos povos tradicionais. Eles pedem que as obras só avancem após um processo legítimo de consulta prévia, conforme prevê a legislação.
“As cidades estão crescendo, os grandes empreendimentos estão aparecendo, e os quilombos não têm sua contrapartida. O acordo precisa ser na prévia. Primeiro a reparação, depois o empreendimento”, afirmou Ione Maria de Oliveira, conhecida como Mãe Ione Ty Oyá, Mestra Quilombola e representante do Kilombo Mangueiras e da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais.
Comunidades se dizem ‘invisíveis’ para o Estado
João Carlos Pio, do Quilombo dos Arturos e membro da Comissão das Comunidades Tradicionais Atingidas pelo Rodoanel, destacou o histórico de desrespeito por parte do Estado. “Desde o início, o Rodoanel já impactou a vida das comunidades tradicionais. A trajetória de muitos povos e comunidades sempre foi o escanteamento, invisibilidade por parte do Estado e descumprimento da legislação”, disse.
Além das críticas, a Comissão de Direitos Humanos elaborou um requerimento solicitando a anulação do parecer de licenciamento emitido pela Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam). Um dos argumentos é a ausência de consulta às comunidades quilombolas atingidas. Também foi aprovado um pedido de convocação da secretária estadual de Meio Ambiente, Marília Melo, e uma visita técnica ao Quilombo de Pinhões e ao cemitério de pessoas escravizadas.
“As comunidades tradicionais não foram consultadas como determina a legislação. É por isso que a licença prévia emitida para o Rodoanel é ilegal. O próprio INCRA, órgão federal, foi pego de surpresa com essa licença, uma vez que estava em diálogo com o governo do Estado sobre o processo de diálogo e de consulta com as comunidades tradicionais. O que nós vimos hoje é que terreiros estão sendo selados, quilombos estão sendo assediados, sem que uma análise de consulta tenha sido feita, o que é absolutamente absurdo. O governo quer passar o Rodoanel sem observar qualquer tipo de legislação, e isso a gente não pode permitir”, disse a deputada Bella Gonçalves (Psol), presidente da Comissão.
Representantes do Incra e do Ministério Público Federal disseram que foram surpreendidos pela emissão da licença, que ocorreu em 17 de maio.
O que diz o governo de Minas?
O governo de Minas Gerais foi representado na audiência pelo subsecretário de Transportes e Mobilidade da Secretaria de Infraestrutura, Aaron Duarte Dalla. Ele defendeu que o Estado tem buscado diálogo com as comunidades desde o início do projeto.
“O governo é um governo aberto ao diálogo. A gente vem buscando desde 2023 o diálogo com as comunidades. Fizemos várias tentativas de conversas, fizemos reuniões, mandamos carta, mandamos mensagem por WhatsApp, ligamos para as comunidades, mas infelizmente a gente tem tido muita resistência por parte das comunidades”, afirmou.
Aaron reconheceu que existem seis comunidades quilombolas certificadas afetadas pelo traçado e disse que todas elas foram contatadas. Ainda segundo o subsecretário, outras estratégias de comunicação foram adotadas.
Questionado sobre a resistência de prefeituras como Betim e Contagem ao projeto, Aaron Dalla disse que há uma ação judicial em curso. “Existe uma ação na Justiça Federal, no TRF-6, no qual o objetivo é a anulação do contrato. Foi feito um pedido liminar, mas o juiz negou, entendendo que essa escuta poderia ser feita durante o processo de licenciamento ambiental”, afirmou.
Ele também confirmou que o cronograma prevê início das obras até o fim do ano. “A gente está confiante que ainda vai conseguir avançar no diálogo com as comunidades e resolver as divergências que estão ocorrendo”, finalizou.
Mapeamento e diálogo
A superintendente de Políticas Temáticas Transversais da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), Cinthia Mara, explicou que o papel da secretaria é acompanhar o processo e garantir que as comunidades sejam ouvidas. “A atuação da Sedese foca em garantir que as comunidades sejam ouvidas de forma legítima. Esse acompanhamento é feito pela subsecretaria de direitos humanos”, explicou.
Ela informou ainda que 75 comunidades foram mapeadas, todas foram contatadas, e cerca de 15 já estão com o processo de consulta em andamento. Segundo Cinthia, a realização dessas consultas depende da disponibilidade das comunidades.