O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta segunda-feira (4) a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), sob acusação de descumprir medidas cautelares impostas em julho. A decisão inclui ainda nova operação de busca e apreensão de aparelhos eletrônicos na residência do ex-presidente, em Brasília. A Polícia Federal recolheu pelo menos um telefone celular.
O ato judicial coloca Bolsonaro na condição de quarto ex-presidente da República a ser preso desde a redemocratização, em 1985, antes dele, foram detidos Fernando Collor, Luiz Inácio Lula da Silva e Michel Temer. A medida foi motivada pela divulgação, no domingo (3), de uma mensagem de voz gravada por Bolsonaro e transmitida a manifestantes reunidos na orla de Copacabana, no Rio de Janeiro.
No áudio, que foi reproduzido no palanque pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o ex-presidente diz: “Boa tarde, Copacabana. Boa tarde, meu Brasil. Um abraço a todos. É pela nossa liberdade. Estamos juntos.” O vídeo com o registro foi publicado nas redes sociais de Flávio e apagado em seguida.
Segundo Moraes, a fala foi “dolosa e conscientemente pré-fabricada” para incitar apoiadores a manter pressão sobre o Supremo e obstruir investigações. O ministro destacou que o uso de redes sociais de terceiros é vedado pelas restrições impostas e, portanto, a ação configura novo descumprimento.
Defesa nega crime e classifica prisão como injusta
Em nota, a defesa de Bolsonaro afirmou ter sido surpreendida pela decisão e sustentou que não houve violação de nenhuma das condições impostas. Os advogados alegam que a frase dita pelo ex-presidente “não pode ser compreendida como descumprimento de medida cautelar, nem como ato criminoso” e reforçam que não há proibição expressa para discursos ou entrevistas públicas. O time jurídico anunciou que vai recorrer.
Aliados políticos também reagiram. O líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), disse que a prisão é “vingança política”. O senador Ciro Nogueira (PP-PI), presidente do PP e ex-ministro da Casa Civil, lamentou o que considerou um “fato jurídico inaceitável” antes do julgamento definitivo.
Elogios e críticas no Congresso
No campo oposto, o líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (RJ), classificou a medida como “proporcional à gravidade dos atos” e afirmou que Bolsonaro “ia descumprir e provocar o tempo todo”. A deputada Duda Salabert (PDT-MG) declarou que o ex-presidente “começa a pagar por ter atentado contra a democracia”. O presidente do PT, Edinho Silva, aproveitou para lembrar do chamado plano “Punhal Verde e Amarelo”, que previa assassinatos de autoridades, e defendeu investigações rigorosas.
Entre os mais próximos de Bolsonaro, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) ironizou a decisão, dizendo que não se tratou de corrupção ou desvio de verbas, mas de uma postagem nas redes sociais. Já Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente e atualmente nos Estados Unidos, afirmou estar triste, mas não surpreso, e disse que a medida “fortalece” o pai.
O que pode e o que não pode
As restrições impostas a Bolsonaro desde 18 de julho incluem uso de tornozeleira eletrônica, proibição de utilização de redes sociais — próprias ou de terceiros —, vedação a encontros com embaixadores e investigados no STF, além de toque de recolher: não pode sair de casa à noite, nos fins de semana e feriados.
Em 24 de julho, Moraes já havia registrado que Bolsonaro violou uma das cautelares, mas entendeu, na ocasião, que se tratava de um episódio isolado, optando por não converter a medida em prisão preventiva. O ministro, no entanto, alertou que uma nova infração resultaria na decretação imediata da prisão.
Com a nova decisão, Bolsonaro também está proibido de receber visitas, exceto advogados e pessoas autorizadas, e não poderá usar celular. As demais cautelares seguem em vigor.
Contexto do ato em Copacabana
O ato do último domingo, que levou ao endurecimento da medida, foi organizado por aliados e incluiu pautas como impeachment de Moraes, anistia aos condenados pelos ataques de 8 de janeiro, críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e declarações de apoio ao ex-presidente norte-americano Donald Trump. No Rio, além de Flávio Bolsonaro, participaram lideranças do PL e o governador Cláudio Castro (PL). Em outras capitais, ocorreram manifestações com pautas semelhantes.
Moraes escreveu, em sua decisão, que “os apoiadores de Jair Bolsonaro e seus filhos, deliberadamente, utilizaram as falas e a participação, ainda que por telefone, para propagar ataques e impulsionar a mobilização contra o Supremo, com nítida intenção de pressionar e coagir a Corte”.
Bastidores da decisão
Bolsonaro passou a segunda-feira na sede do PL, em Brasília, sem imaginar que seria alvo de nova ordem judicial. A expectativa inicial era de que a decisão não fosse levada a julgamento na Primeira Turma do STF, ficando restrita à determinação individual de Moraes.
Em julho, quando as primeiras medidas cautelares foram impostas, o episódio Bolsonaro mostrou a tornozeleira eletrônica a jornalistas na Câmara, cena filmada e divulgada nas redes de terceiros. Moraes reforçou, à época, que a proibição de uso de redes valia inclusive para conteúdo divulgado por outras pessoas.