Defesas do ‘núcleo crucial’ do golpe apresentam recursos contra condenações

Advogados de Heleno, Nogueira e Torres pedem revisão de decisões, alegam omissões e erros de dosimetria das penas

Parte do Núcleo Crucial entrega recursos ao STF

Três dos condenados considerados parte do núcleo crucial da tentativa de golpe atribuída ao ex-presidente Jair Bolsonaro apresentaram nesta segunda-feira (24) novos recursos ao Supremo Tribunal Federal (STF). São eles: o general da reserva Augusto Heleno, o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira e o ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Todos protocolaram embargos de declaração, instrumento usado para pedir esclarecimentos, corrigir supostos erros e apontar contradições na decisão que os condenou.

O prazo para entrega dessa etapa recursal terminou hoje. O processo como um todo, que envolve Bolsonaro e outros seis réus, está na fase de recursos após as condenações impostas em setembro.

O que diz a defesa de Augusto Heleno

A equipe jurídica do ex-ministro do GSI sustenta que a decisão do STF contém erros, omissões e contradições, especialmente sobre:

• Atuação do relator: A defesa afirma que o ministro Alexandre de Moraes teria ultrapassado suas atribuições, conduzindo interrogatórios e produzindo provas diretamente, o que, segundo os advogados, violaria o sistema acusatório.

• Contradição sobre a “Abin Paralela”: Os advogados dizem que é incoerente acusar Heleno de liderar o esquema ilegal da Abin ao mesmo tempo em que apontam que ele teria sido espionado pela própria estrutura paralela.

• Ausência de provas: A defesa sustenta que não há elementos concretos que liguem Heleno a práticas ilícitas, afirmando que ele foi investigado formalmente no caso do software espião First Mile, sem comprovação de envolvimento.

O que pedem:

– reconhecimento das omissões e contradições;
– absolvição de Heleno;
– que todas as comunicações passem a ser dirigidas exclusivamente aos advogados constituídos.

Heleno foi condenado a 21 anos de prisão.

Os argumentos da defesa de Paulo Sérgio Nogueira

O ex-ministro da Defesa também apresentou embargos de declaração. Sua defesa afirma que a decisão que o condenou contém equívocos técnicos e jurídicos.

Os principais pontos são:

• Suposta omissão do STF: Os advogados afirmam que Paulo Sérgio teria, já como ministro, atuado para reduzir riscos e evitar danos ao bem jurídico protegido, e que isso não foi considerado.

• Crimes anteriores à gestão — A defesa diz que os atos fraudulentos ocorreram antes de ele assumir o cargo de ministro, e que sua atuação administrativa teria buscado corrigir falhas, não agravá-las.

• Erro no cálculo da pena: Para os advogados, a dosimetria correta deveria totalizar 16 anos e 4 meses, e não 19 anos, como decidido. Segundo eles, há um acréscimo de mais de dois anos sem fundamentação.

Além disso, os defensores afirmam que o tribunal ignorou argumentos com base no princípio do favor rei, que exige interpretação mais benéfica ao réu em caso de dúvida.

O que pedem:

– correção da pena para 16 anos e 4 meses;
– absolvição;
– comunicações feitas exclusivamente à defesa.

Paulo Sérgio foi condenado a 19 anos de prisão.

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A manifestação da defesa de Anderson Torres

No caso de Torres, ex-ministro da Justiça, ex-secretário de Segurança do DF e delegado da PF, a defesa apresentou uma manifestação para preservar o direito ao recurso, conforme o artigo 333 do Regimento Interno do STF. O material ainda antecipa a intenção de recorrer com embargos infringentes, etapa seguinte.

Além disso, a defesa faz um pedido subsidiário:

• Caso a pena seja executada antecipadamente, que o cumprimento ocorra em instalações especiais, como a Superintendência da PF ou o Batalhão de Aviação Operacional.

O argumento central é de risco real de morte se Torres for levado a um presídio comum, dada sua atuação histórica contra o crime organizado e ameaças recebidas.

A defesa também destaca:

• cumprimento rigoroso das medidas cautelares desde maio de 2023;
• acompanhamento psiquiátrico, com uso de antidepressivos e antipsicóticos;
• agravamento do quadro psicológico após prisões e investigações.

Torres foi condenado a 24 anos de prisão.

Quem mais foi condenado

Além dos três que recorreram hoje, compõem o núcleo sentenciado:

  • Jair Bolsonaro, condenado a 27 anos e 3 meses; preso preventivamente após tentar remover a tornozeleira.
  • Alexandre Ramagem, condenado a 16 anos, 1 mês e 15 dias; teve o mandato cassado e deixou o país, descumprindo decisão judicial.
  • Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, condenado a 24 anos.
  • Mauro Cid, delator, já cumpre pena de 2 anos em regime aberto, sem recorrer.
  • Braga Netto, condenado a 26 anos.

Próximos passos do processo

Os embargos de declaração são o primeiro tipo de recurso após uma condenação. O primeiro conjunto deles, apresentado logo após o julgamento, já foi rejeitado por unanimidade.

As defesas ainda podem, em tese, apresentar embargos infringentes, recursos que tentam reduzir penas. No entanto, o entendimento dominante no STF é que eles só cabem quando há pelo menos dois votos pela absolvição, o que não ocorreu nesse caso.

Ao menos Anderson Torres já informou que pretende recorrer nessa fase, embora a admissibilidade seja considerada improvável.

O STF ainda não tem data definida para julgar os novos embargos.

Aline Pessanha é jornalista, com Pós-graduação em Marketing e Comunicação Integrada pela FACHA - RJ. Possui passagem pelo Grupo Bandeirantes de Comunicação, como repórter de TV e de rádio, além de ter sido repórter na Inter TV, afiliada da Rede Globo.

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