A Câmara dos Deputados aprovou, nessa terça-feira (16), em segundo turno, o texto-base da “PEC da Blindagem”. O aceite em primeiro turno havia acontecido horas antes. A Proposta de Emenda à Constituição permite, dentre outras coisas, que parlamentares barrem a prisão de colegas em votação secreta.
Para que a PEC da Blindagem fosse aprovada eram necessários 308 votos. Os placares foram: 353 a 134 no primeiro turno e 344 a 133 no segundo.
A proposta também estabelece que os parlamentares só podem ser presos em flagrante por crimes inafiançáveis — como racismo, tortura, terrorismo e tráfico de drogas.
O nome da PEC vem do fato dela dificultar a responsabilização de parlamentares. O texto exige autorização prévia do Congresso para que o Supremo Tribunal Federal (STF) processe criminalmente deputados e senadores.
O texto ainda destaca:
- Os deputados e senadores continuam a ser julgados apenas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em processos criminais;
- Se não houver prisão em flagrante, os autos precisam ser enviados em até 24 horas ao STF e ao Legislativo (Senado ou Câmara). A Casa responsável deve votar, por maioria absoluta e a curto prazo, se mantém ou não a prisão;
- Se o Legislativo negar a licença, a prisão fica automaticamente suspensa enquanto durar o mandato parlamentar;
- A proposta reforça que o presidente da República, o da Câmara, o do Senado, o vice-presidente do país e os demais ministros seguem sendo julgados pelo Supremo em infrações penais comuns.
A Câmara tentou “ressuscitar” a proposta no final de agosto, mas sem sucesso. A PEC, originalmente apresentada em 2021, ganhou fôlego no Congresso após o STF julgar políticos por ataques à democracia — incluindo, como exemplo mais recente, o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), condenado por tentativa de golpe de Estado após a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Por se tratar de uma mudança na Constituição, a PEC precisa ser aprovada em texto idêntico na Câmara e no Senado, após votação em dois turnos nas duas Casas, com o apoio de três quintos dos deputados e senadores.
O próximo passo é a votação no Senado Federal.
O que dizem os parlamentares?
Para o líder do PT, deputado Lindbergh Farias (RJ), a PEC não é de interesse dos brasileiros. “A pauta nossa tem de ser a vida do povo, e é nisso que insistimos”, disse, ao citar a Medida Provisória 1300/25, que isenta famílias de baixa renda da conta de luz em casos de baixo consumo. A MP, que aguarda votação no Plenário, perde a validade nesta quarta-feira (17).
Já o deputado Carlos Jordy (PL-RJ), vice-líder da Minoria, afirmou que o texto da PEC está longe do ideal, mas protege deputados de “processo criminal abusivo” que possa passar sem avaliação da Câmara. “Isto aqui é um grande avanço, porque, inclusive, nós poderemos decidir se uma ação, se um processo criminal deve avançar contra deputados que, muitas vezes, são perseguidos por suas falas.”
Para o deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB), vice-líder da oposição, a PEC não é da imunidade ou da blindagem, mas um equilíbrio de poderes. “Que democracia é esta em que o Parlamento, que tem representação de 100% da população, é chantageado por outros Poderes?”, questionou.
O deputado General Girão (PL-RN) também defendeu as prerrogativas parlamentares. “O constituinte deixou muito claro que nós, deputados e senadores, temos de ser invioláveis por quaisquer opiniões, palavras e votos”, afirmou.
Críticas à proposta
Para a líder do Psol, deputada Talíria Petrone (RJ), a imunidade parlamentar não é absoluta. “Esta não é a agenda que o Brasil espera de nós”, disse. Ela criticou a possibilidade de a medida beneficiar deputados que cometeram crimes hediondos, como estupro e latrocínio, que dependeriam do aval do Congresso para serem processados.
O deputado Bohn Gass (PT-RS) afirmou que não há justificativa para a necessidade de autorização do Congresso para um congressista ser investigado e punido. “A imunidade parlamentar não pode ser confundida com impunidade parlamentar”, declarou.
Para o deputado Túlio Gadêlha (Rede-PE), a PEC poderia ter sido construída para ser um texto razoável. “Se há reclamações de excesso, podemos ouvir e tentar construir um texto melhor. Mas o que está aqui é um crime contra a democracia”, afirmou.
O deputado Luiz Carlos Hauly (Pode-PR) disse ser contra qualquer privilégio ou prerrogativa que um parlamentar honesto não precisa. “Nunca precisei da proteção da lei, mais que o cidadão tem”, declarou.
Crime organizado
Para o deputado Kim Kataguiri (União-SP), aprovar a PEC é pedir para o crime organizado disputar cadeiras e vencer eleições para fugir de investigações. “Durante o período da Constituição de 1988, quando o texto que querem aprovar agora estava em vigor, nenhuma investigação foi autorizada”, disse.
Kataguiri afirmou que a proposta não reage a abusos do STF, mas cria abusos do Parlamento para blindar a corrupção. “O que está sendo votado é a diferença entre o remédio e o veneno, é a dose”, declarou.
A deputada Duda Salabert (PDT-MG) disse que a PEC “vai justamente beneficiar o corrupto, beneficiar o ladrão”. Segundo ela, a proposta vai tentar salvar parlamentares investigados e que podem ser presos, por exemplo, por desvio de emendas parlamentares.
Voto secreto
O deputado Ivan Valente (Psol-SP) criticou o retorno do voto secreto dos parlamentares, previsto na PEC. “Qualquer crime comum será julgado em conluio e corporativismo, por debaixo do pano, no voto secreto para livrar a cara de um e de outro”, disse.
Ivan Valente coordenou uma frente parlamentar pelo voto aberto quando a Constituição foi alterada em 2013 para prever voto aberto.
A deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) disse que a defesa do voto secreto é para proteger deputados da cobrança da opinião pública e dos eleitores.
Porém, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) afirmou que o voto secreto vai garantir que o Supremo Tribunal Federal (STF) não chantageie deputados.
Para o deputado Sargento Gonçalves (PL-RN), esse tipo de voto é “na intenção de preservar o parlamentar da perseguição dos ministros do Supremo Tribunal Federal, e não da população”.
Com informações da Agência Câmara de Notícias.