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Acordo na Inglaterra pode acelerar reparação a atingidos por tragédia de Mariana

Escritório inglês defende fechar pacto antes de julgamento na Europa; movimento é esperança para agilizar bases da reparação negociada no Brasil

A um mês da data que marca os oito anos do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais, atingidos começam a nutrir expectativa por um acordo na Inglaterra para viabilizar uma indenização em virtude das perdas causadas pelo derramamento de lama. A hipótese de acordo foi cogitada pelo advogado Tim Goodhead, que representa os afetados pela tragédia em solo britânico, local de origem da BHP Billiton, uma das responsáveis pela barragem.

Ouvido nesta quinta-feira (5) pela Itatiaia, Joceli Andrioli, integrante da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), afirma que o possível acordo extrajudicial pode dar “celeridade” à chegada dos recursos aos impactados pela tragédia. O Pogust Goodhead, escritório responsável pela causa em Londres, pleiteia indenização de cerca de R$ 230 bilhões.

“O caminho que o escritório está apontando, de um possível acordo, é viável e muito importante. Mas não é qualquer acordo. É um acordo desde que haja, de fato, a reparação adequada. Aqui no Brasil, até hoje, não alcançamos isso, recorrendo a todos os meios possíveis, inclusive ao Judiciário, que até o momento não deu conta de responder sobre isso”, diz

Para Joceli, a ideia de construir um consenso na Inglaterra proporciona “grande pressão” às mineradoras responsáveis por Fundão — além da BHP, há a Vale; juntas, elas controlam a Samarco. O movimento poderia engrossar o coro por um desfecho positivo às negociações, tocadas pelo Tribunal Federal da 6° Região (TRF-6), por um acordo de reparação no Brasil.

"(As mineradoras) estavam muito confortáveis, até então, em fazer o que querem no Brasil. Oito anos depois, estamos com esse ‘problemão’. As reparações ainda não chegaram e as indenizações não são suficientes”, aponta

À Folha de S. Paulo, Tim Goodhead contou que, em “99% dos casos”, as companhias preferem que os casos do tipo não cheguem aos tribunais.

As comunidades impactadas pelo desmoronamento de Fundão têm diálogo constante com equipes de assessoramento técnico, responsáveis por dar apoio em questões jurídicas e psicossociais. Integrante da Cáritas, uma das entidades que dá amparo aos atingidos, Rodrigo Pires Vieira, acredita na viabilidade de um acordo extrajudicial.

“Está se desenhando para isso. As empresas não querem (o julgamento). Sabem que a Justiça inglesa é forte. Estamos, enquanto movimentos sociais, tentando fazer essa negociação com o escritório de Londres, para que negocie com a Justiça brasileira. Para nós, é importante que aconteça a reparação aqui no Brasil”, considera.

‘Acordo entre iguais’

Segundo Joceli Andrioli, as bases de qualquer trato a respeito da tragédia de Mariana, que fez 19 vítimas e destruiu o distrito de Bento Rodrigues, deve dar voz aos atingidos e considerar as dimensões da questão. Para defender a tese, ele recorre à expressão “acordo entre iguais”.

O pedido é o mesmo do deputado estadual Ulysses Gomes (PT), que preside uma comissão formada pela Assembleia de Minas Gerais (ALMG) para acompanhar os termos do acordo de reparação costurado no Brasil. Segundo ele, os integrantes das comunidades afetadas pela tragédias precisam ser “ouvidos, compreendidos e atendidos”.

“Achamos que só a pressão que Londres coloca para que haja uma repactuação, um acordo no Brasil, é muito importante. Estamos falando de 700 mil atingidos ao redor da bacia, que entraram com um processo em Londres”, assinala, por sua vez, Rodrigo Pires Vieira.

A quinta, aliás, foi marcada por outras declarações a respeito do acordo de Mariana. O procurador-geral do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Jarbas Soares Júnior, disse que o acordo será concluído “em breve”. De acordo com ele, os envolvidos na negociação “deram passos muito rápido” no último mês.

O que dizem as mineradoras?

Procurada, a BHP Billiton afirmou que continuará a se defender no processo movido na Inglaterra e defendeu que “qualquer acordo” seja firmado no Brasil.

“A BHP Brasil continua trabalhando em estreita colaboração com a Samarco e a Vale para apoiar o processo de remediação em andamento no Brasil. A Fundação Renova promoveu avanços significativos no pagamento de indenizações individuais, tendo realizado pagamentos a mais de 429 mil pessoas, incluindo comunidades tradicionais como quilombolas e povos indígenas. A Renova já desembolsou mais de R$ 30 bilhões em ações de reparação, dos quais aproximadamente 50% foram pagos diretamente às pessoas atingidas por meio de indenizações individuais. No total, mais de 200 mil requerentes no processo da Inglaterra já receberam pagamentos no Brasil”, lê-se em parte de nota enviada á reportagem.

A Vale, também acionada, optou por não comentar o possível acordo na Europa por não figurar como ré na ação que tramita na corte inglesa.

“Como acionista da Samarco, a Vale reforça o compromisso com a reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, nos termos do TTAC e TAC Governança, acordos celebrados com as autoridades públicas e instituições de justiça brasileiras para esse fim, cuja execução se encontra vigente. A empresa vem prestando todo suporte, nos limites de sua governança, à Fundação Renova, entidade criada pelos acordos anteriores e responsável por executar os programas de reparação e compensação das áreas e comunidades atingidas no Brasil. Tais ações seguem em andamento, sendo que até julho deste ano, mais de 429,8 mil pessoas foram indenizadas, com mais de R$ 31,61 bilhões destinados a ações realizadas pela Fundação Renova”, aponta trecho de comunicado feito pela companhia.

Graduado em Jornalismo, é repórter de Política na Itatiaia. Antes, foi repórter especial do Estado de Minas e participante do podcast de Política do Portal Uai. Tem passagem, também, pelo Superesportes.
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