Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) voltam a analisar nesta sexta-feira (19) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1.625 que trata da legalidade de um decreto assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) - decreto que cancelou a adesão do Brasil à Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A ação pode alterar as relações entre empregadores e funcionários no país, uma vez que discute as regras para as demissões sem justa causa. Os ministros vão decidir, em julgamento virtual até a próxima sexta-feira (26), se o decreto de FHC que rompeu com a convenção é válido ou se ele deveria ter passado pelo Congresso.
A convenção da OIT prevê requisitos mínimos para a dispensa de funcionários e lista motivos que não podem ser usados pelas empresas para justificar demissões, como filiação a sindicato, estado civil, cor, raça, religião ou opinião política.
O artigo 4º da Convenção diz que o término da relação de trabalho com o empregado não poderá ser feito exceto se existir uma causa justificadora para a demissão.
O artigo diz que as causas justificadoras da rescisão devem ser de ordem relacionada à capacidade do empregado, do seu comportamento ou das necessidades de funcionamento da empresa.
Convenção 158
A Convenção 158 da OIT foi aprovada na Conferência Internacional do Trabalho, que aconteceu em 1982, na Suíça. Nos anos seguintes, mais de 30 países aderiram às regras previstas no texto.
A convenção foi ratificada pelo Brasil e entrou em vigor em 1996, mas, meses depois, foi denunciada por FHC e o tema foi parar no Supremo Tribunal Federal em 1997.
‘Sem proibições’
Em entrevista à CNN, o advogado trabalhista Carlos Eduardo Ambiel, avalia que, mesmo que o STF considere o decreto de FHC irregular, os efeitos práticos no Brasil não vão impedir as dispensas.
“Em momento algum, o texto da Convenção 158 afirma que dispensas serão proibidas. Ao contrário, a Convenção indica que dispensas motivadas por questões econômicas, tecnológicas e estruturais serão justificadas (ou seja, permitidas), apenas recomendando a previsão de mecanismos para minimizar seus efeitos, o que também é previsto na CLT para as chamadas dispensas coletivas”, diz o advogado.
O texto da Convenção 158 da OIT sempre se reporta à necessidade de suas disposições estarem em “conformidade” e de serem implementadas “através da legislação local”, que, no caso do Brasil, já prevê quase tudo que a Convenção 158 determina, como: seguro-desemprego; indenização pela dispensa; aviso prévio: direito a questionar a dispensa motivada em tribunal.
O advogado, no entanto, explica que a única previsão que falta na legislação brasileira, em relação à convenção da OIT seria o direito de defesa prévia do funcionário que seria demitido por “conduta ou desempenho”.
“O Brasil é um país que já protege bastante a dispensa imotivada, pois tem regras de garantia de emprego para alguns grupos relevantes de trabalhadores. Para os demais, estabelece pagamento de indenização compensatória, inclusive naqueles casos em que a dispensa esteja motivada por fato econômico, tecnológico ou estrutural”, afirma Ambiel.
Regras da CLT
A Convenção 158, ao considerar as dispensas decorrentes desses fatores, como motivadas, permitiria de dispensa por motivos econômicos ou tecnológicos, por exemplo, não precisariam de indenização, o que não ocorre no Brasil — que apenas afasta o pagamento de indenização nas dispensas realizadas por causa disciplinar.
De acordo com Ambiel, o Brasil tem a modalidade de rescisão por comum acordo, que também gera indenização (20% do saldo do FGTS), fato sequer pensado pela referida Convenção 158 e muito mais protetor que suas proposições.
“Na verdade, se compararmos o texto propositivo da Convenção 158 com a redação expressa do art. 7º, I, da CF/88 (“relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”) não há dúvida que a redação da Constituição é muito mais rígida”, afirma o advogado.