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Arthur Lira pode vetar cassação de Deltan Dallagnol? Entenda o que acontece após decisão do TSE

Deputado mais votado do Paraná teve o registro de candidatura cassado em decisão unânime da Justiça Eleitoral

Arthur Lira disse que cassação de Deltan Dallagnol será enviada à Corregedoria da Câmara

A Câmara dos Deputados foi notificada oficialmente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a decisão unânime que resultou na cassação do registro de candidatura do deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR). O processo foi enviado para a Corregedoria da Casa.

O parlamentar foi eleito pela primeira vez em outubro de 2022 com 344 mil votos - a maior votação do Paraná -, mas teve o mandato cassado por decisão de sete ministros da Corte Eleitoral. De acordo com o relator do processo, Benedito Gonçalves, o parlamentar quis “driblar” a Lei da Ficha Limpa ao pedir exoneração do cargo de Procurador do Ministério Público Federal (MPF) em meio a processos administrativos junto ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

No dia 17 de abril, durante sessão plenária da Câmara dos Deputados, repercutiu uma fala do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que disse que a cassação do mandato de Dallagnol seria decidida pela Câmara.

“O mandato deve ser cassado somente por esta Casa”, resumiu Lira a uma questão de ordem levantada pelo deputado Maurício Marcon (Podemos-RS).

O presidente da Câmara dos Deputados completou, dizendo que o processo será enviado à Corregedoria e Dallagnol teria prazo para se manifestar.

Leia mais: Cassação de Deltan Dallagnol será decidida pela Câmara, diz Arthur Lira

“A Mesa seguirá o que determina esse ato: a Câmara tem que ser citada, a Mesa informará ao corregedor, o corregedor vai dar um prazo ao deputado, o deputado faz sua defesa e sucessivamente”, completou Lira sobre o assunto.

Arthur Lira pode derrubar cassação de Dallagnol?

A Constituição Federal prevê que a Câmara se manifeste sobre a cassação de deputados federais. Em 2009, a Mesa Diretora publicou o Ato da Mesa nº 37, que regulamenta os procedimentos da Corregedoria Parlamentar sobre situações como a de Deltan Dallagnol.

De acordo com o artigo 5º do documento - mencionando os incisos IV e V do artigo 55 da Constituição Federal - nos casos de perda de mandato decorrentes da suspensão dos direitos políticos e por decisão da Justiça Eleitoral - a decisão da Câmara dos Deputados é restrita apenas aos “aspectos formais” da decisão judicial.

Isso significa que, nesse caso específico, o parlamentar não pode apela ao Legislativo para que o mérito da decisão - ou seja, a sua cassação - seja discutido e, eventualmente, alterado.

O advogado e especialista em Direito Eleitoral, Renato Galuppo, diz que a decisão que vale é a do TSE e que o processo passar pela Câmara é mera formalidade.

“Na verdade isso é uma mera formalidade, que realmente está prevista na Constituição. A Mesa Diretora não pode alterar a decisão da Justiça Eleitoral, mas tem que dar ao deputado o direito de se manifestar, não sobre o mérito da decisão, mas sobre aspectos processuais”, explica.

Fora esses aspectos estritamente processuais, a Mesa da Câmara não tem outra alternativa a não ser dar cumprimento ao que foi decidido pelo TSE

Procurada, a Câmara dos Deputados confirma o entendimento do advogado e diz que a Casa analisa apenas os “aspectos formais da decisão judicial”.

“O processo de perda de mandato do deputado Deltan Dallagnol, encaminhado à Câmara dos Deputados pela Justiça Eleitoral, está na Corregedoria da Casa, que analisa apenas os aspectos formais da decisão judicial. De acordo com o Ato da Mesa 37/09, concluída a fase de instrução, o parecer do corregedor é encaminhado à Mesa Diretora da Casa, órgão competente para declarar a perda de mandato (CF, art. 55 - inc. V - §3º)”, diz comunicado enviado à reportagem.

Por que Deltan foi cassado?

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) julgou duas ações semelhantes que questionavam a legalidade do registro de candidatura de Deltan Dallagnol junto ao Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR). Uma delas é assinada pela Federação Brasil da Esperança - grupo de partidos formado por PT, PCdoB e PV. A outra, pelo Partido da Mobilização Nacional (PMN).

Nos processos, as legendas alegam que Dallagnol descumpriu a Lei da Ficha Limpa ao pedir demissão do cargo de Procurador de Justiça, que ocupava no Ministério Público Federal no Paraná (MPF-PR), em meio a processos administrativos que estavam em aberto junto ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Esses procedimentos questionavam sua conduta como chefe da Operação Lava Jato.

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Derrotados em um primeiro julgamento no TRE-PR), os partidos recorreram ao TSE. Na sessão, todos os sete ministros votaram favoravelmente por declarar o registro de candidatura ilegal.

De acordo com o entendimento dos ministros da Corte Eleitoral, Deltan Dallagnol violou a Lei da Ficha Limpa ao pedir exoneração do cargo de Procurador no Ministério Público Federal (MPF) em meio a ações que respondia no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

Leia: Entenda a decisão do TSE que levou à cassação do mandato de Deltan Dallagnol

“Os magistrados e os membros do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente por decisão sancionatória, que tenham perdido o cargo por sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar, pelo prazo de 8 (oito) anos”, diz trecho da Lei da Ficha Limpa correspondente ao caso.

Para o ministro do TSE, Benedito Gonçalves, ao pedir exoneração do cargo, Dallagnol quis evitar que se tornasse inelegível por oito anos em caso de condenação.

“Em outras palavras, quem pretensamente renuncia a um cargo (direito a princípio conferido pelo ordenamento jurídico), para, de forma dissimulada, contornar vedação estabelecida em lei (impossibilidade de disputar eleição para o cargo de presidente de tribunal), incorre em fraude à lei”, disse o corregedor-geral do TSE.

O que Deltan Dallagnol disse sobre a cassação?

A primeira reação de Deltan Dallagnol sobre a decisão do TSE foi feita por meio do seu partido, o Podemos, ainda na noite de terça-feira (16). Na ocasião, em nota, o parlamentar disse que a decisão era uma “vergonha” e que seu sentimento era de “indignação”.

No dia seguinte, ele convocou a imprensa para dar uma declaração sobre o assunto. Rodeado de parlamentares da direita, como o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Júlia Zanatta (PL-SC) e Caroline de Toni (PL-SC) ele disse que a decisão do TSE se deu por “vingança”, devido à sua atuação como procurador da Lava Jato no combate à corrupção.

Fui cassado por vingança

“Fui cassado porque ousei o que é mais difícil no Brasil: enfrentar um sistema de corrupção, os corruptos mais poderosos do país. Ousei me unir a tantos brasileiros que quiseram se erguer contra um sistema de corrupção”, afirmou.

Em seu pronunciamento, ainda atacou outros políticos nominalmente. Os “políticos corruptos e seus amigos estão em festa”, disse Deltan, citando os nomes do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG), o ex-deputado Eduardo Cunha e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes.

Aécio rebateu, mais tarde, em uma nota crítica a Deltan - e disse que sua cassação é o fim de um “curto projeto de poder que agora se esvai”.

“Esse episódio [da cassação] deve servir de exemplo a todos aqueles que, sob o manto de combater a impunidade, cometem os maiores variados crimes. E o que é mais grave: em busca de um projeto de poder. Foi isso que nós assistimos aqui: um efêmero, rápido, curto projeto de poder que agora se esvai. Na verdade, a democracia agradece. Essa é uma página virada e esse cidadão não tem a menor relevância”, disse Aécio Neves à Itatiaia.

“Reconheço que para ele deve ser difícil ver que todas as falsas acusações de que eu fui vítima foram desmascaradas pela própria Justiça. Inúmeros processos foram arquivados, exatamente comprovando a minha inocência, o que não é o seu caso”, acrescentou o ex-governador de Minas Gerais.

Editor de política. Foi repórter no jornal O Tempo e no Portal R7 e atuou no Governo de Minas. Formado em Comunicação Social pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), tem MBA em Jornalismo de Dados pelo IDP.