Uma balança desequilibrada, com trabalhadores de um lado e bilionários do outro. Essa imagem, que parece real, na verdade foi criada por inteligência artificial, e virou símbolo da mais nova campanha nas redes sociais em defesa da taxação dos super-ricos - de quebra, colocou o Congresso Nacional no centro das críticas.
A disputa começou após o Legislativo derrubar
O resultado apareceu nos dados. Segundo levantamento da Genial Quaest, 61% das menções negativas nas redes passaram a mirar o Congresso, enquanto o governo respondeu por apenas 11%. As demais 28% foram neutras. O estudo analisou 4,4 milhões de publicações em plataformas como X, Instagram, YouTube e Facebook entre os dias 24 de junho e 4 de julho.
Para o cientista político Leandro Gabiati, o governo acertou ao permitir que a narrativa ganhasse força fora dos canais oficiais. “Pela primeira vez, o governo conseguiu controlar a narrativa de uma questão política”, avalia. Ele destaca que o movimento foi transversal, mobilizando desde militantes governistas até grupos independentes e opositores críticos ao Congresso.
A mobilização pode até parecer espontânea, mas seu efeito político é calculado. “Uma campanha assim pode empurrar projetos parados, como o do imposto de renda, e reacender o debate sobre justiça fiscal. Mas precisa de continuidade para virar algo relevante em 2026”, diz Gabiati.
Consultados pela Itatiaia, parlamentares da base governista e do próprio PT já apontaram que a nova estratégia é a principal aposta para que, ainda neste ano, o Congresso aprove a proposta que isenta do pagamento do Imposto de Renda quem ganha até R$ 5 mil - principal aposta do governo Lula neste ano. Atualmente, o texto segue sem novidades desde que foi entregue a Câmara dos Deputados. O texto tem relatoria do ex-presidente da Casa, o deputado federal Arthur Lira (PP-AL).
Não pegou bem
Principal alvo dos vídeos de IA e das postagens contra o Congresso, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), rebateu as críticas que ganharam força nas redes. Incomodado com o discurso de que o Congresso estaria protegendo os ricos, Motta afirmou que a narrativa é falsa e que a polarização social não ajuda o país.
“Estimular uma polarização social num cenário de instabilidade não me parece ser o mais correto. Não é disso que o Basil precisa”, disse em entrevista à Record. Para ele, o Parlamento tem colaborado com o governo em diversas pautas sociais e econômicas, e divergências como a do IOF são naturais na democracia.
O deputado também destacou que o IOF atinge todas as classes sociais e pode gerar inflação e encarecimento do crédito, inclusive para micro e pequenos empreendedores. “O Legislativo tem uma relação de parceria e lealdade com o governo, mas pode discordar de algo que o Executivo propõe”, concluiu.
A proliferação dos vídeos e o empurrão do Google
O que ajudou a turbinar essa nova onda de ativismo político digital foi a chegada de uma ferramenta do Google para criação de vídeos com inteligência artificial generativa. A novidade permite produzir peças audiovisuais curtas com roteiro, voz e imagem gerados automaticamente — mesmo por quem não tem experiência técnica.
Com isso, qualquer usuário passou a ter em mãos uma espécie de “estúdio de campanha” portátil. A facilidade tecnológica permitiu que a mensagem se espalhasse de forma descentralizada e veloz, transformando cidadãos comuns em emissores de conteúdo político.
Embora o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tenha aprovado normas para uso de IA nas eleições de 2024, especialistas alertam que será difícil conter a disseminação de conteúdos não oficiais - especialmente quando partem da base da sociedade e não de partidos ou candidatos. A disputa por narrativas, agora alimentada por algoritmos e criatividade digital, promete ser uma das marcas das próximas campanhas.
Se o Congresso vai recuar diante da pressão virtual, ainda é cedo para saber. Mas uma coisa é certa: o campo de batalha mudou - e, agora, também fala com voz de robô.