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‘Raio-X’ do TCU mostra cenário de obras paralisadas, com destaque para Minas Gerais

Relatório do Tribunal de Contas da União detalha ineficácia da gestão e a necessidade de coordenação bilhões de reais em projetos estagnados pelo país

‘Raio-X’ do TCU mostra que Minas Gerais é um dos estados com mais obras paralisadas

O Tribunal de Contas da União (TCU), por meio de um relatório de auditoria operacional, examinou as ações governamentais destinadas a retomar obras públicas paralisadas ou inacabadas, que são financiadas com recursos do Orçamento Geral da União (OGU). Embora o documento não forneça um número exato de obras atrasadas especificamente para Minas Gerais, ele inclui o estado em um panorama mais amplo.

Em Minas, a Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (Setec) informou que, das 393 obras em sua Rede EPCT, 76 estão paralisadas. Desse total, 44% das obras paralisadas da Setec estão concentradas em quatro estados: Minas Gerais, Pará, Amazonas e Rio Grande do Sul.

Um exemplo concreto da situação no estado é a Unidade Básica de Saúde (UBS) em Ribeirão das Neves, que se encontra paralisada desde 2015, com apenas 30% dos serviços concluídos, mas é incongruentemente registrada como “cancelada” no sistema do Ministério da Saúde.

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Atrasos pelo Brasil

Em âmbito nacional, o relatório do TCU revela um aumento progressivo do número de obras paralisadas e do volume de recursos envolvidos. Em abril de 2023, de um universo de cerca de 21 mil obras vigentes, 8.603 estavam classificadas como paralisadas, o que representa um aumento de 741 obras em comparação com 2020.

O valor total de investimento previsto nessas obras estagnadas também disparou, passando de R$ 75,95 bilhões em 2020 para R$ 113,65 bilhões em 2023.

O TCU tem um histórico de fiscalização de obras públicas desde a criação do programa Fiscobras em 1995. Diagnósticos passados, como o de 2007 e 2018, já apontavam causas para as paralisações, como deficiência/interrupção no fluxo orçamentário/financeiro, grande demanda de recursos em confronto com a escassez, e contratação baseada em projeto básico deficiente.

Uma das principais constatações do relatório é a fragmentação e insuficiência das ações governamentais para retomar as obras paralisadas. Cada pasta setorial adota ações isoladas, sem uma coordenação centralizada e eficaz por parte do Centro de Governo. Órgãos de controle, por sua vez, foram responsáveis por apenas 3% das paralisações.

No setor da Educação, que concentra 58,1% das obras paralisadas, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) classifica as obras problemáticas em paralisadas, inacabadas e canceladas. Existem 9.725 obras descontinuadas pelo FNDE, sendo 911 paralisadas, 2.606 inacabadas e 6.208 canceladas.

A principal causa de paralisação identificada pelo FNDE é a falta de pagamento às construtoras. Embora o FNDE tenha implementado ações como grupos de trabalho e monitoramentos trimestrais, o quantitativo de obras paralisadas se manteve praticamente constante entre 2019 e 2022.

Além disso, a impossibilidade de atualização dos valores pactuados originalmente dificulta a retomada de obras inacabadas, forçando os entes a arcar com recursos próprios. Um montante de R$ 941 milhões foi repassado entre 2019 e 2023 para obras canceladas que sequer foram iniciadas.

Outras áreas sofrem com atrasos

No Ministério da Saúde, o relatório aponta inconsistências nos dados, com obras em funcionamento sendo classificadas como “canceladas” e um número real de obras paralisadas possivelmente maior do que o indicado nos sistemas oficiais.

Medidas como a transferência de recursos em parcela única e atualização monetária (índice Sinapi) foram adotadas para evitar interrupções financeiras. No entanto, não há análise de risco prévia ao repasse de recursos que verifique a capacidade de gestão municipal.

Ainda segundo o documento, Ministérios das Cidades e da Integração e Desenvolvimento Regional enfrentam o desafio da mudança na composição do orçamento, com a participação de emendas parlamentares saltando de 15% para 64% entre 2019 e 2022, o que aumenta o risco de novas paralisações por falta de recursos discricionários para manutenção dos contratos. Apesar de listarem operações estratégicas para direcionar emendas, o número de obras paralisadas nesses setores tem aumentado.

A Caixa Econômica Federal, que atua como mandatária da União, também foi avaliada. A instituição reduziu o número de obras paralisadas em sua carteira, em parte devido a uma mudança nos critérios de classificação (de 90 para 180 dias sem evolução).

O TCU ressalta que a ausência de um plano central para gestão das obras paralisadas, que estabeleça estratégia, coordenação e coerência das políticas públicas, é uma das principais causas para a situação atual.

O que o governo tem feito?

Segundo o relatório, apesar do cenário, o governo federal tem demonstrado um movimento recente para enfrentar o problema, com iniciativas como a plataforma “Mãos à Obra”, lançada para diagnosticar a situação das obras em estados e municípios. Essa plataforma já coletou informações de mais de 11 mil obras, incluindo 3.726 novas inclusões.

Outra iniciativa é o Pacto Nacional pela Retomada de Obras e de Serviços de Engenharia Destinados à Educação Básica (instituído pela Medida Provisória 1.174/2023), que foca na área da educação e prevê a repactuação de valores.

O recém-divulgado “Novo PAC” também prevê a alocação de recursos significativos para a retomada de obras paralisadas em diversas áreas, como educação, saúde e desenvolvimento regional.

Propostas do TCU

Diante disso, o TCU propõe uma série de determinações à Casa Civil da Presidência da República, em coordenação com o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos e o Ministério do Planejamento e Orçamento. As determinações incluem:

  • Realizar um levantamento sistematizado e atualizado de todas as obras paralisadas custeadas com recursos federais em 90 dias.
  • Elaborar, em 150 dias, um plano central de gestão das obras paralisadas, que defina estratégias, políticas públicas prioritárias, limites para novos aportes, critérios de priorização (como grau de execução, tempo de paralisação, retorno social e econômico), metas e indicadores de desempenho, e procedimentos para obras consideradas inviáveis.
  • Coordenar, em 180 dias, a elaboração de planos táticos com os órgãos setoriais, detalhando prazos, responsabilidades, atualização de projetos e orçamentos.
  • Disponibilizar todas as informações na plataforma pública ObrasGov.br (antigo CIPI), padronizando os critérios de classificação e incluindo a categoria “obra inviável” em 180 dias.
  • Normatizar procedimentos para obras inviáveis em 120 dias, visando dar segurança jurídica aos gestores.
Graduado em jornalismo e pós graduado em Ciência Política. Foi produtor e chefe de redação na Alvorada FM, além de repórter, âncora e apresentador na Bandnews FM. Finalista dos prêmios de jornalismo CDL e Sebrae.