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Quais os próximos passos do governo Lula para negociar com Trump? Especialistas avaliam futuro do ‘tarifaço’

O adiamento das tarifas para o próximo dia 6, no entanto, não é considerado como um “recuo” por especialistas, já que não houve negociações com o governo brasileiro

Vice-presidente Alckmin (PSB) e o presidente Lula (PT).

O “tarifaço” imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o Brasil estava previsto, inicialmente, para entrar em vigor na última sexta-feira (1º). A Casa Branca, porém, adiou a aplicação das tarifas de 50% sobre alguns produtos brasileiros para a próxima quarta-feira (6). Especialistas, no entanto, não consideram a decisão um “recuo”, já que não houve avanços nas negociações com o governo brasileiro.

João Romero, professor do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Universidade Federal de Minas Gerais (Cedeplar-UFMG), avaliou como “correta” a postura do governo federal, liderado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), que esteve à frente das negociações. De acordo com ele, o Brasil agiu da melhor maneira possível diante de um “ato de agressão” por parte dos Estados Unidos.

Segundo ele, a imposição das tarifas pode, em um primeiro momento, gerar a redução dos preços de alimentos como café e carne, que permanecem na lista de produtos taxados pelos EUA. A curto prazo, na avaliação do professor, o efeito pode ser “positivo” para o comércio brasileiro. “A médio e longo prazo, é mais difícil prever, porque dependerá da capacidade desses setores de ocupar novos mercados. Caso não consigam, pode haver redução na produção e também nos empregos”, explicou à Itatiaia.

O pesquisador e professor da UFMG também comentou sobre a negociação “paralela” de senadores e governadores com os Estados Unidos. Romero avalia que a tentativa revela o “grau de desregulamentação” das instituições estadunidenses, que não possuem um canal claro de interlocução. “Houve um desmantelamento da política externa dos Estados Unidos e uma grande concentração de poder no entorno mais próximo do próprio presidente [Trump]. Foram tentativas pontuais, mas que, ao meu ver, são muito personalistas e sem grande possibilidade de sucesso”, classificou.

A também professora da UFMG, do Departamento de Ciências Econômicas, Patrícia Nasser, considera que os movimentos do governo federal — tanto do Ministério das Relações Exteriores, com o ministro Mauro Vieira, quanto do vice-presidente Geraldo Alckmin, que abriu um canal de diálogo com empresários — demonstram que o Brasil está “com vontade de negociar”. Na avaliação dela, é importante que o país persista em sentar-se à mesa de negociações com Trump, mas sem deixar de demonstrar o “incômodo” com os argumentos apresentados pela Casa Branca.

Na carta, publicada nas redes sociais de Trump, mas destinada ao presidente Lula, os EUA afirmam que “políticas, práticas e ações recentes” do governo brasileiro configuram uma “ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia estadunidense”. O presidente norte-americano classifica as ações contra o ex-presidente Bolsonaro, que tramitam na Justiça brasileira, como “violações de direitos humanos”, e afirma que membros do governo estariam, ainda, censurando empresas dos Estados Unidos.

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Para a pesquisadora, os argumentos de Trump “não são novidade”, uma vez que justificativas semelhantes foram usadas contra a China, por exemplo. “Neste caso, sabemos que há o embaraço relacionado ao ex-presidente [Bolsonaro] e pela proximidade política e ideológica entre o governo Trump e a família Bolsonaro”, comenta.

Sobre o futuro do comércio brasileiro após as tarifas, a professora espera uma postura de “cautela” por parte do governo brasileiro. Ela relembra que os Estados Unidos são historicamente parceiros do Brasil e que, embora mercados alternativos possam ser uma solução temporária, nunca houve uma “indisposição” brasileira com a Casa Branca. “O mais inteligente agora seria continuar pedindo diálogo — que seja bilateral, em nível ministerial ou empresarial — para que cheguemos a um acordo com saídas mais equilibradas, que não prejudiquem tanto ambos os países”, afirmou.

Ela explica que o país precisará ter “paciência” para negociar com Trump e tentar retirar as tarifas dos setores considerados mais importantes para a economia brasileira. “Ele [Trump] não irá permanecer no poder indefinidamente. O governo dele vai passar, e voltaremos a trabalhar e dialogar com os EUA”, concluiu.

Jornalista pela UFMG, com passagem pela Rádio UFMG Educativa. Na Itatiaia, já atuou na produção de programas da grade, apuração e na reportagem da Central de Trânsito Itatiaia Emive. Atualmente, contribui como repórter na editoria de política.