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O dia que ninguém esqueceu: Itatiaia revisita 35 anos do confisco do Plano Collor

O Plano Brasil Novo, que ficou mais conhecido como Plano Collor, foi apresentado ao país em 16 de março de 1990

“Não temos alternativas. O Brasil não aceita mais derrotas. Agora é vencer ou vencer. Que deus nos ajude”. Com essas frases que misturam o enigmático com o épico, o presidente do Brasil tentava convencer seus compatriotas de que o confisco da poupança, da conta corrente e de investimentos era o melhor caminho para conter a inflação galopante que dissolvia os salários da população.

A declaração é de Fernando Collor de Melo, feita em cadeia de rádio e televisão no dia 16 de março.

Collor de Melo é, até hoje, o mais jovem a assumir a presidência do Brasil no período republicano – 40 anos e sete meses de idade. O antigo titular do posto, José Sarney, deixou o cargo com uma inflação de 73% no mês de fevereiro de 1990.

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A pedido do governo que vinha, a gestão que partia decretou feriado bancário para os dias 14, 15 e 16 de março. Indício de que algo estava por vir, como relata Paulo Cézar Feitosa, então com 34 anos de idade, cursando doutorado em economia na Universidade de Campinas.

“Eu peguei uma fila de 4 horas pra chegar no caixa bancário. O que que todo mundo pensa? Melhor ter algum dinheiro no bolso, porque não sei o que vem pela frente”.

O Plano Brasil Novo, que ficou mais conhecido como Plano Collor, foi apresentado ao país em 16 de março- um dia depois da cerimônia de posse. Foi o quarto plano econômico em cinco anos. Portanto era até normal para o país enfrentar fórmulas diferentes, mudanças de moeda e promessas de que o aumento dos preços seria contido.

Zélia Cardoso de Melo, ministra da Fazenda então com 36 anos; o ministro do Planejamento, Antônio Khandir; e o presidente do Banco Central, Ibrahim Eris, fizeram o anúncio. Eram várias as medidas, com destaque para permissão de acesso a apenas 50 mil cruzados novos. Valores acima disso na poupança, na conta corrente ou em investimentos, ficaram retidos, e só seriam liberados 18 meses depois.

O objetivo era dar um choque na economia, reduzindo moeda circulante, a fim de combater a inflação.

“Na expectativa de que eliminando, na pancada, a quantidade de dinheiro em circulação, você seria capaz de controlar a inflação”, explica o professor de finanças e pró-reitor acadêmico do IBMEC, Eduardo Coutinho. “Olhando pra trás, não consigo enxergar de outra forma senão com um absurdo”, sentencia o professor.

“Foi um plano mal pensado, com uma apresentação atabalhoada, mal feita. Esse choque de congelamento de moeda era tentado pela primeira vez, e poderia de fato funcionar. Mas a inflação não tem um só causa, precisa ser combatida de forma conjunta”, avalia o economista Paulo Cézar Feitoza – que atuou no Banco Central do Brasil na década de 1990.

Um dia que marcou gerações

“Lembro como se fosse hoje”, relata à Itatiaia o contador José Mayrink – hoje com 72 anos. “Estava atendendo um cliente, na avenida Cristiano Machado, quando soubemos da notícia. Os clientes ficaram apavorados”.

O médico Rodrigo Huguet, de 50 anos, lembra os dissabores na família causados pelo conficos. “Na época meu pai tava juntando dinheiro para comprar uma casa, e o dinheiro foi todo confiscado”.

A esposa de Mayrink, dona Berenice Costa, de 75 anos, diz que “chegou a duvidar” que a medida fosse verdade. Não apenas pelo carater surpreendente da ação, mas por temer os impactos no pai.

Leontino Costa tinha 67 anos e apoiou a eleição de Collor. Vestiu a camisa e pediu votos para o jovem ‘caçador de marajás’ de Alagoas, que queria modernizar o Brasil, varrer a corrupção e acabar com a inflação.

A quebra de expectativa foi tanta, o impacto foi tão forte que abalou severamente a saúde do caminhoneiro aposentado, afetando toda família.

Ouça a reportagem especial abaixo e acompanhe mais relatos do assunto no Jornal da Itatiaia - 1ª Edição.

Mineiro de Urucânia, na Zona da Mata. Mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Ouro Preto (2024), mesma instituição onde diplomou-se jornalista (2013). Na Itatiaia desde 2016, faz reportagens diversas, com destaque para Política e Cidades. Comanda o PodTudo, programa de debate aos domingos à noite na Itatiaia.
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