O Ministério da Justiça e Segurança Pública apresentou, nesta terça-feira (30), dados sobre tráfico de pessoas no país entre os anos de 2021 e 2023. Um dos pontos destacados no relatório foi a presença de migrantes venezuelanos no Brasil que aumentou nos últimos anos e que tem exposto, sobretudo, a condição das mulheres que cruzam a fronteira.
Conforme o relatório, em novembro de 2023 o Brasil registrava 510.499 venezuelanos refugiados e/ou migrantes vivendo no país - a maioria entra de forma irregular. O dado tem crescido desde 2016, período que marca o agravamento da uma crise humanitária no país governado por Nicolás Maduro. O documento atribui como consequência dessa crise o êxodo de milhares de cidadãos que saíram de seu país em busca de refúgio.
O estudo aponta que o ingresso dos venezuelanos em outros países vizinhos, incluindo o Brasil, acontece em rotas pré determinadas e é intermediado por “trocheros”, o que caracteriza o contrabando de migrantes, delito com aspectos similares ao tráfico de pessoas.
Nesse contexto, as mulheres estão mais expostas a situações de violência, especialmente sexual, por parte dos agenciadores. “Em Boa Vista e Manaus, registraram-se reportes de raptos ocorridos em distintos locais”, cita o documento. Quase a metade dos venezuelanos no Brasil (47%) são do sexo feminino, sejam mulheres ou meninas.
Abusos e privações
Nas rotas clandestinas usadas pelos ‘trocheros’, o relatório aponta que as mulheres estão mais expostas a situações de violência, especialmente sexual, sendo frequente o pedido de “favores sexuais” como forma de pagamento. O documento detalha que esse cenário se agrava para “aquelas que viajam com seus filhos, tendo em vista a ausência de redes de cuidado ou institucional que lhes ofereçam suporte”, diz o trecho do relatório
O documento contextualiza um outro estudo, chamado ‘Construyendo un Mundo Plural. Experiencias y percepciones de mujeres migrantes venezolanas en Guarulhos/SP’, onde as venezuelanas entrevistas explica que após ingressarem no Brasil, a primeira etapa do processo migratório, em Pacaraima (RR), foi marcada por privações como dormir mais de uma semana na rua e ficar mais de dois dias sem alimentação.
Tráfico humano
O relatório divulgado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública aponta que a maioria das vítimas de tráfico humano no Brasil são homens e pessoas negras, destacando a correlação com o crime trabalho escravo.
O relatório aponta que 8.415 pessoas foram resgatadas de condições análogas à escravidão no período de 2021 a 2023. Nesse intervalo, 80% das vítimas eram negras (pretas e pardas), totalizando 6.754 pessoas, enquanto 18% eram brancas (1.497) e 2% indígenas (148). As vítimas do sexo masculino representam 84% dos casos (7.115).
Nesse mesmo período, o Brasil teve 355 trabalhadores não nacionais resgatados, com a maioria sendo de origem paraguaia, venezuelana e boliviana.
Além do tráfico de pessoas para realização de trabalho escravo, o Estado brasileiro também reconhece que houve exploração para remoção de órgãos, servidão, adoção ilegalde crianças e exploração sexual.
A divulgação dos dados faz alusão ao Dia Mundial e Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, celebrado neste dia 30 de julho. Paralelamente, o ministério também anunciou um plano de enfrentamento na área com cinco eixos: estruturação da política, coordenação e parcerias, prevenção ao tráfico de pessoas, proteção e assistência às vítimas e repressão e responsabilização dos autores.
“É preciso que o estado brasileiro, tanto a União como os estados, avancem na investigação em relação a esses crimes. Muitas vezes nós temos a escravidão [...],e não se investiga a questão do crime antecedente, que é o crime de tráfico de pessoas. Então, esse plano avança em diversos aspectos e é construído com organismos internacionais, sociedade civil”, diz o Secretário Nacional de Justiça, Jean Uema.