Ouvindo...

PL Antifacção divide Congresso: governo teme intervenção internacional

Randolfe Rodrigues defende cautela e foco na ação contra o crime e rejeita o rótulo de terrorismo: Paulo Bilynskyj alerta que governo teme exposição internacional

Câmara deve dizer o nome do relator do PL que equipara facção a terrorismo nesta sexta (7)

A definição do relator do Projeto de Lei Antifacção, que pode ser anexado ao PL Antiterrorismo, deve ocorrer nesta sexta-feira (7) pelo presidente da Câmara, Hugo Motta.

O tema ganhou destaque não apenas pela megaoperação contra o Comando Vermelho (CV), realizada nos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro. Mas também pelo receio do governo em equiparar organizações criminosas a terroristas.

Governo teme rótulo de terrorismo e intervenção internacional

O senador Randolfe Rodrigues conversou com a reportagem da Itatiaia e disse que o problema do crime organizado não se resolve com “rótulos”, mas com inteligência, coordenação entre forças policiais e asfixia financeira das facções. O parlamentar rejeita a ideia de transformar o debate sobre crime organizado em disputa ideológica. “Precisamos de menos proselitismo. Como é que se combate o crime organizado? É com qual ordenação das forças de segurança e da inteligência?” Para o senador, o governo federal não é contra punir as facções, mas discorda de que rotulá-las como “terroristas” vá resolver o problema.

“Quer dar nome ao PCC? Organização Social do Terror? Instituição Vocacionada ao Terror? Para mim, parece que é o rótulo que vai resolver. O que vai resolver é derrotar o PCC.”

Randolfe usa uma metáfora para ironizar a proposta: “Você toma uma bebida alcoólica com metanol e pensa que isso aí é só bebida alcoólica. Está o rótulo lá. O que vale? Não é somente o rótulo. Tenha o nome que der.”

O senador também descarta a ideia de que o enfrentamento ao crime se resume à força policial. Ele defende uma estratégia de inteligência e retomada de território, com a presença do Estado após as operações. “Não é apenas confrontando com os agentes do crime que é necessário. Se alguém reage a uma ação policial com arma em punho, deve ter a reação da força policial. Mas não é somente isso. A inteligência é fundamental.”

O senador critica a visão simplista de que o crime organizado se resume ao tráfico de favelas: “Os barões do crime organizado usam paletó, andam de gravata, têm Ferrari e adega de vinhos caros. Eles moram desconectados das favelas, mas comandam o exército que está lá.”

Na visão dele, as ações policiais precisam ser seguidas de presença estatal permanente: “De nada adianta ter uma operação contra o crime em uma área de favela e depois deixar a favela abandonada, para que outros recrutados do crime continuem fazendo o que o PCC e o Comando Vermelho fazem lá.”

Randolfe reforça o que chama de “binômio do governo”: coordenação entre forças e aumento de penas específicas: “As medidas que o governo caminha são baseadas no binômio: coordenação das forças de polícia e aumento de penas para o combate às facções.”

O senador ressaltou que teme, principalmente, que o enquadramento das facções como “terrorismo” abra espaço para intervenção estrangeira, especialmente dos Estados Unidos. Ele diz que em momento nenhum o governo quer dar brecha para qualquer nação estrangeira intervir no Brasil. O problema do crime organizado, segundo ele, vai ser resolvido por nós, brasileiros, pelo governo federal. Ele deixa claro que o governo não se opõe ao rótulo em si, mas ao que ele pode gerar em termos internacionais:

“Não há nenhum obstáculo em rotular. Querem rotular, deem o nome que quiserem, desde que isso não comprometa a soberania internacional.”O senador ironiza a pressão política para rotular as facções e pede foco no que chama de “conteúdo da política de combate. Nós temos forças armadas para policiar as fronteiras, Polícia Federal e polícias estaduais capazes de agir. O problema será resolvido por nós, brasileiros.”

Leia também

Oposição critica e alerta para consequências internacionais

O deputado Paulo Bilynskyj, também conversou com a reportagem da Itatiaia e começou afirmando que os dois projetos do governo são apenas simbólicos e que não possuem impacto real no combate à violência: “São dois projetos do governo que vêm com o selo de combate ao crime organizado.” Ele argumenta que a PEC da Segurança, que teoricamente deveria fortalecer o enfrentamento ao crime, faz o oposto: “A PEC da Segurança em si não traz nenhuma modificação para a forma como se enfrenta o crime organizado no Brasil. Muito pelo contrário. Ela traz uma concentração de poder legislativo e na União que, por exemplo, proibiria a operação que aconteceu no Rio de Janeiro.”

O deputado se refere a operações policiais conduzidas por forças estaduais, como as do Rio de Janeiro, que poderiam ficar inviabilizadas se a União centralizasse o controle sobre ações de segurança. Na visão dele, a proposta tira autonomia dos estados e pode reduzir a capacidade de reação das forças locais.

Sobre o PL Antifacção do governo, Bilynskyj é ainda mais duro. Ele o chama de “muito ruim”, apontando dois problemas centrais:

  1. Segundo ele, seria uma diminuição disfarçada de pena para criminosos condenados por organização criminosa: “Ele vai diminuir a pena dos criminosos que já foram condenados por organização criminosa. Ele propõe um aumento de pena de mentirinha, porque traz uma causa de diminuição que vai reduzir a pena mínima de três anos para um ano e oito meses. Então ninguém vai ficar preso por prática de organização criminosa.”
  2. Ampliação de benefícios a presos, como a visita íntima: “Ele traz uma alteração na Lei de Execução Penal para garantir visita íntima. O governo quer garantir, por lei, que exista visita íntima em presídio. É um absurdo.”

Bilynskyjconclui sua fala dizendo que o Executivo demonstra falta de vocação real para o enfrentamento da criminalidade: “Esses dois projetos materializam essa falta de vocação que o governo tem para o combate ao crime organizado. É uma obstrução vocacional, uma obstrução ideológica. Essa obstrução ideológica do governo acaba fazendo com que ele não tenha capacidade de, em três anos, apresentar nenhuma proposta que seja realmente voltada para o combate ao crime organizado.”

Especialista explica federalização, desafios e impactos diplomáticos

O advogado criminalista Leonardo Tajaribe Jr, sócio do Escritório Paulo Klein Advogados, detalha o que muda se as facções forem tratadas como organizações terroristas: “Esse projeto de lei propõe exatamente a equiparação entre facções criminosas e milícias, classificando-os como organizações terroristas. Isso significa que o ponto principal que passaria a ser investigado pela Polícia Federal e pelos juízes competentes seria também o juízo federal. A Justiça estadual atuaria de forma subsidiária, apenas quando necessário para julgar facções e milícias locais.”

Tajaribe alerta para desafios operacionais da federalização: “Apesar da Polícia Federal ter uma estrutura robusta, tanto no sentido tecnológico quanto de inteligência, essa concentração de competência pode ocasionar uma perda de capilaridade e de eficiência. As forças locais estão mais familiarizadas com as peculiaridades regionais, o que lhes garante maior agilidade na resposta.”

Ele citou exemplos concretos de atuação federal: “ A D.P.F. 635, conhecida como A.D.P.F. das favelas, requisitou que a Polícia Federal instaurasse um inquérito para apurar crimes no Rio de Janeiro com repercussão interestadual e internacional, evidenciando que o STF já atribui um viés federal a esse tipo de crime.”

Sobre os efeitos internacionais, ele reforça: “Ao classificar essas condutas como terroristas, podemos enquadrar o combate às facções no âmbito da segurança internacional, o que deve ser visto com cuidado. Isso pode abrir espaço para cooperações e até intervenções externas. Terrorismo é um problema de segurança internacional, e podem surgir pressões diplomáticas buscando recrudecer as providências do país.”

Tajaribe conclui: “Apesar de se objetivar a federalização para buscar imparcialidade e efetividade, nem sempre isso resulta em maior eficiência. Federalizar gera distância operacional e desconhecimento das realidades locais, o que pode dificultar a continuidade das investigações e a integração entre as forças.

Ao que tudo indica, o secretário de Segurança Pública de São Paulo, deputado licenciado Guilherme Derrite, vai deixar a pasta e retornar à Câmara para assumir a relatoria do projeto

Aline Pessanha é jornalista, com Pós-graduação em Marketing e Comunicação Integrada pela FACHA - RJ. Possui passagem pelo Grupo Bandeirantes de Comunicação, como repórter de TV e de rádio, além de ter sido repórter na Inter TV, afiliada da Rede Globo.