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Na contramão de Zema, líder de governo defende ‘federalização’ de empresas estatais

João Magalhães defendeu projeto de deputado da oposição, que prevê federalizar companhias como a Cemig e a Codemig

João Magalhães defendeu projeto de federalização de empresas estatais

Líder do governo Zema na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), o deputado estadual João Magalhães (MDB) defendeu, nesta terça-feira (22), uma proposta de “federalização” de empresas estatais. O parlamentar recuou, cerca de uma hora depois, com uma nota oficial enviada para a imprensa.

A declaração vai na contramão do que defende o governador do Estado, que enviou aos parlamentares, nesta semana, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que tem como objetivo tornar mais fácil a privatização de empresas públicas.

Em entrevista coletiva, Magalhães afirmou que a proposta poderia gerar mais recursos para o caixa estadual do que a privatização, mas disse não saber se Zema aceitaria a alternativa.

“Eu não sei se o governador vai aceitar a proposta, inclusive fui o primeiro a colocar isso em evidência em uma entrevista na TV ALMG. Acho que seria plenamente viável e [o governo] conseguiria uma arrecadação bem superior do que passar para a iniciativa privada”, afirmou.

Pouco mais de uma hora após a entrevista, Magalhães recuou e disse que “as declarações não refletiram com precisão a minha posição sobre o tema, inclusive já tendo manifestado meu posicionamento contrário em outras entrevistas”, afirmou.

“Ao citar a federalização, a intenção era mostrar que existe uma pluralidade de conversas na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Enquanto líder do Governo na Casa, reafirmo minha defesa das posições do Governo do Estado quanto ao interesse público e com a busca por alternativas que garantam a eficiência e a sustentabilidade das empresas estatais, sempre considerando o bem-estar dos cidadãos e o desenvolvimento econômico do nosso estado”, diz o texto.

Federalização de empresas estatais

Na prática, o que defende o líder do governo Zema na Assembleia é a aprovação de dois projetos de lei que já existem e foram assinados por um deputado da oposição. Professor Cleiton (PV) apresentou um projeto, no primeiro semestre, um projeto que permite que o governo de Minas repasse o controle da Cemig e outro que autoriza o mesmo procedimento para a Codemig - responsável pela exploração de nióbio -, para o governo federal.

Em troca, a dívida de Minas com a União, hoje cerca de R$ 150 bilhões, seria abatida no valor correspondente. O texto ainda está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

À reportagem, o deputado do PV defendeu que Cemig e Codemig sejam repassadas à União como forma de abater a dívida de Minas Gerais.

“Já temos um estudo muito interessante que a incorporação da Cemig pela União resolve um problema nacional. A União passa a deter novamente o controle acionário da Eletrobras. Existe toda uma ristualística jurídica, que passa pelo STF, e por isso é muito bem visto em Brasília”, afirmou. Mas aí fica o questionamento. Pra quem de fato o governo do Estado acena? Pra pagar a dívida de Minas ou para dar as nossas estatais a um grupo de empresários que nós sabemos que têm interesses que nós sabemos que não são os interesses da maioria do povo mineiro?”, questiona o parlamentar.

O Governo de Minas se manifestou, por meio de nota, por volta de 18h desta terça-feira (22), cerca de 2 horas após as declarações de João Magalhães. Conforme o texto, a federalização não resolve o problema.

“O Governo de Minas reforça o interesse em desestatizar as empresas públicas. Mais do que arrecadar recursos que poderão ser utilizados para infraestrutura do estado, as desestatizações têm papel fundamental na melhoria da administração das companhias, que hoje se encontram engessadas pelas amarras burocráticas do Estado. A federalização não resolve esse problema”, diz trecho do comunicado, que segue, ao defender a privatização, como quer o governador.

“Com a desestatização, haverá mais eficiência na gestão e será possível melhorar a entrega de serviços de qualidade aos mineiros. E é exatamente nisso que esta gestão se pauta, ao buscar realizações que melhorem a vida das pessoas. Esse objetivo será alcançado com amplo diálogo e respeito com a Assembleia Legislativa, e contará com a interlocução do nosso líder de governo, João Magalhães, ao qual estamos totalmente alinhados”, diz a nota.

Zema envia PEC à Assembleia

O governador Romeu Zema (Novo) enviou à ALMG uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para retirar a exigência de referendos populares para concluir privatizações da Cemig, da Copasa e da Gasmig.

O texto também propõe diminuir o número de votos para que as privatizações sejam aprovadas. Atualmente, são necessários votos favoráveis de 48 dos 77 deputados estaduais (o equivalente a três quintos do total de parlamentares na Assembleia). Pela proposta de Zema, passaria a ser exigido apenas maioria simples, ou seja, 39 votos.

De acordo com o governo Zema, a mudança do quórum alinha a Constituição Estadual à Constituição Federal.

“Hoje, para se fazer uma obra de melhoria dos serviços de atendimento aos mineiros, tanto Cemig quanto Copasa precisam passar por um longo e burocrático processo de licitação, que nem sempre seleciona as melhores empresas e soluções para o projeto contratado e, na grande maioria das vezes, fica mais caro. Com uma gestão privada, essas companhias ganham agilidade e melhor capacidade de melhorar sua atuação”, disse o governador Romeu Zema ao defender a PEC e as privatizações.

Para mudar a Constituição Estadual, o governador vai precisar dos votos de 48 deputados estaduais. A base de governo tem mais de 50 parlamentares, mas nem todos votam conforme o desejo do governo em todas as votações.

O secretário de Governo de Zema - ex-líder de governo na Assembleia - Gustavo Valadares (PMN) defendeu a proposta e relembrou que a privatização de empresas estatais é promessa de campanha do governador.

“Não é segredo para ninguém quais são as pautas prioritárias do nosso governo. Desde a campanha eleitoral, as desestatizações são defendidas pelo governador Romeu Zema. Com as privatizações, conseguiremos avançar na prestação de serviços para a população, oferecendo cada vez mais qualidade no atendimento”, disse o secretário de Governo, Gustavo Valadares (PMN). Ele será o responsável por articular a aprovação da PEC junto à ALMG.

Reação na Assembleia

Logo após o envio da PEC à ALMG, deputados da oposição reagiram e disseram ter sido “pegos de surpresa”. Em reunião que só terminou na noite desta segunda-feira (21), o bloco Democracia e Luta disse, por meio do líder da bancada, deputado Ulysses Gomes (PT), que daria início a um trabalho de obstrução no Legislativo - quando parlamentares adotam mecanismos previstos no Regimento Interno para evitar ou retardar a aprovação de projetos de interesse do Executivo.

“O governador quer tirar da população o direito de ser ouvida sobre uma situação que vai na contramão da sociedade. Hoje, os principais países de primeiro mundo estão reestatizando seus serviços”, afirmou. “Os serviços públicos, no Brasil, que foram vendidos, privatizados, nós estamos vendo a decadência, o quanto ficou caro. Serviços de energia, por exemplo, vemos o quanto diminuiu a qualidade do serviços”, completou durante entrevista.

O presidente da ALMG, deputado estadual Tadeu Martins Leite, do mesmo partido de João Magalhães, também se manifestou, por meio de uma publicação em rede social. Se, por um lado, defendeu a necessidade do estado se modernizar e avançar, também comunicou que “nada será feito às pressas”.

“Os mineiros merecem que esta decisão seja tomada com muito diálogo, responsabilidade e cuidado com o que é patrimônio da população”, disse.

Nesta terça-feira (22), a coluna de Lucas Ragazzi informou que a reação de deputados à chegada da PEC no Legislativo não foi boa e que deputados cobraram o cumprimento de acordos firmados com interlocutores do governo Zema.

Editor de política. Foi repórter no jornal O Tempo e no Portal R7 e atuou no Governo de Minas. Formado em Comunicação Social pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), tem MBA em Jornalismo de Dados pelo IDP.