Uma fala do deputado estadual Arlen Santiago (Avante), parabenizando o governador mineiro Romeu Zema (Novo) por escolher Igor de Alvarenga para a Secretaria de Estado de Educação gerou indignação na Assembleia Legislativa. Isso porque Arlen disse que Zema merecia cumprimentos por escolher um “afrodescendente efetivo” para comandar a rede estadual de ensino. Ex-secretária de Educação de Minas, a deputada estadual Macaé Evaristo (PT), que é negra, rebateu o colega.
O caso aconteceu nessa quarta-feira (21), durante audiência entre parlamentares e Alvarenga, que esteve na sede da Assembleia, em Belo Horizonte, para prestar contas a respeito de seu trabalho.
“Realmente a gente tem de cumprimentar o governador Zema. Ele pegou um afrodescendente efetivo e deu a ele um dos maiores cargos do estado. E você está se saindo muito bem nisso aí. Então, a coragem do governador Zema de colocar uma pessoa efetiva, da área da Educação Básica, para fazer esse trabalho. Parabéns”, ‘afirmou Arlen.
A palavra “efetivo” utilizada pelo deputado faz menção ao fato de Alvarenga ser servidor de carreira da Secretaria de Educação.
Ao apontar problemas na fala do colega, Macaé citou o termo “coragem”. “O racismo nunca nos escapa. Então, quando uma pessoa negra ocupa um cargo de gestão, a todo momento as pessoas precisam relembrar isso — ou dizer que é preciso ter coragem. Não precisa ter coragem, não, gente. Tem muito professor negro muito competente, como tem médico negro — e em todas as áreas”, protestou.
Uma das responsáveis pela construção do Estatuto da Igualdade Racial de Minas Gerais, a petista defendeu a paridade étnica em cargos estratégicos da administração pública.
“Os governos que não fazem equidade nos seus quadros é porque reproduzem uma cultura institucional racista. É contra isso que a gente luta”, falou. “Não é coragem. É reconhecimento a uma atribuição e a uma competência”, emendou.
A Itatiaia procurou Arlen e Macaé para obter comentários a respeito do caso. A petista optou por não se pronunciar novamente a respeito do assunto.
O parlamentar do Avante, por sua vez, foi acionado por meio de ligação telefônica e por contato com sua assessoria, mas não foi localizado na quinta-feira (22). Nesta sexta-feira (23), ele divulgou nota à imprensa (veja a íntegra ao final do texto), em que reconhece que sua fala deu margem para dupla interpretação, mas afirmou que quis destacar a firmeza de Romeu Zema no combate ao racismo.
“Todos os dias vemos casos sobre o tema e infelizmente, as pessoas negras sendo excluídas de muitos cargos que também lhe são de direito, porque fato é que não deveria haver distinção alguma sobre isso. Mas, lamentavelmente, não é o que acontece”, disse Arlen Santiago.
“A minha fala deixou margem para uma dupla interpretação, especialmente por aqueles que gostam de pegar detalhes para alardear. Tenho a convicção de que o secretário de educação, Igor de Alvarenga, compreendeu a minha fala. Temos uma ótima relação, baseada na estima e no respeito, inclusive com vários bons momentos em viagens às bases eleitorais”, acrescentou o parlamentar.
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Estatuto começa a tomar forma
No fim do mês passado, a Assembleia de Minas deu o pontapé inicial nos debates rumo à apresentação do Estatuto da Igualdade Racial. Além de Macaé, a iniciativa é liderada pelas deputadas Ana Paula Siqueira (Rede), Andréia de Jesus e Leninha — ambas do PT.
O arcabouço legal deve conter mecanismos que garantam o respeito às especificidades da população negra. O incentivo a um modelo de educação que contemple as tradições dos estudantes que vivem em comunidades quilombolas é um dos tópicos debatidos. A ideia é apresentar o Estatuto no ano que vem.
Nota de Arlen Santiago
“Diante das notícias divulgadas na imprensa, referentes a minha fala durante a reunião do Assembleia Fiscaliza, na quarta-feira (21/06), esclareço que:
O intuito da minha fala foi a de exatamente destacar a firmeza do Governador em enfrentar o racismo, uma pauta tão frequente no nosso país. Todos os dias vemos casos sobre o tema e infelizmente, as pessoas negras sendo excluídas de muitos cargos que também lhe são de direito, porque fato é que não deveria haver distinção alguma sobre isso. Mas, lamentavelmente, não é o que acontece.
A minha fala deixou margem para uma dupla interpretação, especialmente por aqueles que gostam de pegar detalhes para alardear. Tenho a convicção de que o secretário de educação, Igor de Alvarenga, compreendeu a minha fala. Temos uma ótima relação, baseada na estima e no respeito, inclusive com vários bons momentos em viagens às bases eleitorais.
O meu foco foi o de elogiar o Governador quanto à questão e quanto à coragem de nomear um servidor efetivo, algo que há muitos anos não se via no nosso estado. Igor de Alvarenga sabe da minha admiração e do quanto eu me orgulho dele ter chegado onde chegou, repito mais uma vez, sendo um servidor efetivo. Conheço a história de vida dele e sei o quanto ele batalhou para chegar até aqui, com muito empenho e constante dedicação.
Durante os meus quase 69 anos jamais cometi um ato que ofendesse qualquer pessoa. Tenho a humildade de assumir que, apesar da vasta experiência na vida, eu continuo em constante aprendizado. Por isso, peço desculpas aos que, mesmo sem querer, eu deixei margem para que se sentissem magoados. Aperfeiçoar-se faz parte de todos nós e hoje aprendo mais um pouco.”