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Há 74 anos fazendo o Frango ao Molho Pardo mais famoso da cidade; conheça a história do Maria das Tranças

Com anos de tradição, o restaurante abate o frango usado no prato no próprio estabelecimento, o que deixa a comida ainda mais fresca e “mineira”

Elis Regina, Vinicius de Moraes, Magalhães Pinto, Cássia Eller, Juscelino Kubitschek, Cesár Menotti. Estes foram alguns dos nomes que passaram pelo Maria das Tranças. E tudo isso é registrado no Livro de Ouro, onde os artistas deixaram assinaturas e mensagens ao passar pelo local. No caso de JK, a relação com o restaurante era ainda mais especial. O político era um cliente assíduo! Se tornou amigo pessoal da família e chegou a almoçar diversas vezes por lá. No livro, ele escreveu “O externo peixe vivo só navega quando encontra o mar da amizade - é o que eu encontrei aqui. Os meus agradecimentos muito cordiais, JK”.

Fundado em 1950, inicialmente se chamando Bolero, o restaurante, ao longo de todos esses anos, se tornou tradição em Belo Horizonte, ficando conhecido especialmente pelo prato do Frango ao Molho Pardo, o carro-chefe. Não foi à toa que atraiu tantos nomes importantes da vida cultural e política da capital - e muitas outras pessoas também. Todos celebravam, no local, uma das maiores virtudes mineiras: a culinária!

E por que Maria das Tranças?

Há 74 anos, em uma casa de fazenda adaptada no bairro São Francisco de Belo Horizonte, o Bolero foi concebido por Dona Maria Clara. Nascida no interior, ela havia se mudado para a capital aos 17 anos, tendo passado por diversos ofícios, desde dona de casa a lavadeira e comerciante.

Quando fundou o restaurante, já tinha seus 50 anos. Foi então que a tradição do Frango ao Molho Pardo começou a nascer em BH. No início, era ela mesma quem realizava as compras, administrava as contas e cozinhava. Na época, o frango era caipira e o cliente escolhia qual galinha queria direto do quintal. Daí em diante Dona Maria Clara começava o preparo, que durava horas. O cliente aproveitava a boa prosa e a cachacinha com rapa de angu. Era mais que um almoço; era uma experiência mineira autêntica!

Com o passar dos anos, o Bolero se tornou Maria das Tranças - apelido pelo qual os clientes chamavam Dona Maria Clara, devido ao penteado que ela usava. Ao longo desse tempo, o restaurante também foi passando de geração em geração e, hoje, está nas mãos de Ricardo Rodrigues, neto de Maria Clara que, com muito carinho, segue os passos e as receitas da avó.

Desde então, muita coisa foi modernizada, mas, como conta o próprio Ricardo, a tradição que consagrou o Maria das Tranças como um dos restaurantes mais emblemáticos de comida mineira de BH se mantém. Hoje, isso é seguido tão à risca que o frango continua sendo abatido em uma estrutura própria do restaurante, garantindo uma carne fresca e um sabor incomparável.

Segundo Ana Luiza, filha de Ricardo e bisneta de Dona Maria Clara, o Maria das Tranças é o único restaurante de Minas Gerais que possui legalização para abater o frango dentro do próprio estabelecimento. Hoje, ela é estudante de gastronomia no Senac e, herdando a paixão pela cozinha de sua bisavó, segue à frente no restaurante, trabalhando e aprendendo.

Além disso, a tradição ainda é tão forte que o local mantém funcionários de muitos anos. É o caso da Maria de Lourdes - ou Dona Lulu, como é conhecida -, cozinheira que começou a trabalhar no restaurante há 40 anos, quando ainda era jovem e, até hoje, mantém viva a essência do preparo do Frango ao Molho Pardo, do Frango com Quiabo e de outros que compõem o cardápio do local e exalam a saborosa mineiridade que conquista os paladares dos clientes há tantos anos.

O Trancinha

Há alguns bons anos atrás, quando o Maria das Tranças ainda era Bolero, um cliente chegou no local pedindo uma panela emprestada para levar o seu Frango ao Molho Pardo para casa. O que ninguém sabia é que, dali pra frente, isso viraria um hábito; várias pessoas começaram a aparecer com a própria panela de pressão para ser preenchida com o prato de sucesso. Nascia o bolerinho!

Hoje, ele se chama Trancinha é um outro restaurante, ao lado do principal e onde os clientes chegam, em dias de domingo ou em feriados e sábados chuvosos, com a própria panela para que ela possa ser enchida de frango e, em seguida, eles possam retornar para comer em casa.

A prática é muito mais do que algo parecido com um delivery ou um takeaway; é um programa de domingo, quando o mineiro raiz sai de chinelo para, além de buscar o almoço, trocar uma prosa, beber uma cervejinha ou uma cachacinha. No local, há até algumas mesas para que os clientes possam relaxar e aproveitar o ambiente descontraído enquanto aguardam o prato. Trata-se uma experiência mineira autêntica, que reúne as pessoas em torno da boa comida e da convivência.,

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Clara Senra é jornalista gastronômica desde 2011 e já aqueceu as panelas para mostrar o que há de melhor na cozinha mineira aqui na Itatiaia. Nossos encontros são às quartas-feiras e sextas-feiras, com histórias de famílias que fazem história na cozinha e também com receitas fáceis, com a cara de Minas Gerais.