Ciro Dias Reis | COP 30 agiliza decisões e o mundo segue faminto por energia

André Corrêa do Lago, presidente da COP30, criou o “Pacote de Belém” para tentar agilizar as negociações

André Corrêa do Lago, presidente da COP30, criou o “Pacote de Belém” para tentar agilizar as negociações

A COP 30 entra na reta final em clima de expectativa.

Estima-se que mais de 150 ministros de estados estarão reunidos nessa etapa. Sua missão será a de afunilar as discussões técnicas dos dias anteriores em direção a decisões e compromissos práticos capazes de justificar a definição “COP da implementação”, como a versão deste ano quis ser caracterizada por seus organizadores.

Há muitas tarefas e pendências na mesa desses negociadores e por isso mesmo o embaixador André Corrêa do Lago, presidente da COP 30, organizou os últimos dias do encontro de forma a agilizar as tomadas de decisão, criando o que chamou de “Pacote de Belém”. Este consiste no esforço de agilizar soluções para temas chave o Objetivo Global de Adaptação (fortalecimento da capacidade de adaptação a mudanças climáticas, como grandes secas e enchentes) e o financiamento destinado a transição para uma economia de baixo carbono.

Outra pendência é a materialização das chamadas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas, da sigla em inglês). Trata-se dos compromissos e metas específicas que cada país deve estabelecer voluntariamente como parte do esforço coletivo para combater as mudanças climáticas, modelo idealizado no âmbito do Acordo de Paris, há dez anos.

Não coincidentemente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve voltar a COP 30 na quarta-feira dia 19 de novembro para participar da negociações. Esta etapa, todos os anos, culmina em um documento final que serve de guia para os próximos passos do ecossistema global que trabalha para enfrentar as mudanças climáticas.

Lula tem insistido que “não podemos sair de Belém sem decisões”. Ele se refere especificamente a encaminhamentos sobre o fim da dependência dos combustíveis fósseis e do desmatamento, bem como a origem dos recursos necessários para se avançar no plano de voo destinado a diminuir as emissões e a velocidade do aquecimento global.

A densidade e a assertividade das decisões tomadas nesses últimos dias de COP 30 darão os contornos, menos ou mais nítidos, da jornada à frente até a próxima parada, a COP 31 daqui a um ano. Sua sede, por sinal, ainda não foi escolhida. A Austrália pleiteia que a elegante Adelaide seja a eleita para o encontro de 2026, enquanto a Turquia oferece a cidade turística de Antalyia; caso haja impasse a indicação pode recair sobre Bonn, na Alemanha.

Não é fácil solucionar o quebra-cabeças representado pelo conjunto de desafios que repousa sobre a mesa dos negociadores na capital do Pará.

Afinal, não se esquecer que países planejam cenários e estratégias fortemente influenciados pelo crescimento pretendido para suas economias. Em outras palavras, sempre é necessário considerar a hipótese de a materialidade dos interesses nacionais voltados aos negócios prevalecerem, em determinados momentos, em detrimento de conceitos e compromissos ambientais. O próprio presidente Lula propõe o fim da era dos combustíveis fósseis ao mesmo tempo em que defende a ideia de a Petrobras prospectar novas reservas de petróleo na chamada Margem Equatorial, no litoral do Amapá.

O recém divulgado World Energy Outlook considera várias possibilidades para os próximos anos em termos de consumo de energia, sem defini-las como previsões firmes. A estrutura apresentada nesse relatório, de responsabilidade da organização autônoma International Energy Agency, baseia-se nos dados mais recentes e abrangentes sobre políticas, tecnologias e mercados.

Sem ser alarmista, o relatório joga luzes sobre o contexto de um mundo cada vez mais instável. “A energia está no centro das tensões geopolíticas atuais, com os riscos tradicionais ao fornecimento de combustíveis agora acompanhados por restrições que afetam o fornecimento de minerais críticos. O setor elétrico – tão essencial para as economias modernas – também está cada vez mais vulnerável a riscos cibernéticos, operacionais e relacionados ao clima”.

Estudo recente do Boston Consulting Group (BCG) indica que a demanda global por energia vai aumentar 16% ao ano até 2028, puxada em grande medida pelo alto consumo dos datacenters que ganham musculatura com o avanço da inteligência artificial. O documento, intitulado “Breaking Barriers to Data Center Growth”, projeta um investimento maciço de 1,8 trilhão de dólares naqueles tipos de instalações até 2030.

É bem verdade que alternativas renováveis, principalmente solar e eólica, devem ultrapassar nesta segunda metade da década o poluidor carvão (fortemente consumido na China e Índia, primeiro e terceiro maiores emissores de gases do efeito estufa) como fontes de energia. Tais alternativas devem alcançar uma participação de até 43% no fornecimento de energia elétrica consumida no dia a dia das cidades e cidadãos até 2030 (hoje é de 32%).

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Mas aqui, novamente, a realidade: se considerada a energia como um todo consumida no mundo (incluindo veículos, navios, aviões e um número enorme de instalações industriais), os combustíveis fósseis continuarão grandes protagonistas nas próximas décadas. Petróleo e seus derivados, gás natural e carvão ainda poderão responder por uma robusta fatia de 75% da energia mundial em 2035.

Uma análise da Climate Action Tracker, grupo internacional formado por especialistas em meio ambiente, sugere que toda uma gama de cenários de emissões, incluindo o mais poluente, indica um pico global seguido de declínio ao longo deste século. Isso de certa forma reverte previsões mais preocupantes de uma década atrás. Um indício, segundo documento do grupo, de que apesar de suas complexidades e concessões, “o Acordo de Paris, firmado há dez anos, ajudou a reduzir a temperatura global”.

O relatório World Energy Outlook mostra como, ao falarmos de emissões e fontes de energia, é necessário considerar o amplo contexto em que essas variáveis estão inseridas, o que torna cirúrgico

o esforço dos negociadores das COPs e outros fóruns ambientais. “Fundamentalmente, à medida que as economias se expandem e as populações e as rendas crescem, cada cenário prevê um aumento na necessidade mundial de serviços de energia, com a demanda crescendo para a mobilidade; para o aquecimento (lares e escritórios); refrigeração, iluminação e outros usos domésticos e industriais. E, cada vez mais, para serviços relacionados a dados e inteligência artificial (IA)”.

Ciro é atualmente board member da International Communications Consultancy Organization (ICCO) sediada em Londres; membro do Copenhaguen Institute for Futures Studies, na Dinamarca; membro do Crisis Communications Think Tank da Universidade da Georgia (EUA). Atua ainda como coordenador do PROI Latam Squad, grupo de agências de comunicação presente em sete países da América Latina.

A opinião deste artigo é do articulista e não reflete, necessariamente, a posição da Itatiaia.

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