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Morte de gari em BH: veja depoimento completo de Renê Júnior, assassino confesso

A Itatiaia teve acesso às declarações na íntegra; versão do autor difere do que disseram as testemunhas

Renê da Silva Nogueira Júnior, de 47 anos, foi preso em uma academia horas após o crime

A Itatiaia teve acesso, nesta quarta-feira (20), à íntegra do depoimento onde Renê da Silva Nogueira Júnior, de 47 anos, confessa ter matado o gari Laudemir de Souza Fernandes, de 44 anos, no último dia 11, no bairro Vista Alegre, região Oeste de Belo Horizonte. Apesar de assumir a autoria do assassinato, o homem alegou que o disparo foi acidental e que não percebeu que alguém havia sido atingido.

No depoimento, colhido nessa segunda-feira (18), Renê Júnior foi representado por um advogado constituído somente para a realização do ato, já que seus defensores abandonaram o caso na mesma data.

Saindo de casa

O assassino confesso alegou que por ser novo no trabalho, ainda não conhecia bem o caminho de sua casa até a empresa em Betim e que, por isso, saiu de casa armado com a pistola da esposa, a delegada da Polícia Civil, Ana Paula Lamego Balbino Nogueira, visando sua segurança pessoal.

Segundo Renê, ele pegou a arma escondido, pela primeira vez, e que Ana Paula o proibia de se aproximar de suas armas. Também disse saber que se tratava da pistola de uso pessoal da esposa, pela forma na qual estava guardada.

Ele afirmou que na manhã do crime havia se esquecido de tomar um remédio psiquiátrico do qual faz uso, porém, disse não se lembrar do nome da medicação. Porém, destacou que esta é indicada para quem sofre de transtorno bipolar a fim de “equilibrar a cabeça”.

Encontro com o caminhão de lixo

O homem afirmou que, em determinado momento, percebeu que se atrasaria para o trabalho e avisou ao seu chefe. Visando ganhar tempo e escapar do trânsito, seguiu uma nova rota do GPS que o levou a um bairro desconhecido. Lá, acabou em um beco sem saída. Alertado por populares da situação, deu ré e retirou a arma da mochila, a colocando entre sua perna e o banco do carro.

Ainda de acordo com Renê, ao virar uma rua, ele se deparou com o caminhão de lixo parado, impedindo a passagem e que mesmo com a motorista dizendo para ele passar, não havia espaço para tal.

Discussão

O homem afirmou que neste momento a condutora do caminhão viu a arma e alertou os garis, que, na versão de Renê, teriam ido para cima dele.

Ele alegou que um dos coletores de resíduo veio em sua direção, proferindo as seguintes palavras: “Filho da p***, ameaçar mulher é fácil, quero ver fazer isso com um homem”.

Renê alegou, então, que desceu com a arma de fogo em punho, sem apontar para ninguém, direcionada ao solo. Acrescentou, ainda, que neste momento, o gari que xingou o recuou e falou: “Com arma é fácil”.

Ele afirmou que levantou a arma e falou para o coletor: “Quer resolver na mão, bicho?”

O disparo

De acordo com a versão de Renê, neste momento a arma disparou, de forma acidental. Segundo ele, o coletor com quem discutiu não foi atingido e após o disparo, todos correram. Por isso, não viu que alguém havia levado o tiro. Por isso, entrou no carro e seguiu seu caminho. O homem afirmou que se tivesse visto, teria prestado socorro.

Além disso, afirmou que deixou o local temendo responder por, “no máximo”, porte ilegal de arma de fogo.

Ligação da esposa

Renê declarou que recebeu uma ligação de sua esposa, a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira, pouco depois do ocorrido. Segundo ele, a mulher queria saber se ele havia chegado ao trabalho.

Segundo o assassino confesso, ele não contou para sua mulher sobre o que tinha acontecido porque não queria preocupá-la, já que foi orientado a não seguir rotas alternativas do GPS. Em sua versão, limitou-se a dizer que ainda não havia chegado e “disse para ela que não daria certo comprar uma casa em localidade mais distante do que a que eles já estavam morando”.

Seguiu a rotina

Renê Júnior declarou que seguiu para seu trabalho e, chegando no local, deixou a arma debaixo do banco do carro e trabalhou normalmente. Depois, por volta das 13h07, deixou o trabalho e voltou para casa, pois finalizaria a atuação naquele dia de forma remota.

Segundo ele, ao chegar, guardou a arma no mesmo local onde tinha pegado, fez uma ligação de cunho profissional e foi passear com seus cachorros.

A prisão

O assassino de Laudemir afirmou que só ficou sabendo da morte do gari quando foi conduzido pela polícia, em uma academia de alto padrão na região Oeste de BH. Segundo ele, colaborou com os policiais e ao mostrar seu carro, fez uso de cinco comprimidos de clonazepam, um medicamento ansiolítico que atua no sistema nervoso central e promove um efeito tranquilizante, sedativo e relaxante, para se acalmar, três a mais que a recomendação médica.

Além disso, Renê Júnior negou ser usuário de drogas.

Arrependimento

Por fim, Renê se disse arrependido do crime, por ter jogado fora a vida da vítima, dele próprio, atrapalhado a vida da esposa, do filho, da família da vítima; Por fim, afirmou que o Estado de Minas Gerais lhe acolheu muito bem, sendo um local onde o possui muitos amigos, aos quais sabe que decepcionou.

Leia o depoimento na íntegra

DECLARAÇÕES sobre os fatos constantes no APFD nº 212/2025, de PCnet nº 17427253, que apura o homicídio consumado de LAUDEMIR DE SOUZA FERNANDES, ocorrido no dia 11/08/2025, no bairro Vista Alegre; QUE o declarante foi cientificado pela Autoridade Policial, Evandro Nascimento Radaelli, quanto a seus direitos e garantias fundamentais do art. 5º da CRF/88, dentre eles, o de ficar em silêncio, sem que isso implique prejuízo à sua defesa ou presunção de sua culpa, o direito à assistência de sua família e de advogado constituído;

QUE os autos digitais do presente APFD foram devidamente encaminhados aos advogados do investigado, e na oportunidade foram comunicados acerca da ocorrência da presente oitiva;

QUE nesta especializada, foi dada a oportunidade ao declarante de entrevista reservada com seu advogado; QUE o declarante encontra-se devidamente acompanhado de seu advogado, o Dr. Leonardo Guimarães Salles, OAB-MG 89.329, que neste ato apresentou sua manifestação de RENÚNCIA, cuja petição será por ele juntada ao pje, conforme informado pelo nobre causídico;

QUE também compareceu nesta especializada o advogado, Dr. Lázaro Samuel Gonçalves Guilherme OAB-MG 131861, que foi constituído pelo investigado SOMENTE para realização do presente ato; QUE perguntado ao declarante se irá se manifestar acerca dos fatos que estão sendo imputados a ele, ou ficar em silêncio, respondeu que irá se manifestar;

QUE sobre o dia do crime: o declarante saiu de sua casa, localizada no Vila da Serra, por volta das 08h05 da manhã, para o trabalho, na empresa Mellore, localizada em Betim; QUE o declarante informa que o horário em que teria que estar no trabalho era 08h; QUE o declarante ressalta que era sua primeira semana no trabalho; QUE o declarante pegou a arma de sua esposa escondido e colocou dentro de sua mochila; QUE o declarante afirma que foi a primeira vez que pegou a referida arma;

QUE o declarante diz que decidiu pegar a referida arma pelo fato de estar indo para local perigoso e que não conhecia muito bem as vias, pelo fato de ser de outro estado e estar receoso; QUE o declarante levou a arma com intuito de proteção, pois estava muito tenso; QUE o declarante largou o trabalho em São Paulo para residir em Minas Gerais com sua esposa; QUE na referida manhã, o declarante estava muito ansioso com o novo ofício, tendo esquecido de tomar o seu remédio; QUE não se recorda do nome do remédio, mas esclarece que é indicado para quem sofre de transtorno bipolar a fim de equilibrar a cabeça (estabilização), conforme se expressa;

QUE o declarante afirma que pegou a arma ciente de que se tratava da arma de uso particular de sua esposa, e não a institucional; QUE o declarante esclarece que a sua esposa o proibia de se aproximar de suas armas; QUE o declarante afirma que sabia diferenciar a arma institucional da particular, pois a institucional ficava dentro de uma caixa escrito glock, e a particular não, além do fato de que a institucional possuía o nome da polícia civil; QUE o declarante afirma que foi a primeira vez que pegou a arma de fogo da sua esposa e nunca houve incidentes envolvendo o armamento;

QUE o declarante, portanto, se dirigiu ao seu trabalho, fazendo uso do waze e Google Maps para realizar o trajeto; QUE o declarante afirma que entre o trajeto da sua casa até o BH shopping, demorou aproximadamente 30 (trinta) minutos; QUE neste momento, mandou mensagem para o seu chefe, informando que iria se atrasar por conta do trânsito; que o declarante afirma que em um dado momento do seu trajeto, em decorrência do intenso trânsito, o waze orientou a pegar um desvio para dentro de um bairro, que não sabe esclarecer qual, mas que deságua na Av. Tereza Cristina;

QUE no momento em que pegou este desvio, o declarante se deparou com um beco, sem saída; QUE afirma que populares informaram ao declarante que o beco era sem saída e para ele retornar; QUE neste momento, o declarante retirou a arma da mochila e colocou embaixo da perna; QUE o declarante afirma que deu um golpe na arma no momento em que saiu do beco;

QUE acerca da suposta ameaça à motorista do caminhão: QUE o declarante afirma que se deparou com um engarrafamento causado por um caminhão de lixo em uma rua estreita; QUE o declarante esclarece que o caminhão de lixo deixou todos os carros passarem, e quando o declarante ia passar, o caminhão veio em sua direção; QUE o declarante gritou: “meu carro é largo, não vai passar”; QUE quando o declarante passou ao lado do caminhão, viu que era uma motorista, e esta gritou: “ele está armado”; QUE o declarante esclarece que a arma de fogo estava entre suas pernas, tendo sido possível a motorista visualizá-la;

QUE o declarante afirma que neste momento um dos coletores de resíduo veio em sua direção, proferindo as seguintes palavras: “filho da puta, ameaçar mulher é fácil, quero ver fazer isso com um homem”; QUE o declarante desceu com a arma de fogo em punho, sem apontar para ninguém, direcionada ao solo; QUE o declarante afirma que neste momento, o referido coletor, que xingou o declarante recuou, e falou: “com arma é fácil”; QUE o declarante levantou a arma de fogo, e falou para o coletor: “quer resolver na mão, bicho?”;

QUE neste momento, a arma disparou; QUE o declarante ressalta que não estava mirando a arma para o coletor; QUE o declarante afirma que o coletor que foi atingido não estava envolvido na confusão, ou seja não foi o que supostamente xingou o declarante; QUE o declarante afirma que o coletor que xingou o declarante era de pele escura, de cabelo baixinho, com bigode, magro, com calça cor de abóbora;

QUE após o disparo, os coletores correram, e o declarante entrou no seu veículo e continuou o seu trajeto; QUE neste momento não percebeu que o coletor de resíduo havia sido atingido, pois caso tivesse visto, teria prestado a devida assistência; QUE perguntado se deu golpe na arma neste momento, respondeu que não, pois já o havia realizado no momento em que saiu do beco; QUE o declarante se recorda que caiu uma munição, na rua, no momento em que saiu do veículo e que tentou pegar, mas não conseguiu; QUE o declarante não imaginou que o disparo havia acertado alguém, já que viu todos os coletores correndo, com exceção da motorista, que ficou dentro do caminhão;

QUE o declarante saiu do local imaginando que poderia responder no máximo por um porte ilegal de arma de fogo, já que não suspeitou de ter acertado alguém; QUE o declarante ressalta que recebeu uma ligação de sua esposa alguns momentos depois, em que ela pergunta se ele já havia chegado ao trabalho; QUE o declarante respondeu que ainda não havia chegado, e disse para ela que não daria certo comprar uma casa em localidade mais distante do que a que eles já estavam morando; QUE perguntado se ele cientificou a esposa acerca do ocorrido, respondeu que não; QUE o declarante não quis preocupar a sua esposa, em razão da orientação, por parte dela, de não seguir os desvios do waze;

QUE o declarante se deslocou até o trabalho, e deixou a arma de fogo debaixo do banco do carro, antes de entrar na empresa; QUE o declarante trabalhou normalmente, na parte da manhã, e saiu da empresa por volta de 13h07 ou 13h17, horário de almoço; QUE o declarante tinha duas reuniões marcadas para tarde, mas não iria retornar para a empresa pois iria fazer tais reuniões de forma remota, de sua casa;

QUE o declarante tirou a arma de fogo da mochila e a guardou no mesmo local que havia pegado, tendo em vista que sua esposa estava para chegar e o declarante não queria que ela soubesse que ele havia pegado sua arma de fogo; QUE o declarante esclarece que o local onde a arma estava guardada era em cima da estante do escritório, que é o local mais alto da casa; QUE no seu horário de almoço, o declarante mandou mensagem para sua esposa: “paulinha, você passeou com os cachorros?”; QUE diante da negativa de sua esposa, o declarante desceu com os cachorros para passear no espaço pet de seu condomínio; QUE enquanto o declarante estava passeando com os cachorros, fez uma ligação a respeito de assunto de trabalho; QUE o declarante ressalta que não falou sobre o ocorrido (briga de trânsito) em referida ligação;

QUE o declarante nega fazer uso de drogas; QUE o declarante afirma que só tomou conhecimento da morte do coletor de resíduo quando estava na academia, através da polícia militar; QUE o declarante mostrou o seu veículo à polícia militar, e a todo momento colaborou com os policiais, sem oferecer resistência, conforme se expressa; QUE no momento em que foi abordado pelos policiais militares, quando abriu seu veículo para a verificação dos policiais militares, o declarante afirma ter tomado 05 (cinco) comprimidos de clonazepam 2mg para se acalmar;

QUE o declarante esclarece que a recomendação médica para ele é de apenas 02 (dois) comprimidos; QUE DADA A PALAVRA À DEFESA, esta indagou: QUE perguntado se o declarante se arrepende do que fez, o declarante respondeu que sim, por ter jogado fora a vida da vítima, dele (declarante), atrapalhado a vida da esposa, do filho, da família da vítima; QUE o declarante ressalta que o Estado de Minas Gerais lhe acolheu muito bem, sendo um local onde o declarante tem muitos amigos, aos quais sabe que decepcionou; QUE o declarante prestou tais declarações sem o uso de coação física e nem psicológica. A Autoridade Policial cientificou-lhe quanto a seus direitos e garantias fundamentais do art. 5º da CRF/88, dentre eles, o de ficar calado, a assistência de Advogado e de seus familiares; o de ter sua integridade física e moral respeitadas. Nada mais disse nem lhe foi perguntado.

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Maic Costa é jornalista, formado pela UFOP em 2019 e um filho do interior de Minas Gerais. Atuou em diversos veículos, especialmente nas editorias de cidades e esportes, mas com trabalhos também em política, alimentação, cultura e entretenimento. Agraciado com o Prêmio Amagis de Jornalismo, em 2022. Atualmente é repórter de cidades na Itatiaia.