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Gari morto em BH: Justiça nega bloqueio de bens de assassino e delegada

Juíza indeferiu o pedido por entender que a solicitação é prematura na fase pré-processual e que não há indício de dilapidação patrimonial

Renê da Silva Nogueira Júnior e sua esposa, a Ana Paula Lamego Balbino Nogueira

A juíza Ana Carolina Rauen de Souza, da 1ª sumariante da Comarca de Belo Horizonte, negou, na tarde desta quarta-feira (20), o pedido de bloqueio de bens de Renê da Silva Nogueira Júnior, 47 anos, e de sua esposa, a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira. O homem é o assassino confesso do gari Laudemir de Souza Fernandes, de 44 anos, morto no último dia 11, no bairro Vista Alegre, na região Oeste de Belo Horizonte.

O pedido de bloqueio, no valor de R$ 3 milhões, foi protocolado pelo advogado criminalista Tiago Lenoir, que atua como auxiliar da acusação. O objetivo era que a família de Laudemir seja indenizada futuramente e que o patrimônio do casal não fosse dilapidado durante as negociações.

A juíza responsável pela negativa entendeu que a solicitação é prematura na fase pré-processual, onde não há contraditório nem ampla defesa instaurados. Segundo ela, a pretensão é de natureza cível e não se insere no âmbito do juízo criminal durante o inquérito, exigindo dilação probatória para apurar a extensão da responsabilidade e os parâmetros de reparação. Além disso, apontou que não há indício mínimo de dilapidação de patrimônio que justifique a medida.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) emitiu nota sobre o indeferimento do pedido de bloqueio de bens. Leia na íntegra:

“Em decisão publicada no fim da tarde de hoje pela juíza ANA CAROLINA RAUEN LOPES DE SOUZA, sumariante do 1º Tribunal do Júri, em que forma apreciados pedidos diversos no âmbito do inquérito que apura o homicídio praticado contra Laudemir de Souza Fernandes, foi indeferido o pedido do MP de indisponibilidade dos bens do investigado, referentes ao valor de R$ 3 milhões, por ter a juíza entendido que ‘o pedido não comporta deferimento neste momento’.

Em seu despacho, a juíza considerou que ‘o inquérito policial possui natureza meramente informativa e inquisitiva, destinando-se precipuamente à colheita de elementos que subsidiem eventual ação penal. Nesta fase pré-processual não há contraditório nem ampla defesa instaurados, sendo que se mostra prematura a análise de tal pedido, sem que haja sequer a formação da relação processual, tampouco a apresentação do relatório de investigações pela autoridade policial’.

Ela ainda destacou que a atuação do juiz da vara criminal nessa fase, inquérito ou investigação, ‘deve ser tão somente controlar a legalidade dos atos e fiscalizar eventual irregularidade.’

Leia a decisão na íntegra

“1. Do Pedido de Habilitação de Terceiros Interessados

O Município de Belo Horizonte (ID10517202817) solicitou habilitação no Inquérito Policial, alegando ser vítima secundária do delito e ter interesse em contribuir para a elucidação dos fatos, visto que Laudemir de Souza Fernandes estava no cumprimento de função pública municipal.

O município argumenta que o ato criminoso foi praticado contra um agente público em pleno exercício de suas funções, concluindo que a agressão fatal não foi um ato isolado de violência interpessoal, mas uma “bárbara reação contra a regular execução de um serviço público essencial, notadamente de limpeza urbana”.

Considerando especialmente o fato de a vítima estar no exercício de sua função pública, o pedido de participação do Município de Belo Horizonte no momento inquisitivo não foi considerado pertinente. As investigações já se encontram em fase de conclusão, e uma intervenção neste estágio poderia causar tumulto na apuração dos fatos. Diante disso, a intervenção do Município de Belo Horizonte foi indeferida por ora, reservando-se o direito de nova apreciação de sua intervenção no curso da Ação Penal.

No mesmo sentido, o Pedido de Habilitação do Sindicato dos Empregados em Edifícios e Condomínios, em Empresas de Prestação de Serviços em Asseio, Conservação, Higienização, Desintetização, Portaria, Vigia e dos Cabineiros de Belo Horizonte (ID10519060735), com a intenção de acompanhar o inquérito policial “como forma de defesa dos interesses coletivos e da própria segurança da categoria”, também foi indeferido.

Embora reconhecendo o interesse da associação em defender os direitos da vítima e da categoria, o pedido foi indeferido nesta fase, pois o inquérito está em fase de encerramento, e não foi vislumbrada motivação para deferir a intervenção do Sindicato no momento investigativo. O direito de reexaminar a questão no curso do processo foi igualmente reservado.

2. Do Pedido de Habilitação de Assistente de Acusação

De acordo com a Legislação Pátria em vigor, a figura do Assistente de Acusação é admitida somente na fase processual, não havendo previsão para sua atuação formal durante a investigação. O artigo 268 do Código de Processo Penal (CPP) estabelece: “O Ministério Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no Art. 31”.

É evidente que o dispositivo legal se refere à intervenção do assistente na fase da Ação Penal, e não na Persecução Penal de forma ampla. Há uma restrição do alcance da assistência à fase processual, não abrangendo o Inquérito Policial ou qualquer espécie de investigação criminal prévia. Contudo, nada impede que a vítima, por meio de advogado, acompanhe o inquérito, e a partir do recebimento da denúncia, será possível analisar o pedido de habilitação para uma atuação mais ativa no processo. Dessa forma, o Pedido de habilitação de Assistente de Acusação foi indeferido. Para fins de registro, a advogada peticionária de ID 10515656531 sequer consta da procuração acostada aos autos.

3. Do Pedido de Indisponibilidade de Bens

Trata-se de um requerimento formulado por parentes da vítima, no bojo do inquérito policial, visando à decretação de indisponibilidade de bens do investigado para assegurar futura indenização (ID 10517387172). O Ministério Público opinou pelo deferimento do pedido, sugerindo o valor de R$3.000.000,00 (Três Milhões de Reais).

Após análise das razões apresentadas pelos familiares da vítima e do parecer do Ministério Público, o pedido não foi deferido neste momento. O inquérito policial destina-se precipuamente à colheita de elementos que subsidiem eventual ação penal. Nesta fase pré-processual, não há contraditório nem ampla defesa instaurados, sendo prematura a análise de tal pedido sem a formação da relação processual ou a apresentação do relatório de investigações pela autoridade policial.

O Juiz atua no curso do processo penal, não no inquérito ou investigação, sendo sua atuação nesta fase apenas controlar a legalidade dos atos e fiscalizar eventuais irregularidades. Além disso, a pretensão deduzida possui natureza tipicamente cível, visando à garantia patrimonial para futura reparação de danos, o que não se insere no âmbito de cognição do juízo criminal em sede de inquérito. A constrição patrimonial para assegurar eventual reparação civil depende de devida dilação probatória para apurar a extensão da responsabilidade e os parâmetros para a efetiva reparação do dano.

Mesmo na seara penal, o sequestro e demais medidas assecuratórias possuem disciplina específica, exigindo pressupostos que não se fazem presentes, tampouco foram adequadamente demonstrados no presente expediente. Não se vislumbra nos autos, neste momento, qualquer indício mínimo de dilapidação de patrimônio que justifique tal decisão. Consequentemente, não sendo o inquérito policial a via adequada para a apreciação da pretensão deduzida, o pedido formulado no ID10517387172 não foi conhecido.

4. Tendo em vista que as investigações ainda estão em curso e que os órgãos de persecução criminal possuem poder de requisição, os requerimentos formulados no item “2" da petição de ID 10517387172 também não foram conhecidos, uma vez que tal diligência será realizada por eles, caso seja pertinente ao deslinde das averiguações.

5. Os advogados que renunciaram no ID10519021759 devem ser descadastrados.

6. Deve-se certificar se houve a resposta dos Ofícios às empresas de Telefonia; em caso negativo, o Ofício deve ser reiterado através de mandado.

7. Os autos devem ser devolvidos à DEPOL com urgência, considerando que há prazo em curso para a conclusão das investigações.

Belo Horizonte, data da assinatura eletrônica.

ANA CAROLINA RAUEN LOPES DE SOUZA

Juiz(íza) de Direito

Tribunal do Júri - 1º Sumariante da comarca de Belo Horizonte”

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Renê negava crime

Na audiência de custódia que transformou a prisão em flagrante em preventiva, realizada quarta-feira (13) da semana passada, Renê negou ser o autor do disparo que matou o gari.

Ele alegou que deixou o trabalho às 13h17, foi para casa, em Nova Lima, passeou com os cães, trocou de roupa e foi para a academia. “Cheguei da academia 14h10, deve estar nas câmeras da academia. Adentrando a academia no elevador, no outro elevador estavam os policiais com a advogada da empresa, acredito eu que a empresa do rapaz que teve a infelicidade de falecer. Ela falou: ‘É esse rapaz aí de bermuda azul e blusa branca’. Só que não é a mesma roupa que eu estava de manhã", afirmou na audiência.

O suspeito explicou ainda ter ido trabalhar de calça social preta da Diesel e camisa polo marrom. Sobre o carro que aparece nas imagens na cena do crime, o executivo garante ser diferente do modelo do veículo em que estava no dia da morte do gari. Ele, inclusive, disse que passou essa informação para os policiais militares que o prenderam em uma academia de luxo na avenida Raja Gabaglia.

“Abri as quatro portas para mostrar o carro, porque ele me mostrou a foto do carro na rua do acontecimento. Eu não conheço porque não sou daqui, conheço a Via Expressa onde eu estava e, quando ele aproximou a foto, eu disse: ‘Esse carro não é meu’. Meu carro não é elétrico, é um híbrido. Só ampliei a foto do carro que foi tirada: ele tem uma lateral cromada, meu carro não tem essa lateral.”

Maic Costa é jornalista, formado pela UFOP em 2019 e um filho do interior de Minas Gerais. Atuou em diversos veículos, especialmente nas editorias de cidades e esportes, mas com trabalhos também em política, alimentação, cultura e entretenimento. Agraciado com o Prêmio Amagis de Jornalismo, em 2022. Atualmente é repórter de cidades na Itatiaia.