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Análise de PEC do Nascituro em comissão da Assembleia tem bate-boca e acusações de nazismo

Deputados analisariam Proposta de Emenda à Constituição na CCJ da Casa, mas acordo retirou projeto da pauta; discussão pode terminar no Conselho de Ética

Deputados estaduais Bella Gonçalves (Psol) e Bruno Engler (PL)

A análise da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 26/2023 na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), terminou com bate-boca e trocas de acusações entre deputados nesta terça-feira (24). O texto propõe a inclusão de um novo parágrafo no artigo 4º da Constituição estadual para assegurar explicitamente direitos ao nascituro.

Os membros da CCJ haviam entrado em acordo para retirar o texto da pauta da Comissão para aprofundar as análises. Antes da formalização da retirada, no entanto, a deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL), pediu a palavra para questionar o teor da proposta e foi rebatida por Bruno Engler (PL), que chamou os críticos à PEC de ‘nazistas de luvas brancas’.

Bella começou falando que o projeto é inconstitucional, uma vez que Minas Gerais não pode regrar de forma diferente da lei federal. Ela citou, então, que o texto representa um retrocesso para o país.

“Pode prejudicar desde pesquisas genéticas, embrionárias, fertilização in vitro, até o exercício de aborto legal em casos de estupro, que acontece principalmente com meninas de até 13 anos”, disse, afirmando, ainda, que a Casa deveria retirar o projeto de pauta para maiores discussões.

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O que diz a PEC?

A Proposta de Emenda à Constituição nº 26/2023 propõe a inclusão de um novo parágrafo no artigo 4º da Constituição estadual para assegurar explicitamente direitos ao nascituro.

Entre os direitos listados estão o direito à vida, à identidade genética, aos alimentos gravídicos, à imagem, à honra e ao direito de ter seus batimentos cardíacos escutados pela genitora. A proposta visa reforçar o reconhecimento jurídico da vida desde a concepção, alinhando-se à proteção já prevista no Código Civil.

Na justificativa, os autores argumentam que o objetivo é valorizar a vida como direito primordial e promover a conscientização sobre a existência do ser humano em gestação. Além disso, pretendem incentivar o vínculo materno e prevenir traumas tanto para a mãe quanto para o bebê.

‘PEC do Estuprador’

A discussão ficou acalorada quando a deputada chamou a Proposta de Emenda à Constituição de “PEC do Estuprador”.

“Eu gostaria de debater a gravidez a partir das perspectivas de fortalecimento das crianças e das mulheres que fosse condizente com a ciência, e não esse negacionismo cego, que a PEC do nascituro, que eu chamo de PEC do estuprador, propõe. É um negacionismo que, ao indicar que a vida começa desde sua concepção, inviabiliza pesquisa em células tronco que garante milhares de vidas”, disse.

Bella também afirmou que um ponto da PEC, que determina que a gestante vítima de estupro deve ouvir os batimentos cardíacos do feto, pode ser considerado uma prática de tortura. “Quem está falando isso não sou eu. É a Organização Mundial da Saúde. Consideramos que esse projeto é um retrocesso à ciência e ao direito das mulheres”.

“Limpem a boca suja de vocês para falar que vocês defendem a vida e as crianças”, disparou.

‘Nazistas de luvas brancas’

Bruno Engler, então, pediu a palavra e chamou os críticos à PEC de ‘nazistas de luvas brancas’.

“Quero lamentar a canalhice e mentira de parlamentares, que, para esconder a maldade de querer matar crianças inocentes, ficam fazendo discursos mentirosos. Verdadeiros nazistas de luvas brancas, como dizia o finado Papa Francisco. Pessoas que quererm preservar infância, matando-as. É com a morte que se preserva a vida das crianças. Esse é o raciocínio desse pessoal”.

A fala de Engler é em alusão à uma declaração do Papa Francisco, em 2018, quando a Argentina aprovou uma proposta de legalização do aborto. O Papa comparou a ação com a prática do nazismo para conseguir a raça pura, mas com ‘luvas brancas’.

Engler seguiu seu raciocínio, dizendo que os opositores à PEC têm uma ‘sanha assassina e genocida’. “É uma canalhice, uma crueldade, uma sanha assassina e genocida para matar aqueles que ainda não nasceram, que não têm culpa”, afirmou.

“Qual é o benefício ao estuprador dessa criança nascer? A hipocrisia está no fato de que esses hipócritas e canalhas defendem que o estuprador não pode ter pena de morte, não pode ser castrado, mas à criança, que é inocente, é imputada a pena de morte”, disparou.

O deputado também defendeu que as mães escutem, por lei, os batimentos cardíacos do feto. “Porque o que a gente observa hoje em dia, por parte dos nazistas de luvas brancas, é uma tentativa desonesta de relativizar e desumanizar o nascituro. É dizer que aquilo não é uma vida, não é um ser humano, mas é um amontoado de células”, disse.

Discussão pode parar no Conselho de Ética

Bella voltou a pedir a palavra para questionar a quem o deputado Engler chamava de ‘nazista’. Segundo a deputada, a discussão gira em torno de argumentos médicos.

“Isso é de uma gravidade enorme. Uma falta de decoro e ofensa moral gigantesca. O nazismo foi uma prática cometida com o objetivo de dizimar o povo judeu. A discussão que fiz aqui é sobre prática médica, sobre direito das mulheres, sobre o direito de pessoas que foram estupradas. Ser chamada de nazista de luva branca é algo de uma gravidade muito grande”, afirmou.

A deputada, por fim, disse que o Conselho de Ética da Casa pode ser acionado para avaliar a fala do deputado. “Não se pode fazer um paralelo histórico dessa forma para desqualificar o argumento de outra deputada. Esse tipo de ofensa é uma quebra de decoro sem razoabilidade”, disse.

Por fim, Bruno Engler reforçou suas declarações, dizendo que a defesa ao aborto pode ser comparado à prática nazista.

“O nazismo tinha dentre suas diversas práticas o conceito de eugenia, que impunha a morte a pessoas com deficiência. E a gente observa a mesma coisa entre os abortistas. Países onde o aborto é realizado você observa uma queda vertiginosa de nascimento de pessoas com síndrome de Down, que é uma síndrome que você consegue diagnosticar antes do nascimento”, afirmou.

“Milhares de crianças são mortas por causa disso em um genocídio silencioso, uma prática nazista”, finalizou.

Após a discussão e a fala de outros deputados, a PEC foi, enfim, retirada da pauta.

Graduado em jornalismo e pós graduado em Ciência Política. Foi produtor e chefe de redação na Alvorada FM, além de repórter, âncora e apresentador na Bandnews FM. Finalista dos prêmios de jornalismo CDL e Sebrae.