O Tribunal de Justiça (TJMG), Ministério Público (MPMG) e Tribunal de Justiça Militar (TJM) querem criar mais de 1.000 cargos sem concurso público em Minas Gerais. Entre os órgãos, há salários que começam em R$ 5 mil e outros que superam os R$ 26 mil.
Os órgãos alegam que precisam de mais servidores para atender o excesso de demandas. Em diferentes trechos das notas, eles chamam as contratações de “readequação de quadros”. O TJMG, por exemplo, diz que o “recrutamento amplo é mais eficiente e possibilita trazer pessoas de fora, quando necessário”.
Para os cargos sejam criados, os órgãos precisam de autorização dos deputados estaduais mineiros e projetos foram enviados à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) no fim do ano passado.
Questionado pela Itatiaia sobre o tema, o presidente do Legislativo estadual, deputado Tadeu Martins Leite (MDB), não quis confirmar se os projetos serão ou não votados ainda no primeiro semestre de 2024. Leite disse o colégio de líderes - grupo que reúne os líderes de partidos e blocos na ALMG - será responsável por apontar quando os projetos serão pautados no Legislativo estadual.
“Eles claro tem que ser tramitados na Casa e pautados no plenário desde que haja um acordo entre as lideranças da Casa. Então, não tenho dúvida, que no momento adequado, após passar pelas comissões, vamos fazer essa discussão junto ao colégio de líderes e havendo consensos serão pautados”, afirmou Tadeu Leite.
Questionado por nossa reportagem sobre prioridades para 2024, o emedebista não citou os projetos, preferindo destacar discussões sobre a dívida de R$ 160 bilhões de Minas com a União e problemas de seca enfrentados em regiões como o Norte de Minas. Apesar disso, Tadeu Martins disse que a decisão final é dos parlamentares que integram o colégio de líderes.
Cargos de livre nomeação
De acordo com as informações enviadas pelos próprios órgãos à Assembleia, o
No TJ, as vagas são para cargos de assessores de juízes e assistentes técnicos, escreventes e coordenadores de serviços, com salários que variam de R$ 5,5 mil a R$ 23,6 mil. Os 500 novos cargos vão custar aos públicos mineiros em R$ 156 milhões em 2024 e mais R$ 161 milhões em 2025. Além dos cargos sem concurso, o TJ quer criar ainda outros 104 postos de trabalho. Estes, segundo o texto enviado para a Assembleia, poderão ser ocupados por servidores efetivos.
O que diz o Tribunal de Justiça?
Procurado por nossa reportagem, o Tribunal de Justiça informou que enviou dois projetos - um de Lei Complementar e um de Lei Ordinária - à Assembleia. O Projeto de Lei Complementar é para criar vagas de juiz auxiliar de 2º grau. O órgão alega que há um represamento de processos que são distribuídos na segunda instância e que a criação dos cargos é para desafogar a área do Judiciário onde trabalham os desembargadores.
A reportagem questionou ao TJ porque o órgão não optou por realizar concurso público para preencher as 500 vagas. Para justificar, o Tribunal de Justiça disse que a maioria das vagas são para os cargos de assessores de juízes e alega que o cadastro de reserva, que poderia ser utilizado nesses casos, não existe mais, pois os servidores foram deslocados para atender as demandas de novas varas e criação de comarcas.
Segundo o órgão, por causa do grande número de processos, é comum que um único juiz não consiga dar conta do volume e é necessário instalar uma nova unidade judiciária em determinados locais. Para que isso seja feito, é preciso haver o cargo de gerente de secretaria, que é o antigo escrivão.
O TJ diz, ainda, que o órgão precisa de servidores concursados, que trabalhem na secretaria, e de assessores. Para preencher as vagas de assessor, o órgão diz que optou por esse recrutamento amplo para que o cargo possa ser assumido tanto pelo servidor de carreira como por pessoas que não sejam servidoras, mas sejam bacharéis em Direito e atendam aos pré-requisitos do cargo.
O motivo, na explicação do órgão, é que, muitas vezes, o servidor da Comarca ou não atende ao requisito de ser formado em Direito ou não tem interesse em ocupar a vaga. Ao defender o recrutamento amplo, o TJ diz que não pode “deixar a administração à mercê da disponibilidade de servidores com o perfil requerido”. O Tribunal de Justiça diz que o “recrutamento amplo” é mais eficiente e possibilita trazer pessoas de fora, quando necessário.
Os demais cargos previstos no projeto são da estrutura da organização do Tribunal. Há cargos para lotação na Presidência, na Corregedoria, na 1ª, 2ª e 3ª Vice-Presidências. Mais uma vez, o TJ diz que são áreas que precisam de mais funcionários. O tribunal ressalta que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) faz cobranças aos tribunais para avançar em questões administrativas e que isso, segundo o TJ, depende do aumento de pessoal.
“O CNJ, em que pese não forçar os Tribunais a criarem uma estrutura – por impossibilidade, inclusive, de impor um avanço orçamentário e financeiro -, recomenda se coloca como meta para o Tribunal conseguir, dentro de sua organização, avançar com a criação de cargos para esses setores”, diz o TJ em um trecho da nota.
Para defender o aumento de cargos, o TJ mineiro diz que o Supremo Tribunal Federal decidiu em que todos casos de ocupações, os conflitos coletivos existentes no Estado, sejam acompanhados por uma Comissão de Conflitos Fundiários, para que se tente uma mediação, antes da publicação de uma liminar, com a intenção de conseguir um reassentamento, à regularização fundiária ou à realocação dessas pessoas de forma organizada.
O tribunal diz que para que isso seja feito, o TJ precisa reforçar a equipe “porque o Estado é muito grande”. Conforme o órgão, o Estado tem 298 Comarcas e os servidores têm se “desdobrado e aumentado o custo com horas extras”.
O TJ encerra a nota dizendo que os projetos enviados à Assembleia vão permitir que o TJ cresça e mantenha a prestação jurisdicional.
CNJ nega exigência de contratação de servidores
Citado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) negou à Itatiaia que tenha feito qualquer tipo de exigência de contratação de servidores no quadro do TJ mineiro.
“Por força da atribuição do CNJ de exercer o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, o órgão desenvolve políticas para o aperfeiçoamento da prestação jurisdicional. Anualmente, o CNJ elabora em conjunto com os tribunais brasileiros as Metas Nacionais e Específicas de acordo com a Estratégia Nacional do Poder Judiciário definida para o quinquênio - o período atual é de 2021-2026. Essa metas não incluem exigências referentes à estrutura de recursos humanos, uma vez que cabe a cada tribunal dimensionar essas estruturas, tanto para atingimento das metas, quanto para execução das políticas judiciárias vigentes”.
Barroso determinou que tribunais criem comissões para mediar desocupações coletivas antes de decisão judicial. TJ diz que precisa de mais servidores para criar as comissões.
Citado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais e também procurado pela Itatiaia, o Supremo Tribunal Federal confirmou que o ministro Luís Roberto Barroso determinou que os tribunais que tratam de casos de reintegração de posse criassem comissões para mediar eventuais despejos antes de qualquer decisão judicial. Conforme o ministro, a medida de transição visa a reduzir os impactos habitacionais e humanitários em casos de desocupação coletiva.
A decisão foi tomada em 2021. Na oportunidade, Barroso suspendeu inicialmente por seis meses as ordens de remoção e despejos de áreas coletivas habitadas antes da pandemia. Segundo o ministro, despejos em meio à crise da Covid-19 poderiam prejudicar famílias vulneráveis.
No entanto, no texto da decisão de Barroso enviado pelo STF à Itatiaia, não há nenhum trecho que determina objetivamente que os tribunais brasileiros, entre eles o TJ mineiro, precisam criar uma comissão de mediação de conflito em cada uma das comarcas. Segundo o TJ, Minas tem 298 Comarcas.
O que diz o Ministério Público?
Para justificar a criação dos cargos, o Ministério Público de Minas afirma que precisa adequar o número de cargos de analistas e de assessores do MP às demandas do órgão. Segundo o TJ, atualmente o quadro de servidores é “insuficiente” para atender as “demandas ministeriais e a sociedade”.
Dos 480 cargos de livre nomeação, as vagas são para 450 cargos de Assessor Jurídico e outros 30 para a função de assessor administrativo, cargos que têm quatro níveis diferentes.
Além dos cargos de livre nomeação, o MP quer criar ainda 250 cargos de analistas. Estes, segundo o MP, serão ocupados por meio da realização de concurso público. Com isso, o quadro de analistas do MP saltará de 1325 cargos (quadro atual) para 1575.
O MP diz que a criação dos cargos respeita “os limites fixados na Lei de Responsabilidade Fiscal, com provimento paulatino dos cargos, observada a existência prévia de disponibilidade orçamentária e financeira”.
O que diz Tribunal de Justiça Militar de Minas Gerais?
“Esclarecemos que, no âmbito do Tribunal de Justiça Militar do Estado de Minas Gerais – TJMMG, foi solicitada a criação de apenas 17 cargos, dos quais 16 serão ocupados obrigatoriamente por servidores de carreira concursados da Justiça Militar de Minas Gerais. Somente um dos cargos será de recrutamento amplo e que, em caso de aprovação da referida lei, não será obrigatoriamente ocupado por um servidor público concursado. O impacto financeiro anual da criação deste único cargo que pode ou não ser ocupado por servidor público é de R$ 347.231,70, já considerando o 13º salário e férias. Este valor consta do Projetos de Lei (PLs) 1.497/23, que trata a Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2024, já aprovado pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), aguardando apenas a sanção do governador”, diz a íntegra da nota do TJM.