Ministro do Meio Ambiente do governo Jair Bolsonaro (PL) e quarto parlamentar mais votado em São Paulo na eleição passada, Ricardo Salles (PL-SP) protagonizou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que se propôs a investigar ações do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Autor do relatório que deverá ser colocado para votação na sessão derradeira marcada para a manhã de quinta-feira (21), ele pedirá os indiciamentos de quatro pessoas por invasões praticadas pelo grupo nos últimos meses.
Entre os alvos do documento estão José Rainha, antigo líder do MST e hoje integrante da Frente Nacional de Luta no Campo e Cidade (FNL), e o general Gonçalves Dias, ministro palaciano do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) até 19 de abril. O relatório que, se aprovado, será enviado ao Ministério Público Federal (MPF) também indica a necessidade dos indiciamentos de Jaime Messias Silva, diretor-superintendente do Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas (Iteral), e do deputado federal Valmir Assunção (PT-BA).
A leitura do relatório de Ricardo Salles não deverá ocorrer sem as discussões entre a ala governista e a oposição, corriqueiras nas sessões desde o início da CPI em 18 de maio. A principal adversária do relator e coprotagonista da comissão é a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP), reeleita no último pleito, e a guerra das narrativas sustentadas pelos dois parlamentares pautou o andamento da comissão. Na versão prévia do relatório, que circulava no Congresso Nacional na segunda-feira (18), Salles classificava os movimentos ligados à reforma agrária e a invasões de territórios como “facções sem-terra” e “organizações criminosas” e disparava que a ala governista atuava na “romantização e banalização dos crimes cometidos”.
Para contrapô-lo, Bomfim e outros parlamentares atrelados ao governo Lula elaboraram um relatório paralelo. O documento não será, segundo a deputada, enviado ao Ministério Público ou colocado para votação na CPI. “O objetivo é construir um documento histórico para contar outra versão sobre o que foi a CPI. Ele será protocolado para a sociedade brasileira saber que os fatos narrados pelo relator são a versão dele, mas não são a realidade sobre os movimentos sociais”, afirmou.
Questionado sobre o documento paralelo que será apresentado por Sâmia Bomfim, Ricardo Salles menosprezou a ação do corpo parlamentar ligado ao governo petista. “Tem a consistência de uma história de gibi do Cebolinha. Vazio, fraco e inconsistente”, classificou o relator citando o personagem dos quadrinhos da Turma da Mônica. "É simplesmente uma peça retórica ideológica contra o trabalho da CPI que defende invasões de terra, facções criminosas e bandidos. Não existe legalidade no documento ou consistência”, acrescentou. "É como brincamos no Direito, é o jus esperneandi. O direito de espernear. Ela está esperneando”, concluiu.
Para Sâmia, o relatório de Ricardo Salles que será entregue ao presidente da CPI, Delegado Zucco (Republicanos-RS), pode não ser aprovado. Nos últimos quatro meses, a oposição compôs a maioria na comissão; cenário que se inverteu no mês passado após uma manobra do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), para blindar o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), prestes a ser convocado. Dias depois, novas movimentações levaram a empates técnicos em reunião para aprovação de requerimentos e, diante do cenário conturbado, Zucco optou por cancelar todas as sessões até a apresentação final do relatório. A deputada do Psol acredita que a base conseguirá derrubar o relatório e crava que o documento não terá validade para o MPF. “Estamos tranquilos. Primeiro porque estamos construindo uma articulação para o relatório não ser aprovado. Segundo, se houver manobra pela aprovação, estamos tranquilos sobre o papel dos órgãos investigativos”, avaliou, desclassificando a possibilidade do documento levar ao real indiciamento de qualquer um dos quatro alvos.
À contramão, Salles afirma que os indícios coletados pela Comissão Parlamentar de Inquérito são suficientes para sustentar a investigação do Ministério Público Federal. O relator citou ainda que se houvesse prorrogação da CPI, ele conseguiria provar os crimes que atribui ao MST. “Se tivéssemos mais 30 dias, conseguiria comprovar vários dos indícios que temos hoje. Infelizmente, os indícios vão continuar sendo indícios. Mas, nada impede que o Ministério Público aprofunde as investigações”, concluiu.