“Você precisa de pessoas como eu, para que você possa apontar seus dedos e dizer: ‘Esse é o cara mau’”, dizia Tony Montana, o mafioso vivido por Al Pacino, no clássico de Brian de Palma Scarface. Em Atibaia (SP), na sala do sítio em que Frederick Wassef escondia o ex-policial militar Fabrício Queiroz, uma prateleira exibia miniaturas do personagem. Se a vida fosse um filme, o estilo, o penteado e as roupas de Wassef bem que poderiam vestir um dos malfeitores dos tempos da Lei Seca, perseguidos por Eliot Ness.
Na vida real, porém, o advogado está mais para um personagem saído das sombras, desses que, de vez em quando, aparecem em Brasília e fazem fama ligando seus nomes a de poderosos de plantão e desaparecem junto com eles. No caso de Wassef, para todos os efeitos, ele era “o advogado do presidente Bolsonaro”.
Nos últimos anos, conforme o freguês, Wassef montou seu perfil. Rico e bem-sucedido para uns, devedor contumaz para outros. Como explicar que o mesmo cidadão
O Estadão conversou com políticos, empresários, militares e advogados que conviveram com Wassef nos últimos anos. Em comum, a maioria passou a dizer que já não tem mais tanto contato com o advogado, que,
Gravações e arma
São tantas histórias mal contadas sobre Wassef que, no fim, pouco se sabe do homem que, segundo seus interlocutores, grava todas as conversas que mantém e anda armado. Até seus casamentos e separações são controversos, aconteceram em clima de disputas judiciais. Wassef, há alguns anos, enfrentou um câncer que deixou uma sequela física.
No ano passado, quando concorreu a uma vaga de deputado federal e perdeu, Wassef declarou um patrimônio de R$ 18 milhões ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), incluindo um apartamento em Miami avaliado em R$ 4,96 milhões. Entre 2013 e 2021, as taxas do imóvel foram pagas, majoritariamente, pela empresária Maria Cristina Boner, ex-mulher de Wassef. O boleto de 2022, no valor de US$ 12.847,59 (ou R$ 62.621,72), está em aberto.
Durante a campanha, Wassef publicou mensagens de apoio do então candidato ao governo paulista, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). O filho mais velho de Bolsonaro gravou dois vídeos. Em um deles se referiu ao advogado como “meu amigo”. Em outro, afirmou: “Frederick Wassef é o nosso advogado e, como advogado, demonstrou sua competência e lealdade”. O Estadão não localizou vídeo de Bolsonaro pedindo voto para ele e os santinhos que mostram os dois lado a lado são montagens de fotografias.
O jingle escolhido por Wassef tinha uma mensagem clara sobre a atuação com a família Bolsonaro que o advogado queria passar aos eleitores. “Todo mundo já sabe, o Wassef resolve, resolve”, dizia a música. O “advogado de Bolsonaro”, como ele se identificou na campanha, recebeu 3.628 votos.
Em julho, cerca de um ano depois de informar seu patrimônio à Justiça Eleitoral, Wassef fez um gesto inusitado: voltou a procurar a Corte sob alegação de que estava “buscando a plena transparência”. Assim, apresentou lista com três novos bens que disse ter adquirido. Uma casa em Brasília, um jet ski e um carro usado.
Em São Paulo, Wassef disse ter um veículo Silverado de 1995, estimado em R$ 24 mil, e uma Ranger de R$ 112 mil. Em Brasília, circula em um Jetta que comprou de segunda mão, cujo valor declarado ao TSE foi R$ 125 mil. Ele deve R$ 6,7 mil do IPVA do veículo referente a 2022 e 2023.
Obra parada
Um dos bens mais valiosos do patrimônio de Wassef se tornou um canteiro de obras parado. O Estadão esteve no local. A casa no Setor de Mansões Dom Bosco foi comprada em março do ano passado por R$ 3,7 milhões, segundo o registro, pagos via transferência bancária.
“A obra está parada há bastante tempo e depende de ele voltar ou não”, afirmou o empresário Almir Pereira Filho, ligado à empresa responsável pela obra. Essa casa também está com o IPTU atrasado. Três parcelas no valor de R$ 3.155,89 já venceram e há outras três para serem pagas nos próximos meses. Por enquanto, os impostos podem ser pagos em boletos. Outras dívidas de Wassef contudo, já chegaram ao Judiciário. O advogado foi acionado em dois processos que correm no Tribunal de Justiça de São Paulo.
Em um deles, um condomínio em Tuiuti (SP) cobra R$ 46 mil de Wassef. No outro, a prefeitura de Atibaia cobra R$ 3.516,35 em dívidas de IPTU de uma casa que fica próxima a outro imóvel do advogado. Neste segundo - onde ele mantém os bonequinhos de Tony Montana - Wassef deu guarida a Queiroz.
Herança
Neto de imigrantes libaneses, Wassef deve aos pais e avós parte dos bens adquiridos ao longo da vida. O advogado declarou ao TSE em 2022, 12 imóveis registrados em São Paulo e no Distrito Federal e um em Miami. Os imóveis representam 55% dos R$ 18 milhões declarados por Wassef ao tribunal. O imóvel mais recente comprado pelo advogado foi o apartamento em que mora, de 189 metros quadrados, no Morumbi, por R$ 1.610.200, em agosto.
Defesa
Por meio de nota enviada pela assessoria do senador Flávio Bolsonaro, Frederick Wassef se disse vítima de “inverdades, maldades e covardias”. Segundo ele, a obra na casa em Brasília está parada por razão técnica, não financeira. “Ninguém da minha relação fala com jornalistas e menos ainda sobre minha pessoa.”