O deputado federal Nikolas Ferreira (PL) foi condenado nesta quarta-feira (19) a pagar R$ 80 mil à também deputada federal Duda Salabert (PDT) por danos morais devido à declarações transfóbicas sobre ela quando ambos eram vereadores de Belo Horizonte.
O juiz José Ricardo dos Santos de Freitas Véras considerou que o deputado federal não respeitou a identidade de gênero de Duda em entrevistas ao jornal Estado de Minas em 2020. “Restou comprovado que o requerido, em duas entrevistas para o Jornal Estado de Minas, um dos maiores veículos de comunicação do estado, se negou a reconhecer a autora como mulher. Realizou, ainda, comentários jocosos e irônicos em suas redes sociais a respeito da identidade de gênero da requerente, os quais tiveram grande repercussão, com mais de 8 mil ‘likes’ no Twitter e 57 mil no Instagram”, escreveu o magistrado.
"É inegável que a recusa em se dirigir à autora (Duda) como mulher lhe causou constrangimento, abalando sua honra, imagem e dignidade, aspectos integrantes da integridade psicofísica”, acrescentou ele.
Nikolas Ferreira foi procurado pela reportagem, mas ainda não se posicionou. Nas redes sociais, Duda Salabert disse que se o deputado não aprendeu na família e na escola, “aprenderá na justiça a respeitar as travestis”.
Entenda o caso
Em entrevista ao jornal Estado de Minas após as eleições municipais de 2020, Nikolas Ferreira disse que iria chamar Duda Salabert pelo pronome masculino “ele”. “Ele é homem. É isso que está na certidão dele, independentemente do que ele acha que é”", afirmou na ocasião.
Após a publicação da notícia, Nikolas compartilhou o texto nas redes sociais e escreveu: “Absurdo!! Chamei um homem de homem! O choro começou”. Após a repercussão, o então vereador ainda concedeu uma segunda entrevista ao jornal e, questionado se temia ser processo pela declaração anterior, respondeu que "é biologia”.
“Eu não estou falando algo que eu acho. Ele é um homem. E é importante deixar claro que não existe nenhuma criminalização com relação à biologia. Simplesmente estou falando aquilo que a ciência diz. Por favor, me aponte onde eu tive uma atitude homofóbica e onde há jurisprudência ou qualquer ordenamento jurídico que diz que fui transfóbico. Chamar um homem de homem não é transfobia, é dizer aquilo que ele é à luz da ciência. Mudem a ciência”, afirmou Nikolas Ferreira.
Sexo biológico x gênero
Na decisão, o magistrado usou um precedente do Supremo Tribunal Federal (STF) que define o sexo como um termo biológico, ou seja, que serve para identificar homens, mulheres e intersexuais (pessoas com características sexuais ambíguas).
Já o gênero é algo psicológico e cultural, disse o magistrado. “Identidade de gênero, por sua vez, está relacionado ao gênero com que a pessoa se reconhece, que pode ou não corresponder à identidade esperada a partir da atribuição do sexo no nascimento. Diz respeito a uma percepção interna. Desse modo, pode haver correspondência com a designação sexual atribuída no nascimento (cisgeneridade), ou dissonância entre o sexo biológico e a identidade de gênero (transexualidade)”, escreveu José Ricardo dos Santos de Freitas Véras.
“Assim, se as pessoas transgênero têm direito de se apresentar à sociedade da forma como se enxergam, logo, também têm direito de ser tratadas e respeitadas por terceiros de acordo com sua identidade de gênero”, concluiu o juiz.