Uma briga entre os deputados Célia Xakriabá (PSOL) e Kim Kataguiri (União), na madrugada desta quinta-feira (17), escancarou o clima de tensão na Câmara dos Deputados durante a
O episódio teve início quando Kim subiu à tribuna e insinuou que parlamentares contrários ao projeto estariam motivados por interesses financeiros. “Agora eu quero falar aqui para esse Plenário qual é a verdadeira razão de ter tanta oposição para o direito do licenciamento ambiental: é dinheiro, é grana, é esquema”, afirmou o deputado.
‘Deputado reborn’ e ‘Cosplay’
Em resposta, Célia Xakriabá, que é indígena, rebateu as falas, chamando o parlamentar de ‘estrangeiro’. “Primeiro esse deputado estrangeiro, esse deputado reborn que acabou de falar e quer ter o direito de falar da questão indígena. O senhor não sabe da história, portanto o senhor fica quieto, o senhor é estrangeiro aqui, tinha de pedir perdão para os povos indígenas”, disse, antes de ter o microfone cortado por falta de tempo.
Kataguiri reagiu com ironia, fazendo referência ao cocar usado por Célia. “Determinada deputada me chamou de ‘deputado estrangeiro’. E, ali, próximo de onde estão meus ancestrais, tem o pavão, um animal lá da Ásia. Não tem nada a ver com tribo indígena aqui no Brasil, mas tem gente que parece que gosta de fazer cosplay”, disse, em tom de deboche.
A fala foi apoiada por outros parlamentares da base governista, como Rodolfo Nogueira (PL), que chamou a deputada de “pavão misterioso” e questionou, de forma irônica, se o uso de cocar indígena deveria passar por licenciamento ambiental.
O que disseram os deputados?
Nas redes sociais, Célia Xakriabá denunciou os ataques como racistas. “Durante a votação do PL da Devastação, fui atacada de forma racista por parlamentares que zombaram do meu cocar, tentando me deslegitimar enquanto parlamentar e mulher indígena”, escreveu. “O cocar que carrego não é adereço. É um elemento sagrado, carregado de história, ancestralidade, espiritualidade e resistência”, disse.
Ela também criticou a omissão da presidência da Casa durante o embate. “Durante os ataques, o presidente da Casa se manteve em silêncio. Não aceitarei isso calada. Chega de racismo, intolerância e violência”, disse a parlamentar, que prometeu tomar medidas legais contra Kataguiri.
O deputado, por sua vez, se defendeu alegando que foi provocado primeiro. “A deputada Célia Xakriabá se exaltou, me chamou de ‘deputado estrangeiro’ e ‘deputado reborn’”, escreveu em suas redes. “Respondi que estrangeiro não sou eu — estrangeiro é a ave pavão, e tem gente que faz cosplay desse animal”, afirmou, novamente em referência ao cocar de Célia.
Kataguiri também afirmou que a deputada tentou agredi-lo fisicamente. “Ela perdeu o controle, avançou contra mim e foi contida por colegas da esquerda e pela Polícia Legislativa”, afirmou. “Depois ainda se fez de vítima, dizendo que iria me processar por preconceito, mesmo tendo iniciado os ataques me chamando de estrangeiro.”
Ao pedir direito de resposta, Célia reforçou a gravidade das ofensas. “As pessoas podem ter bancadas inteiras para defender seu interesse, mas atacar uma mulher indígena pelo que se veste, eu não tenho problema de saber de onde eu venho, eu não preciso chamar de cosplay, porque isso é um racismo televisionado daqui”, afirmou, sendo novamente interrompida manifestações da oposição e tendo o microfone cortado pelo presidente em exercício, Hugo Motta (Republicanos).
Projeto aprovado
A sessão terminou com a aprovação do projeto de lei que altera as regras para o licenciamento ambiental no país, com 267 votos favoráveis e 116 contrários.
“Eu sou deputada federal eleita pelo povo de Minas Gerais e não vou ser silenciada em um espaço que fui escolhida para estar. Eu posso ser uma, mas não sou só. Seguiremos de pé. Nossa luta é pela vida, pelo território, pelo planeta e pela dignidade de existir”, concluiu Célia.