O assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, fez um alerta nesta sexta-feira (24) sobre as recentes movimentações dos Estados Unidos na região do Caribe. Em entrevista à agência AFP, o ex-chanceler afirmou que uma eventual tentativa americana de depor o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, “pode incendiar a América do Sul”, e garantiu que o Brasil não aceitará nenhum tipo de intervenção externa.
Amorim, que comandou o Itamaraty durante os dois primeiros mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003–2010), classificou como “muito perigosa” a ofensiva norte-americana contra embarcações supostamente ligadas ao narcotráfico próximas ao litoral venezuelano. Segundo ele, não há provas concretas de que os alvos dos ataques tenham relação com o tráfico de drogas.
“O Brasil claramente se preocupa com o uso da força ou com métodos clandestinos, tipo CIA, para derrubar governos da região. Não queremos uma convulsão na nossa região. Isso pode ter consequências muito graves, não só para a Venezuela, mas para todo o continente”, afirmou Amorim à AFP.
Possível encontro entre Lula e Trump
O tema, segundo o assessor, pode estar na pauta da possível reunião entre Lula e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump,
As relações entre os dois países atravessam um momento de tensão crescente, especialmente após o governo americano impor sanções ao Brasil em resposta à condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro, sentenciado a 27 anos de prisão por liderar uma tentativa de golpe de Estado.
“Depende do clima da conversa. O presidente Lula não vai dar lições a Trump, e espero que o contrário também não ocorra. Mas é preciso haver diálogo e bom senso para buscar pontos de encontro”, disse Amorim.
“Não podemos aceitar uma intervenção externa”
Questionado sobre a posição do Brasil diante de uma eventual ação americana para remover Maduro do poder, Amorim foi enfático: “Somos contra uma intervenção externa. Esse problema é dos venezuelanos. Intervenção armada ou de inteligência não é o caminho. Isso pode gerar ressentimentos imensos e criar problemas concretos, como fluxos de refugiados. Pode incendiar a América do Sul e radicalizar a política em todo o continente.”
Relações comerciais e sanções
Amorim também abordou o diálogo econômico entre Brasil e Estados Unidos, que tenta ser retomado após meses de atrito diplomático e tarifas impostas a produtos brasileiros. Segundo ele, foi criada uma força-tarefa bilateral para discutir temas comerciais, incluindo setores como carne, café, máquinas e motores, além de minerais críticos e terras raras.
“Acho que o importante é ter começado um diálogo, sem precondições. Não houve condicionamento político, jurídico ou ideológico nas negociações. Isso já é um começo novo”, avaliou o assessor presidencial. Amorim ressaltou que o Brasil está aberto a investimentos, desde que haja beneficiamento e ganhos concretos para o país: “Na questão dos minerais críticos, o importante é sermos capazes de definir nossas necessidades. Estamos abertos a investimentos, desde que também haja retorno para o Brasil.”
Questionado sobre o possível fim do apoio de Trump ao bolsonarismo no Brasil, Amorim afirmou que o tema não foi mencionado na conversa telefônica entre Lula e o republicano, ocorrida em 6 de outubro.
“A palavra Bolsonaro não foi pronunciada. Como em todo governo, há pessoas mais pragmáticas e outras mais ideológicas. Nesse caso, parece que os pragmáticos falaram mais alto”, afirmou.