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Governo Zema vai enviar indicados para sabatinas na ALMG; especialistas apontam problemas

Presidentes dos órgãos da administração indireta precisam ser aprovados pelos deputados estaduais, mas governo não tem cumprido exigência

Deputado João Magalhães

Líder do governo Zema, o deputado estadual João Magalhães (MDB) disse que o governador vai enviar ao longo desta semana as indicações dos presidentes das fundações e autarquias do estado para serem sabatinados pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Como mostrou a Itatiaia, a Constituição Estadual determina que os indicados sejam aprovados pela ALMG, mas o governo Zema não tem submetido os nomes à avaliação dos deputados estaduais. “O entendimento do governo é que eles [os presidentes] estavam como designados, não como nomeados [nos cargos]. Então, o governo não entende como descumprimento [da Constituição]”, disse Magalhães.

Requerimento apresentado por deputados da oposição pede que o Tribunal de Contas do Estado (TCE), o Ministério Público de Contas e o Ministério Público avaliem se o governador cometeu crime de responsabilidade ao não cumprir a Constituição.

A exigência da sabatina vale para órgãos da administração pública indireta, como a Fundação Ezequiel Dias (Funed), a Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário (Arsae-MG), a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), o Instituto Estadual de Florestas (IEF) e a Loteria Mineira, dentre outros.

A única indicação aprovada pela ALMG foi a de Antonio Claret Jr. para a presidência da Arsae em 2020. Zema também enviou aos deputados indicações para o Conselho Estadual de Educação, mas as sabatinas não ocorreram. “Eu participei de uma Comissão Especial para a composição do conselho na Legislatura passada, mas a arguição não foi finalizada porque o governo tirava quórum das reuniões”, disse a presidente da Comissão de Educação, Beatriz Cerqueira (PT).

O movimento ganhou força após a oposição ter ficado insatisfeita com o modo em que uma audiência pública para debater a situação da Funed foi realizada. A reunião ocorreu em um dos menores auditórios da ALMG e os servidores da instituição que estiveram presentes tiveram que acompanhar a audiência em outra sala por meio de uma televisão. Os parlamentares oposicionistas abandonaram a reunião em protesto.

Irregularidades

Florivaldo de Araújo, professor de direito administrativo da UFMG, avalia que a Constituição Estadual é clara ao exigir a sabatina prévia dos indicados para cargos de presidência em fundações e autarquias. “Quando um agente público exerce a função sem ter passado por todas as formalidades exigidas legalmente, ele está exercendo irregularmente essa função”, diz ele.

Sobre a justificativa apresentada pelo líder de Governo, de que os presidentes foram designados e não nomeados e que, portanto, não haveria irregularidade, o professor disse que desconhece “norma legal que permita isso”.

“Claro que se esse caso vier a ser discutido judicialmente, o Judiciário pode eventualmente aceitar essa tese. Eu, pessoalmente, não acho cabível”, afirmou Florivaldo Araújo.

Ainda de acordo com o professor, como a ALMG é uma instituição política, as indicações podem ser aprovadas de forma retroativa e o Judiciário eventualmente aceitá-las se tiver que decidir sobre o caso.

Na avaliação dele, mesmo sem as sabatinas, os atos dos presidentes “dificilmente” seriam anulados. “Isso prejudicaria a própria sociedade e os cidadãos em geral. Essas pessoas estão assinando contratos, designação de outros servidores. Não teria como pessoas de fora da esfera governamental saberem que eles não cumpriram as formalidades exigidas”, concluiu Florivaldo.

Mestre em Direito Público, a advogada Natália Torquete Moura afirma que a designação dos presidentes das fundações e autarquias é um “ato jurídico precário” e não recomendável que “deveria ser utilizado apenas em casos excepcionais e que não se estendam por muito tempo”. “O uso do argumento de que os agentes foram apenas designados é uma forma de tentar burlar a regra do art. 62 da Constituição Estadual [que exige as sabatinas]”, afirma ela.

“Quanto à caracterização do crime de responsabilidade, depende da abertura de um processo e de apuração que é feito pela própria Assembleia Legislativa, nos termos previstos na Constituição Estadual”, diz Natália. Para o processo ser aberto, seriam necessários os votos de 51 parlamentares. Atualmente, a base do governo Zema é composta por mais de 50 dos 77 deputados estaduais.

A advogada Maria Fernanda Pereira entende que mesmo que as nomeações sejam avaliadas como irregulares, os servidores não teriam que devolver os salários recebidos enquanto estavam nos cargos. “Devolver salário seria locupletamento ilícito do estado às custas desses particulares que efetivamente cumpriram suas funções e trabalharam”, disse a professora de Direito Administrativo na PUC Minas.