Ouvindo...

Julgamento de Bolsonaro: uma jurisprudência necessária

Ao tornar o ex-presidente inelegível, o TSE restabeleceu parâmetros e limites para o exercício do poder

Ao longo dos quatro anos do Governo Bolsonaro, a única ação do ex-presidente ligada a política internacional não guiada pelo viés ideológico foi a fatídica reunião com embaixadores no Palácio do Planalto para apresentar, segundo o Presidente, as mazelas, as inconsistências e as fragilidades do nosso sistema eleitoral, especialmente no que se refere ao uso da urna eletrônica.

Usando a máquina pública para a convocação, realização e divulgação da reunião e com a promessa da entrega de provas de suas ilações, o Presidente cometeu três crimes tipificados como crimes eleitorais: abuso de poder político, abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação.

Em uma análise fria dos fatos, parando apenas na data na qual ocorreu a reunião, a punição do responsável pelo ato antidemocrático tornou-se quase inevitável. E, mais do que isso, quando se analisa tudo o que aconteceu depois, com milhares de pessoas nas portas dos quartéis ou ocupando a Capital Federal no dia 08 de janeiro, pode se perceber os efeitos das argumentações proferidas pelo ex-Presidente Jair Bolsonaro em parte do eleitorado, fazendo-se necessário criar uma jurisprudência para futuros governantes.

Nunca em nossa história um governante questionou tanto as regras de transformação de votos em cadeiras, nosso sistema eleitoral, como o fez Jair Bolsonaro. O ex-Deputado e, também, ex-Presidente comemorou várias eleições suas e de seus familiares, usando o mesmo sistema de apuração execrado na reunião com os embaixadores em Brasília.

Os crimes ali cometidos poderiam também ser de responsabilidade, o que deveria levar à perda de mandato, mas o que se apura é sobre as consequências que o ato pode ter gerado no que se refere as eleições, levando à perda dos direitos políticos.

A Justiça Eleitoral tirou da vida pública eletiva, por 8 anos, o ex-Presidente Jair Bolsonaro, retirou da cena eleitoral um pré-candidato líder de uma corrente que tem milhões de defensores e que tem se revelado uma força contundente no Brasil.

A saída de Bolsonaro não deixa essa corrente sem representantes. Certamente, novos nomes chegarão defendendo menos estado, mais família e mais religião no Brasil de hoje. Nomes que podem inclusive ter mais sucesso do que era esperado de Jair Bolsonaro pois, além de suas concepções equivocadas sobre nossa democracia e o sistema eleitoral, tem outras posturas que tanto prejudicaram seu governo e a população brasileira.

A aplicação da pena a Bolsonaro é um recado necessário aos futuros governantes, mas não irá calar a voz daqueles que defendem os mesmos ideais de estado do ex-Presidente. Ainda bem. É assim que se faz uma democracia. Com a palavra o eleitor, respondendo ao sistema eleitoral, determinando os rumos do país.

Doutor em Ciência Política, professor da PUC Minas, diretor do Instituto Ver Pesquisa e Estratégia e comentarista político da Rádio Itatiaia. Marido, pai de família, atleta amador e apaixonado por lugares, pessoas e aventuras.
Leia mais