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Gonet assume PGR em cerimônia com Aras e ministros do STF, e é cobrado por Lula

Presidente discursou na Procuradoria-Geral da República nesta segunda (18) e pediu a Gonet que ‘não faça o MP se diminuir’

O novo procurador-geral da República, Paulo Gonet, durante sua solenidade de posse

Sabatinado e aprovado pelo Senado Federal há cinco dias, o indicado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Paulo Gonet Branco, assumiu a Procuradoria-Geral da República (PGR) em cerimônia repleta de autoridades dos três poderes, em Brasília, nesta segunda-feira (18). Na primeira fileira, de frente para o palco do auditório Juscelino Kubitschek, no prédio do órgão, se sentou o quarteto de procuradores que antecedeu Gonet: Augusto Aras, cujo mandato se encerrou em setembro, Raquel Dodge, Rodrigo Janot e Roberto Gurgel.

Em rápida declaração à plateia, ocupada por, pelo menos, três senadores, quatro ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e três ministros do governo Lula (PT), Gonet defendeu uma atuação discreta à frente da PGR. “Não buscamos palco, nem holofotes. Havemos de ser fiéis ao que nos delega o constituinte, inabaláveis diante a ataques dos interesses e ter a audácia de sermos bons, justos e corretos”, afirmou.

O discurso esteve alinhado à declaração do presidente Lula, que cobrou, em seguida, uma atuação responsável da Procuradoria-Geral da República. Citando os ataques aos Três Poderes no 8 de janeiro, o petista pediu a Gonet que faça o ‘jogo de verdade’ e disse, enfático, que nunca pedirá favores pessoais ao Ministério Público. “Se a gente quiser evitar aventuras neste país como aconteceu no 8 de janeiro e consagrar o processo democrático, o Ministério Público precisa jogar o jogo de verdade. Você é uma pessoa que cheguei à conclusão de que poderia depositar a confiança do povo brasileiro. Nunca lhe pedirei um favor pessoal, mas, não faça o Ministério Público se diminuir diante da expectativa de milhões de brasileiros. Seja o mais sincero, honesto e justo possível”, afirmou.

Em fala repleta de indiretas dirigidas ao Ministério Público Federal (MPF) e à atuação dos procuradores no âmbito da operação Lava-Jato que decorreu em sua prisão por 580 dias, Lula pediu que a verdade prevaleça sobre os interesses. “As acusações levianas não fortalecem a democracia. Muitas vezes, se destrói uma pessoa antes de dar chances a ela para se defender”, disse. “Nenhum procurador tem o direito de brincar com o Ministério Público. Ele é uma instituição tão relevante que um procurador não pode se submeter a um presidente da República, a um presidente da Câmara dos Deputados, a um presidente do Senado, à manchete de nenhum jornal, de nenhum canal de televisão”, afirmou.

Cerimônia prestigiada. O ministro do Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, representou o presidente da Corte, Luis Roberto Barroso, que não compareceu à posse. Fachin não foi o único ministro do Supremo, também foram à cerimônia Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Dias Toffoli e o decano Gilmar Mendes. Pelo alto escalão da Esplanada dos Ministérios, estiveram o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o ainda ministro da Justiça, Flávio Dino, e o chefe da secretaria-geral da Presidência, Márcio Macêdo. Os senadores Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP), Jaques Wagner (PT-BA) e Marcos do Val (Podemos-ES) e os deputados Bia Kicis (PL-DF) e Antônio Brito (PSD-BA) igualmente participaram da posse.

Outras figuras também se destacaram, entre elas o ex-ministro Ricardo Lewandowski, cotado para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública com a iminente saída de Flávio Dino, que assumirá cadeira no STF em fevereiro. Além dos comandantes das Forças Armadas, almirante Marcos Olsen e o general Tomás Paiva, e o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB).

Quem é Paulo Gonet?
De posições conservadoras, ele chega ao comando da PGR com apoio de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Por trás do nome dele estão os ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. A dupla defendeu a indicação do, até então, vice-procurador eleitoral.

A relação de Gonet com Gilmar é longa. Juntos, e em parceria com o ex-procurador-geral da República, Inocêncio Mártires Coelho, eles fundaram o Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), instituição educacional particular com sedes em Brasília e São Paulo, em 1998. Gonet foi sócio do IDP até 2017.

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Um dos filhos do indicado à PGR chegou a trabalhar no gabinete de Gilmar, no Supremo. Pedro Henrique de Moura Gonet Branco foi nomeado assessor do ministro, com salário de R$ 14,7 mil, em novembro de 2022. Ele pediu exoneração em junho deste ano.

Carioca de 62 anos, Gonet é doutor em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (UnB) e mestre em Direitos Humanos pela University of Essex, no Reino Unido. Ele faz parte do Ministério Público desde 1987.

Perfil conservador
Católico praticante, Gonet publicou artigo contrário ao aborto, em 2009, fazendo duras críticas à interrupção de gravidez em meio à discussão sobre a possibilidade do uso de embriões para pesquisas científicas.

Em 2019, o indicado por Lula chegou a ser avaliado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro para assumir a PGR. Deputada da base do governo anterior, Bia Kicis (PSL/DF) o levou ao Palácio do Planalto. Na ocasião, a parlamentar classificou Gonet como “conservador raiz” e chegou a dizer que Gonet havia prometido a Bolsonaro que jamais atuaria com o intuito de prejudicar o governo. Além disso, ele teria manifestado sua contrariedade à criminalização da homofobia pelo STF. No fim das contas, Bolsonaro indicou Augusto Aras.

Passados quatro anos, em junho de 2023, Gonet defendeu no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a inelegibilidade de Bolsonaro por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação nas eleições de 2022. Segundo o vice-procurador eleitoral, houve desvio de finalidade porque o ex-presidente usou TV pública com “fins eleitoreiros” na reunião com embaixadores em que o então presidente atacou o sistema eleitoral. Bolsonaro foi condenado à inelegibilidade.

“O discurso se dirigiu ao conjunto dos eleitores brasileiros e não apenas a representantes diplomáticos que não possuem capacidade eleitoral ativa. O presidente pode reunir o corpo diplomático em Brasília para relatar fatos de repercussão e há margem de discricionariedade política ampla para o presidente decidir o que é assunto relevante e inquietante para ensejar preocupação das potências estrangeiras”, disse Gonet.

O que Gonet deve fazer à frente da PGR?
O procurador-geral da República é o chefe do Ministério Público Federal. Ele deve propor ações judiciais em tribunais superiores — além do STF, no Superior Tribunal de Justiça (STJ). No Supremo, o PGR propõe ações diretas de inconstitucionalidade, representação para intervenção federal nos estados e no Distrito Federal, além de ações penais públicas e cíveis. Já no STJ, apresenta representações para a federalização de casos de crimes contra os direitos humanos e ações penais. O titular do cargo também atua como procurador-geral Eleitoral.

Também são atribuições do procurador-geral da República, segundo o Decreto-Lei 9.608/1946:

  • velar no que couber pela execução da Constituição, leis, regulamentos e tratados federais;
  • exercer a ação pública e promovê-la até o final em todas as causas de competência do Supremo Tribunal Federal;
  • representar a União ou a Fazenda Nacional nas causas cíveis em que figurar como autora, ré, assistente ou opoente, ou for por qualquer forma interessada;
  • oficiar e dizer de direito, oralmente ou por escrito, nas ações criminais da competência originária, do Supremo Tribunal; nas cíveis que interessaram à União ou à Fazenda Nacional, às autarquias que desempenhem serviço federal ou às pessoas incapazes; nas extradições, recursos ordinários sobre mandado de segurança, homologação de sentenças estrangeiras, conflitos de jurisdição e de atribuição;
  • suscitar, perante o Supremo Tribunal Federal, nos casos de competência deste, os conflitos entre o governo federal e o dos estados:
  • promover as causas da União, da competência originária do Supremo Tribunal, contra os estados e o Distrito Federal, e defendê-la nas que estes ou qualquer nação estrangeira lhe moverem;
  • requerer, em benefício do condenado, a revisão das sentenças criminais proferidas pelo Supremo Tribunal;
  • pronunciar-se como de direito, sabre a conveniência, oportunidade ou legalidade, da intervenção federal, e sobre os pedidos de pagamento, em execução de sentença, nos casos previstos em lei;
  • intervir oralmente, e sem limitação de prazo, após a defesa da parte, além do pronunciamento por escrito mediante vista dos autos nos casos previstos em lei, na discussão de quaisquer processos ou em grau de recurso pelo Supremo Tribunal Federal;
  • requisitar das autoridades competentes as diligências, certidões e quaisquer esclarecimentos para o regular desempenho de suas funções.
Repórter de política em Brasília. Na Itatiaia desde 2021, foi chefe de reportagem do portal e produziu série especial sobre alimentação escolar financiada pela Jeduca. Antes, repórter de Cidades em O Tempo. Formada em jornalismo pela Universidade Federal de Minas Gerais.