Ergonomia no retorno ao trabalho: passos seguros para reintegrar sua equipe

Pequenas ações fazem grande diferença na volta de quem esteve afastado por acidente ou doença ligada ao trabalho; a reintegração pode ser fonte de sofrimento ou de reconstrução, a depender de como a empresa organiza esse retorno

Retorno ao trabalho pode ser oportunidade de reconstruir confiança

Na prática, o retorno ao trabalho após um afastamento causado por acidente ou adoecimento, costuma ser um momento frágil, em que o trabalhador volta com dor, limites físicos ou psicológicos, medo de perder o emprego e sensação de estar sob observação o tempo todo.

Em um estudo qualitativo chamado “Desafios do Retorno ao Trabalho”, publicado na revista Saúde em Debate, oito pessoas afastadas por doenças ou acidentes ocupacionais, atendidas em um Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest), descrevem o retorno como experiência difícil, marcada por insegurança, humilhação, cobrança por produtividade e a impressão de que precisam provar o tempo todo que não estão “fazendo corpo mole”.

Esses relatos indicam que, quando empresa, INSS e serviços de saúde não se articulam, o trabalhador volta sem apoio consistente, o que alimenta sentimentos de revolta, inutilidade e abandono, mesmo quando há laudos, CAT e reconhecimento formal do agravo.

Quando a volta adoece de novo

O estudo mostra que vários trabalhadores retornam antes de se sentirem realmente aptos, muitas vezes após alta do INSS que não dialoga com a avaliação de quem acompanha o tratamento no SUS. Nessa situação, aceitam tarefas pesadas ou inadequadas por medo de perder renda, acumulando dores e sofrimento psíquico, o que pode se agravar quando encontram pouca abertura da chefia para discutir adaptações de posto, ritmo ou mudança gradual de função.

As entrevistas reunidas pela pesquisa também revelam mudanças nas relações dentro da equipe: há relatos de afastamento por parte de superiores, cochichos em cantos de fábrica e olhares de desconfiança, como se a nova limitação fosse sinônimo de menor valor para a empresa.

Somados à dificuldade de acesso à reabilitação contínua e à burocracia para comprovar nexo com o trabalho, esses fatores levam alguns a abandonar o emprego formal ou migrar para atividades informais, ainda com sequelas ligadas à função anterior.

O que a ergonomia bem feita ensina às fábricas

No artigo “Os primeiros passos de um programa de ergonomia na empresa: duas experiências distintas”, publicado na Revista Gestão Industrial da UTFPR, pesquisadores analisam o início de programas ergonômicos em uma engarrafadora de bebidas e em uma metalúrgica de embalagens de alimentos, ambas em Pernambuco.

Em vez de ações isoladas, as empresas criaram Comitês de Ergonomia (COERGO), com representantes de vários setores e níveis hierárquicos, responsáveis por implementar medidas ergonômicas e envolver os trabalhadores na identificação e solução dos problemas.

Esses comitês passaram por ciclos de formação em ergonomia, organizaram eventos de lançamento, palestras para 100% dos colaboradores, enquetes para mapear insatisfações, análise de registros de ambulatório e aplicação de formulários detalhados, transformando as respostas em planos de ação estruturados.

As intervenções incluíram tanto mudanças físicas em máquinas e postos quanto ajustes organizacionais e cognitivos, com grupos de trabalho específicos para cada frente e reuniões periódicas para acompanhar a execução das melhorias.

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Passos práticos para pequenas e médias indústrias

Mesmo sendo estudos realizados em indústrias de grande porte, os princípios descritos podem orientar pequenos e médios industriais na hora de estruturar o retorno de afastados. Um programa simples de ergonomia ajuda a organizar o problema em partes menores e administráveis, em vez de depender apenas de soluções pontuais ou da iniciativa individual de cada gestor na hora da reintegração.

Alguns movimentos possíveis, inspirados nessas experiências:

  • criar um pequeno grupo interno de ergonomia, com gente da produção, manutenção, RH e segurança, preferencialmente voluntária e respeitada no chão de fábrica;
  • oferecer a esse grupo uma formação básica em ergonomia e em observação do trabalho real, com apoio de serviços públicos ou de consultoria pontual;
  • usar checklists e formulários simples para mapear postos críticos e queixas de dor, priorizando casos de retorno; negociar, para cada trabalhador que volta, ajustes graduais de carga, ritmo e função, em diálogo com laudos e orientações de saúde;
  • registrar tudo em um plano de ação claro, com responsáveis, prazos e forma de acompanhar resultados em termos de dor, queixas no ambulatório e novos afastamentos.

Mais do que cumprir uma formalidade, essa combinação entre escuta, ergonomia participativa e articulação com a rede pública de saúde transforma o retorno ao trabalho em uma oportunidade de reconstruir confiança, tanto para quem volta quanto para quem precisa manter a produção rodando sem adoecer sua equipe.

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Amanda Alves é graduada, especialista e mestre em artes visuais pela UEMG e atua como consultora na área. Atualmente, cursa Jornalismo e escreve sobre Cultura e Indústria no portal da Itatiaia. Apaixonada por cultura pop, fotografia e cinema, Amanda é mãe do Joaquim.

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