Consulta 1: Perdoar – é jogar fora o lixo que o outro deixou em você!
Uma paciente entra no meu consultório – no SUS. Nunca a tinha visto. Era uma primeira consulta.
Após os cumprimentos, diz ter procurado atendimento porque estava se sentindo sobrecarregada, cansada e desanimada. Sua mãe tivera um AVC e tornara-se acamada e, totalmente, dependente para todas as tarefas diárias.
A paciente, de meia idade, mãe de 3 filhos, e uma vida profissional pela frente, teve que abandonar seu emprego para garantir os cuidados integrais a sua mãe.
Pergunto para ela se não tem irmãos. Responde que tem: oito.
Insisto: “Mas nenhum deles te ajuda nos cuidados?”.
- Sabe, doutora, não julgo meus irmãos. Minha mãe não foi muito cuidadosa conosco, era alcoólatra e batia muito na gente.
Reflexiva e sem saber o que eu deveria falar, perguntei:
- Mas, por que você cuida dela com tanta dedicação?
- Porque foi ela quem me deu a vida!
** Após essa resposta, não consegui lembrar de mais nenhum detalhe daquele atendimento... Minha vontade era, simplesmente, agradecê-la, “pagar a consulta” e sair com meus pensamentos!
Consulta 2: Resiliência – capacidade de se recuperar e conseguir aprender com situações de crise
A paciente entra em meu consultório. Um belo par de olhos azul-anil, uma boca bem delineada com batom vermelho e um andar em desalinho me chamam a atenção.
Pergunto sua história pregressa – o que é de praxe em uma consulta médica.
- Fuma? Usa álcool?
- Não.
- Já foi internada ou fez alguma cirurgia?
Percebo um leve sorriso no canto de sua boca.
- Estou me preparando para minha décima quarta cirurgia.
Ah? Não consigo disfarçar minha cara de surpresa!
Minha paciente ficou presa por 8 horas em um deslizamento de terra, fraturou diversos ossos, mas salvou a vida de sua filha de apenas 3 anos. No acidente, ela conseguiu deitar-se por cima da filha, que teve apenas pequenos arranhões.
Como ela não se incomodou em falar sobre o assunto, quis saber todos os detalhes.
Após contar sua história, entendi porque aquele olhar não refletia apenas um belo azul.
** Mariana R.A., sou sua eterna fã!
Consulta 3: Empatia – colocar-se no lugar do outro
Uma paciente, de 44 anos, entra em meu consultório para um segundo atendimento. Apresenta um semblante triste e pede desculpas pela demora em retornar com os resultados dos exames.
- Não consegui vir antes, doutora, porque a vida virou do avesso. Meu pai faleceu. Quando recebeu o diagnóstico de câncer no rim, já estava tudo tomado. E, para piorar, meu irmão está aguardando o resultado de uma biópsia da próstata. Ainda não sabemos se é notícia ruim, lamentava-se.
Naquele instante, sem saber o que responder, decido exercitar a empatia. Por alguns segundos, em minha mente, eu me vi envolvida num último abraço apertado de despedida junto ao meu pai e, em seguida, acariciei minha querida irmã, sugerindo forças para o atual desafio.
Um bolo desagradável subiu para minha garganta, a boca secou, os olhos ficaram úmidos. Foi difícil me imaginar naquela situação.
Suspirei fundo e voltei para a consulta.
- O momento está muito difícil para minha mãe e minha família, comenta a paciente.
- Nem consigo imaginar, respondo, com coração ainda acelerado. E, continuamos a consulta...
* A empatia nos dá paciência, sensatez, parcimônia, reduz o hábito de julgar o outro.
*** Agradeço aos pacientes por dividir suas histórias e trazer tantos ensinamentos para as consultas.