Pesquisadora, palestrante e autointitulada futurista, a americana Amy Webb criou uma boa definição para ilustrar o período de enormes mudanças que estamos assistindo em nível global, em várias dimensões. Ela passa ao largo das definições tradicionais das gerações X, Y (millenials) e Z, e define da seguinte forma os atuais atores do mercado de trabalho: “Somos, coletivamente, a geração T”, ou seja, a geração da transição em diferentes níveis: econômico; tecnológico; educacional; social.
E acrescenta: “Daqui a cinquenta anos, as pessoas vão olhar para todos que estão vivos hoje como o grupo que viveu a grande transição”.
Nesse processo, o comércio é uma das dimensões onde se pode sentir mais intensamente tais movimentos de mudanças.
A dura política tarifária do Donald Trump imposta aos países que vendem seus produtos nos Estados Unidos e o movimento de players atingidos pela medida para reagir ou se adaptar a essa nova realidade trouxeram total imprevisibilidade a essa atividade econômica, rompendo com processos há muito consolidados. As preocupações com os próximos capítulos desse enredo crescem, e o esvaziamento da Organização Mundial do Comércio (OMC) só contribuiu para aumentar as inquietações.
Economist Inteligence Unit, divisão de pesquisa e análises do mesmo grupo que edita a revista The Economist, diz em sua recente publicação “Industry transformation amid tariff dislocation”:
“Em diversos setores, as empresas estão respondendo com aumentos de preços, ajustes na gama de produtos, investimento na produção doméstica (notadamente no setor farmacêutico) e busca por acordos comerciais para mitigar sua exposição a novas tarifas dos Estados Unidos. Isso indica uma mudança mais ampla na estratégia industrial e na configuração da cadeia de suprimentos devido a pressões geopolíticas”.
Em outro artigo recente, intitulado “Make America alone again”, a publicação especializada Foreign Affairs aponta que, ao virar as costas para aliados tradicionais e romper parcerias comerciais bem-sucedidas, o governo americano faz uma aposta duvidosa.
“Ao desmantelar alianças que lhe serviram bem, os Estados Unidos arriscam uma quebra geral de estabilidade e ordem que, a longo prazo, se mostrará extremamente custosa (...) A notável falta de precedentes históricos para tal comportamento (...) mostra os Estados Unidos agindo contra seus próprios interesses de maneira desconcertante, minando uma das principais fontes de poder”.
Nesse ambiente volátil tendem a se sair melhor governos e empresas capazes de aprimorar sua capacidade de leitura multidimensional de cenários prováveis à frente, bem como estabelecer prioridades de forma cirúrgica e saber transformá-las em realidade. Esse processo permite ganhar musculatura e, portanto, melhores condições de competitividade e negociação neste período de turbulências sem data para acabar.
Já à época uma economia protagonista, a China soube, em 2015, estabelecer um plano de voo consistente ao criar o programa “Made in China”, destinado a colocá-la em novo patamar na década seguinte. E a buscar, ao mesmo tempo, a gradativa redução da dependência de tecnologias estrangeiras.
O resultado do esforço de Pequim pode ser visto em diferentes setores. Alguns exemplos: seus carros elétricos circulam hoje no mundo todo; modernas soluções em energia limpa mudaram a imagem anterior de um país acostumado a poluir como se não houvesse amanhã; e a bem-sucedida indústria aeroespacial do país produz foguetes, satélites, aviões de usos comercial e militar.