Chegou o tão aguardado novembro da COP30, depois de tantas questões sensíveis: da corrida para garantir a Belém uma infraestrutura minimamente adequada até o esforço do Brasil para obter dos signatários do Acordo de Paris suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (metas por países para enfrentar as mudanças climáticas),
E novembro chega com a informação de que a taxa de desmatamento na Amazônia Legal registrou o terceiro menor patamar da série histórica iniciada em 1988 segundo os dados do sistema Prodes, utilizado para esse fim pelo Instituto Nacional de Pesquisas espaciais (Inpe).
“Nem nos melhores sonhos eu imaginaria que chegaríamos nesse momento com redução de 50% na Amazônia em comparação com 2022”, festejou na quinta-feira 30 de outubro a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. O entusiasmo na ministra pode ser explicado pelo fato de ser o desmatamento a principal causa de emissões de CO2 no Brasil (o país se comprometeu a zerar esse índice até 2030).
A floresta, a propósito, será tema central da COP30, que acontece de 10 a 21 novembro. O evento propriamente dito será antecedido pela reunião de chefes de estado, nos dias 6 e 7, encontro esse que tradicionalmente pavimenta o caminho para as decisões técnicas das comitivas dos países participantes de cada COP.
O Brasil vem insistindo na questão do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, um mecanismo destinado a remunerar países que proporcionem redução no corte de grandes reservas verdes como a Amazônia. Além do Brasil, seriam beneficiados por recursos desse fundo países como Peru, Colômbia, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana, Suriname e Guiana Francesa, na América do Sul. Na África Central receberiam recursos a República Democrática do Congo e Gabão, entre outros. Na Ásia, principalmente a Indonésia.
O governo federal tenta mobilizar outras nações a bancarem o TFFF (sigla em inglês desse fundo) e foi o único país até agora a prometer um aporte financeiro específico, no valor de US$ 1 bilhão. A COP30 é vista como o palco perfeito para que outros países façam anúncio similar.
Alto custo das mudanças climáticas
Se novembro começa sob a égide da COP30, outubro terminou com um triste balanço da passagem pelo Caribe de um dos mais destruidores furacões das últimas décadas. Trinta mortes e um prejuízo inicial estimado em pelo menos US$ 8 bilhões na Jamaica e Cuba, principalmente, mas também na República Dominicana e Haiti. Vinte e cinco anos atrás o Katrina, outro furacão de enorme impacto, atingiu a Costa do Golfo do México, nos Estados Unidos, deixando sequelas e lições.
No intervalo entre esses dois episódios um número significativo de furacões, ciclones tropicais e tufões têm ampliado seu poder destrutivo, e há uma explicação científica para isso.
Segundo os cientistas, as temperaturas médias da superfície dos oceanos estão 0,8 °C acima da média do século XX e a energia adicional absorvida pelo mar em decorrência desse aquecimento faz com que as tempestades se intensifiquem mais rapidamente. As temperaturas mais altas torna aqueles fenômenos mais impactantes: os ventos ganham mais velocidade, as chuvas ficam mais intensas e as inundações se multiplicam.
A proporção de ciclones tropicais que atingem as perigosas categorias quatro e cinco pode aumentar em cerca de 10% se o aumento da temperatura global for limitado a 1,5°C, subindo para 13% a 2°C e para 20% a 4°C, segundo o Painel Intergovernamental sobre mudanças climáticas (IPCC, na sigla em inglês).
O Katrina que em 2005 varreu uma área de 242 mil quilômetros quadrados (equivalente ao estado de São Paulo), afetou o estado de Lousiana e castigou em especial Nova Orleans, é exemplo das razões pelas quais cidades, estados e governos devem se preocupar com as mudanças climáticas (e estarem preparados para enfrentar tais fenômenos climáticos crescentemente ameaçadores).
No total morreram naquela tragédia 1.392 pessoas, Nova Orleans teve bairros inteiros completamente alagados e milhares de habitantes ilhados durante semanas.
O prejuízo financeiro final chegou a 201 bilhões de dólares e as empresas de seguros arcaram com indenizações de 105 bilhões de dólares, dois números recordes. A cidade tinha 460 mil habitantes antes do furacão e logo depois de sua passagem registrava apenas 209 mil, uma vez que grande número de pessoas deixou a região para tentar reconstruir a vida em outras regiões.
Graças a um grande esforço de recuperação econômica e altos investimentos em infraestrutura (apenas em novos diques de contenção foram gastos 15 bilhões de
dólares) a cidade ficou mais rica. E seria tentador dizer que conseguiu dar a volta por cima.
Mas não exatamente.
O nível de emprego diminuiu desde então e agora existem 17 mil vagas a menos do que em 2005. Parte dos habitantes que havia partido voltou, mas a população, de 380 mil pessoas, ainda é menor do que há vinte anos.
Mas a população não mudou apenas nos números: hoje há menos afrodescendentes. Eles eram 67% em 2005 e são agora 54% e viram aumentar o gap em relação a população branca quanto a capacidade de adquirir a casa própria.
Por sinal, os preços dos seguros residenciais e de automóveis assustam: subiram em média mais de 30% em 2024 e continuam em curva ascendente ao longo de 2025.
Duas décadas depois, portanto, as marcas do Katrina ainda estão presentes.
Na verdade, Nova Orleans assiste a um processo típico do que se convencionou chamar de gentrificação climática, que ocorre quando existe aumento dos custos de habitação em função de riscos climáticos que se multiplicam. Um desses riscos é a subida do nível dos. Mas existem outras variáveis, até mesmo mais comuns: os furacões, tufões, ciclones, fortes tempestades e inundações sempre presentes.
Marés mais altas e ameaçadoras respostas da natureza às mudanças climáticas fazem aumentar os custos de moradia e o valor das propriedades em diferentes geografias do planeta, afetando áreas antes ocupadas por populações de mais baixa renda. Estas, com frequência, são forçadas a se deslocar em busca de locais mais baratos.
Pessoas de alta renda, por sua vez, têm mais opções. Podem se instalar em regiões menos vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas (como terrenos em nível mais elevado, por exemplo). Todo esse conjunto de variáveis já esboça uma significativa mudança demográfica e socioeconômica.
Jess Keenan é o autor do livro “North: the future of the post-climate America”, onde ele afirma que os Estados Unidos estão entrando em uma nova era, marcada por mudanças populacionais que irão transformar diferentes dimensões do país, desde a ocupação territorial ao sistema político. Segundo ele, a dinâmica demográfica será cada vez mais impactada por aspectos econômicos e ambientais.