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Moradores do edifício JK temem rumos da administração: irmão de síndica polêmica está na disputa

Síndica há mais de 40 anos do Edifício JK, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, Maria Lima das Graças está internada no Hospital Felício Rocho, no Barro Preto

Edifício JK em Belo Horizonte tem cerca de 5 mil pessoas

Com a síndica Maria Lima das Graças internada, o Edifício JK, no Centro-Sul de Belo Horizonte, vive dias de incerteza. Nesse cenário, segundo moradores, surgem articulações e disputas de bastidores, enquanto quem vive no prédio icônico de Niemeyer teme o futuro da gestão do condomínio.

De acordo com o advogado Faiçal Assruy, que representa Maria das Graças e o condomínio, no momento, quem responde interinamente pela função é o gerente administrativo, Manoel Gonçalves de Freitas Neto.

Ele foi eleito subsíndico, ao lado do irmão mais novo da síndica, Caio Rômulo Delgado de Lima, em 7 de dezembro, quando o Condomínio do Conjunto Kubitschek realizou Assembleia Geral Ordinária (AGO) no auditório do Cruzeiro Esporte Clube, também no Barro Preto, e confirmou a reeleição de Maria Lima das Graças. O parentesco centre Caio e Maria das Graças foi confirmado por meio de documentos a que a Itatiaia teve acesso.

A votação ocorreu sem inscrição de chapa de oposição. Em anos anteriores, segundo moradores, tentativas de candidatura foram desestimuladas por episódios de perseguição e difamação. Maria Lima das Graças, por unanimidade dos presentes e das procurações, foi reeleita.

A advogada Anna Cristina e Souza, especialista em direito condominial, explica que, enquanto a síndica estiver hospitalizada ou impossibilitada de exercer as funções, é necessário verificar o que dispõe a Convenção do Condomínio sobre sua substituição. “Em geral, a função pode ser assumida pelo subsíndico ou, na ausência deste, por um membro do conselho fiscal, garantindo a continuidade da gestão administrativa”, explicou.

Conselho deve se se reunir

Faiçal Assrauy, advogado do condomínio, confirmou que, atualmente, a função está sob responsabilidade de Manoel. “Caso seja necessário o afastamento definitivo ou aconteça algo que a impeça de continuar o mandato, o conselho vai se reunir, deliberar e decidir qual será a solução”, informou.

Maria das Graças e Manoel foram denunciados pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), em 2024, por crimes contra o patrimônio cultural, devido à falta de manutenção em áreas tombadas. A audiência que pode levar ao afastamento judicial de Maria Lima do cargo está marcada para o dia 7 de outubro.

Enquanto a síndica permanece internada, ainda não se sabe o que acontecerá com a sessão. A defesa informou, nessa quarta, que, por ora, não decidiu se pedirá o adiamento.

Enquanto isso, nos corredores do JK...

Nesse cenário, moradores do Edifício JK denunciam uma suposta manobra do gerente, Manoel Gonçalves de Freitas Neto, e da própria administração do condomínio.

Três pessoas, que preferiram não se identificar por medo de represálias, ouvidas pela reportagem da Itatiaia, relataram que circula a informação sobre uma tentativa de convocar uma assembleia extraordinária, com suposta formação de uma nova chapa composta por Manoel e um funcionário, que faria oposição ao irmão da síndica, Caio Rômulo Delgado de Lima.

Segundo uma das moradoras, “nunca me pediram para assinar procuração, mas frequentemente pedem apoio”. “Dizem que o Manoel é uma pessoa mais aberta, mesmo não sendo o síndico ideal. Comentam que o caos se instalaria no condomínio caso outra pessoa assumisse a gestão, por não conhecer as estruturas físicas, processuais e financeiras do prédio. Além disso, afirmam que ele poderia ser até mais rígido que a própria síndica”, disse. Moradores ainda relataram que não conhecem Caio e que ele não tem apartamento no edifício.

“Nossa desconfiança é a seguinte: eles estão desesperados com a possibilidade de serem afastados e o Ministério Público ou a juíza nomearem um interventor da prefeitura para cuidar do prédio. Isso significaria alguém de fora do grupo deles, tendo acesso à contabilidade”, afirmou outro morador.

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Medo e procurações

Outra proprietária relatou que, em agosto do ano passado, quatro meses antes de quando ocorreu a reeleição de Maria das Graças, foi chamada pela administração e solicitada a assinar uma procuração para representação em assembleias — o que recusou.

“Me disseram que o antigo proprietário já havia assinado uma procuração e queriam que eu também assinasse, para que eles me representassem nas assembleias”, relatou.

Ela contou que tem medo e, por isso, só vai à administração com o celular escondido, gravando. “O clima lá é horrível! O ambiente é de intimidação e ameaça. Há placas proibindo o uso de celular, instruções sobre como se vestir para ser atendido e até avisos maldosos, como os que mandam não falar mal do JK...”, relatou.

O outro lado

Sobre os relatos acima, o advogado Faiçal Assrauy afirmou não ter conhecimento. “Mas, certamente, caso sejam convocadas novas eleições, todos que atenderem às exigências do estatuto poderão concorrer”, disse.

A reportagem tentou contato com Caio Rômulo Delgado de Lima. O espaço segue aberto caso ele queira se manifestar. Também foi procurado Manoel Gonçalves de Freitas Neto, que não respondeu até a publicação desta matéria.

Em relação à audiência marcada para o dia 7, o advogado destacou que o condomínio é tombado pelo patrimônio histórico e composto por moradores de baixa renda. Segundo ele, as intervenções estão sendo realizadas, mas não na velocidade esperada pelo Ministério Público.

“É praticamente impossível fazer chamadas extras (financeiras), pois isso sufocaria os moradores e aumentaria a inadimplência. A obra de impermeabilização já foi concluída, com autorização das autoridades competentes, e o próximo passo será a regularização do AVCB. Por fim, aproveito o espaço para sensibilizar o promotor a direcionar verbas públicas para nos auxiliar nessas demandas”, concluiu.

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Formou-se em jornalismo pela PUC Minas e trabalhou como repórter do caderno de Gerais do jornal Estado de Minas. Na Itatiaia, cobre principalmente Cidades, Brasil e Mundo.