A síndica Maria Lima das Graças, que está há mais de 40 anos à frente da administração do Edifício JK, no Barro Preto, região Centro-Sul de Belo Horizonte, pode ser afastada do cargo, a depender do resultado da audiência de instrução marcada para o dia 7 de outubro.
Ela e o gerente administrativo, Manoel Gonçalves de Freitas Neto, foram denunciados em dezembro de 2024 pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) por crimes contra o patrimônio cultural.
Mas, afinal: se a síndica sair, quem assume? Quais são os próximos passos do processo? E quem paga a conta da reparação? Para esclarecer essas questões, a Itatiaia ouviu a advogada Anna Cristina e Souza, especialista em direito condominial.
O que é audiência de instrução
A audiência de instrução é uma fase do processo judicial em que o juiz reúne as partes para ouvir testemunhas de acusação e defesa, interrogar o réu e analisar provas documentais ou periciais apresentadas.
Nesse momento, também podem ser feitos esclarecimentos e perguntas pelo Ministério Público e pela defesa. O objetivo é reunir elementos suficientes para que o magistrado forme sua convicção sobre os fatos e possa, ao final, dar a sentença.
Caso ela seja afastada, quem assume
No dia 18 de dezembro, a Justiça negou o pedido do MPMG para afastar de imediato Maria Lima e Manoel Gonçalves dos cargos por 120 dias. A juíza entendeu que não havia urgência ou risco iminente que justificassem a medida, mas ressaltou que o pedido poderia ser reavaliado ao longo do processo. Onze meses depois, a sessão ocorrerá.
“O juiz tem poder de afastar a síndica, mas o MP não pediu isso de forma definitiva, apenas o afastamento temporário”, explicou. “Após a audiência, o magistrado pode decidir pelo afastamento de Maria Lima e de Manoel, conforme solicitado pelo MP. Pelas alegações apresentadas, a administração da síndica não seria compatível com a sindicatura, mesmo após tantos anos no cargo.”
Caso o afastamento seja decretado, o MP pede a nomeação de um síndico judicial, que seria escolhido pelo próprio juiz. “Depois da audiência, o juiz dará a sentença, mas o processo é longo. Há muitas etapas e recursos possíveis até que a decisão final seja prolatada”, detalhou a advogada.
Penas e multa
A advogada lembra que, em caso de condenação, a legislação prevê punições estabelecidas na Lei 9.605/98 (artigos 21 a 24), como:
- Multa penal, que pode ter valores elevados;
- Prestação de serviços à comunidade, como custeio de projetos culturais, restauração de áreas afetadas ou contribuição a entidades;
- Obrigação de reparar o dano ao patrimônio cultural.
O MPMG pede que seja fixado um valor mínimo de R$ 1,1 milhão em reparação: R$ 1 milhão destinado à restauração do Edifício JK ou ao Fundo Municipal de Patrimônio Cultural, e R$ 100 mil ao Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG), pelos danos causados.
E quem paga?
De acordo com Anna Cristina e Souza, a responsabilidade financeira não recairia apenas sobre a síndica. “Se o MP vencer, o juiz vai arbitrar o valor requerido, e esse ônus será dos condôminos. Em outras palavras, os proprietários do Edifício JK é que terão de arcar com a reparação”, afirmou.
A outra possibilidade é o juiz considerar a ação improcedente, mas, nesse caso, o MP pode recorrer.
A reportagem da Itatiaia entrou em contato com Faiçal Assrauy Advogados, responsável pela defesa no processo, que disse que não irá se manifestar no momento.
Confira a linha do tempo
- 1966 – Governo de Minas doa ao Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG) o imóvel no JK;
- 1967 – IHGMG recebe a escritura de doação em comodato, com área de 500 m² na sobreloja do JK;
- 2007 – Conselho do Patrimônio Cultural de BH abre processo de tombamento do Conjunto JK;
- 2008 – O Conjunto Praça Raul Soares/Avenida Olegário Maciel, incluindo o JK, é protegido;
- 2020 a 2024 – Apontada omissão dos responsáveis em adotar medidas de preservação, levando à deterioração do prédio;
- 2021 – DPCA faz vistoria no JK e aponta danos; Conselho aprova tombamento provisório do edifício;
- 2022 – Tombamento definitivo do Edifício JK é aprovado;
- Abril/2023 – Laudos da Polícia Civil confirmam avarias e deterioração do imóvel;
- Dezembro/2024 – Ministério Público denuncia Maria Lima das Graças, Manoel Gonçalves de Freitas Neto e o Condomínio do JK por crimes contra o patrimônio cultural; processo é distribuído para a 1ª Vara Criminal de BH;
- 18/dezembro/2024 – Juíza nega afastamento imediato dos denunciados de suas funções;
- 07/outubro/2025 – Marcada audiência de instrução e julgamento.