Quase 600
De acordo com o Ministério da Saúde, no mesmo período houve 16.559 atendimentos ambulatoriais e 2.161 internações ligadas a esses cânceres. Os números se referem a procedimentos realizados e não indicam quantas pessoas receberam diagnóstico. Mesmo assim, especialistas alertam que o estigma em torno do HPV ainda afasta pacientes dos consultórios e dificulta a prevenção.
Transmitido principalmente por via sexual, mas também pelo contato direto entre a pele, o HPV é o principal fator de risco para os cânceres de vulva e vagina. Para o oncologista Caetano da Silva Cardial, da Federação Brasileira das Associações em Ginecologia e Obstetrícia, o preconceito ainda pesa. Segundo ele, tumores associados ao vírus costumam carregar julgamentos que atrasam a busca por ajuda médica.
Estatísticas
Dados da Organização Mundial da Saúde mostram que cerca de 4,5% de todos os cânceres no mundo estão ligados ao HPV, o que representa aproximadamente 630 mil novos casos por ano.
Entre 2022 e setembro de 2025, o Brasil registrou 1.964 mortes por câncer de vulva. A região Sul concentrou parte expressiva dos óbitos, com 400 casos, enquanto o Norte teve 75. O estado de São Paulo lidera em números absolutos, com 521 mortes, cenário que pode refletir a concentração de serviços especializados e o deslocamento de pacientes em busca de tratamento.
No mesmo intervalo, foram contabilizadas 593 mortes por câncer de vagina no país, sendo 147 apenas em 2025 até setembro. A maior parte dos óbitos ocorreu na região Sudeste.
Vulva x vagina
Apesar de frequentemente confundidas, vulva e vagina são estruturas diferentes. A vulva corresponde à parte externa da genitália feminina, enquanto a vagina é o canal interno que liga a vulva ao colo do útero. Essa confusão, segundo especialistas, é comum no Brasil e em outros países.
Causas e sintomas
O câncer de vulva é um tumor raro de pele e pode ter duas origens principais. Uma delas é a infecção pelo HPV, mais comum entre mulheres de 45 a 55 anos. A outra está relacionada ao líquen escleroso, uma doença inflamatória de provável origem autoimune que afeta principalmente mulheres mais jovens e idosas, com maior incidência após os 60 anos.
O líquen escleroso provoca coceira persistente e, sem tratamento, pode evoluir para câncer em até 60% dos casos. Com acompanhamento médico e uso regular de pomadas à base de corticoide, o risco cai de forma significativa.
Os sintomas iniciais costumam ser pouco específicos, como coceira, feridas, sangramentos, úlceras ou mudança na cor da pele da região íntima. Por serem sinais comuns a outras doenças, muitas mulheres demoram a procurar atendimento, o que contribui para diagnósticos em fases mais avançadas.
Quando o câncer de vulva é identificado no início, com tumores pequenos e sem comprometimento dos gânglios, as chances de cura com cirurgia são altas. Em estágios avançados, quando já há metástase, o tratamento envolve radioterapia e quimioterapia, com menor taxa de sucesso.
No câncer de vagina, tumores pequenos e restritos à mucosa também podem ser tratados com cirurgia. Lesões maiores ou mais profundas geralmente exigem radioterapia associada à quimioterapia. Como costuma atingir mulheres mais jovens, o impacto na fertilidade e na vida sexual pode ser maior, já que a radioterapia pode causar alterações hormonais, ressecamento e estreitamento do canal vaginal.
Diagnóstico e prevenção
O diagnóstico precoce é considerado decisivo nos dois tipos de câncer. Especialistas recomendam que mulheres, especialmente após a menopausa, procurem um médico se apresentarem coceira persistente por mais de duas semanas, feridas, sangramentos fora do habitual ou alterações visíveis na vulva.
A infectologista Rosana Richtmann, entrevistada pela Folha de São Paulo, destaca que o Brasil avançou no rastreamento ao incluir testes moleculares de HPV na rede pública. Segundo ela, esses exames são mais sensíveis que o papanicolau e permitem identificar o vírus antes que lesões evoluam para câncer.
A vacinação contra o HPV é apontada como a principal forma de prevenção. Disponível gratuitamente no SUS, a vacina quadrivalente protege contra os tipos mais comuns do vírus associados ao câncer. Na rede privada, a versão nonavalente amplia essa proteção.
Mesmo assim, muitos pais ainda resistem à vacinação por acreditarem, de forma equivocada, que ela pode estimular o início da vida sexual. Para os especialistas, esse estigma também faz com que jovens e mulheres deixem de relatar sintomas ou buscar ajuda médica, o que reforça a importância da informação e da prevenção.