O turismo gastronômico na Espanha, país que recebe 94 milhões de visitantes por ano, é responsável por 27% do Produto Interno Bruto (PIB) e movimenta mais de 433 bilhões de dólares, se considerado toda uma cadeia que inclui desde a agricultura até os restaurantes. O segmento responde por 37% do mercado de trabalho e gera 7,2 milhões de empregos em tempo integral no país.
As conclusões são do relatório “Gastronomia Espanhola: Impacto e Tendências de um Ecossistema Chave para a Economia”, elaborado em parceria pela Real Academia de Gastronomia e pela consultoria KPMG.
Os números são ainda maiores no caso da França, onde a extraordinária culinária nacional movimenta mais de 480 bilhões de dólares por ano graças em grande medida aos 100 milhões de estrangeiros que visitam o país todos os anos. Não coincidentemente, a França é imbatível no tradicional Guia Michelin com seus 639 restaurantes estrelados, que correspondem a 20% do total dos estabelecimentos listados em todo o mundo.
Essa relevância da gastronomia como pilar do PIB e fator gerador de empregos tem crescido ao longo das últimas três décadas, em nível global. Muito contribuiu para essa tendência o movimento Slow Food, cujas raízes repousam em uma alimentação “boa, saudável e sustentável” em contraposição ao hábito das refeições estilo fast food. Iniciado na Itália, que recebe 68 milhões de visitantes estrangeiros ao ano e fatura perto de US$ 100 bilhões com turismo gastronômico, o movimento ganhou adeptos em todas as geografias.
A tendência de transformar a boa mesa em algo mais do que um mero almoço ou jantar não tem apenas uma origem. As razões vão desde um crescente interesse por pratos regionais baseados em ingredientes nativos identificados com a preservação cultural e as abordagens sustentáveis, até a busca por experiências únicas resultantes de releituras de cozinhas tradicionais ou de inovações atrativas. Caso, por exemplo, dos cardápios de restaurantes como o Trintaeum de Belo Horizonte, a Casa do Saulo em Belém do Pará, e o Mocotó, em São Paulo.
Pesquisas mostram que aproximadamente 1/3 dos turistas de todo o mundo levam em conta a variável culinária no processo de decisão de seus destinos de viagem. São esses personagens que fazem referências positivas acerca dos locais aprovados por seu paladar e por sua própria visão de mundo, proporcionando assim visibilidade adicional a cidades ou regiões inteiras comprometidas com oferta de serviços de qualidade.
Além disso, um vínculo natural nasce da boa comida com outros elos do seu entorno, como agricultura e comércio locais, sistemas de hospedagem e serviços de apoio como transportes, por exemplo. Em outras palavras, todo um ecossistema sai fortalecido.
O Peru é um excelente exemplo do aproveitamento desse conceito. Em duas décadas, a culinária do país ganhou o mundo e uma reputação impressionante. Segundo o órgão oficial PromoPeru, os pratos típicos e a criatividade de seus chefs representa um faturamento de 200 milhões de dólares por ano, ou cerca de 25% dos gastos dos turistas estrangeiros em seu território.
De cada dólar investido no turismo, pode-se dizer que 25 centavos se destinam a experiências gastronômicas, incluindo reservas em restaurantes, aulas de culinária local, degustações e compra de produtos locais. Vista como um todo a cadeia produtiva a gastronomia peruana pode estar gerando entre 1,4 e 1,5 bilhão de dólares por ano, patamar que se traduz no dobro do registrado há uma década.
A atividade de restaurantes no país latino-americano apresenta um crescimento constante e avançou mais de 3% no primeiro trimestre de 2025 frente ao mesmo período de 2024, basicamente impulsionado pelo turismo gastronômico.
O melhor restaurante do mundo, por sinal, está no Peru segundo a lista The World’s 50 Best Restaurants, versão 2025. Trata-se do Maido, em Lima, uma cozinha fusion peruano-japonesa. Um casal que queira fazer uma reserva no local terá datas disponíveis apenas a partir do final de janeiro de 2026 (situado na mesma cidade, o restaurante Central havia sido colocado no topo dessa mesma lista em 2023).
Não existem estatísticas precisas, mas estima-se que o mercado global de turismo gastronômico, depois de atingir dois trilhões de dólares em 2021 estaria chegando aos 3,5 trilhões de dólares em 2025.
As Nações Unidas reconhecem a gastronomia como um fator importante para alcançar diversos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), entre os quais a fome zero e o consumo responsável. No entender da organização, práticas de gastronomia sustentável (como o uso de ingredientes locais e a redução do desperdício) apoiam metas ambientais e constroem sistemas alimentares mais resilientes.