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Ataques a Brasília foram organizados pelas redes sociais

Criminosos que vandalizaram prédios públicos na capital federal usaram Facebook, Telegram e Twitter para divulgar ataques

Telegram tem grupos específicos para organização de ataques coordenados

“Festa da Selma”. Segundo a Agência Pública, esse foi o nome usado pelos vândalos que atacaram prédios públicos em Brasília para se referir aos atos que, no domingo (8), deixaram um rastro de destruição na cidade. A palavra “Selma” é uma referência a “selva”, termo usado como cumprimento em algumas divisões do Exército do Brasil.

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Se há poucas décadas, a principal fonte de informação eram meios oficiais, como a imprensa, a popularização das mídias sociais passou a permitir que qualquer um tenha seu conteúdo facilmente divulgado. Por isso, nas redes sociais, é possível encontrar centenas de referências ao movimento. Veja, a seguir, alguns desses posts publicados no Facebook e no Twitter.

Prints de grupos do Telegram mostram que o intuito dos criminosos era invadir as sedes dos Três Poderes e inviabilizar a infraestrutura crítica do país, com bloqueios em estradas, refinarias e aeroportos. Durante os ataques, os vândalos gravaram vídeos e tiraram fotos — esse material foi encaminhado para os grupos do Telegram.

A escolha, na opinião de Arthur Igreja, especialista em tecnologia e inovação, está relacionada ao fato de o Telegram ser mais permissivo. “Além disso, está menos interessado em confirmar informações, o que facilita a organização dos grupos e dos disparos”, destaca. “Por isso, é um ambiente mais fértil para quem procura uma rede para sustentar suas teses. Na verdade, as pessoas não estão procurando a melhor plataforma, mas aquela que confirma seus ideais.”

Algoritmos

Um dos aspectos que favorece o movimento são os algoritmos das redes sociais. Eles fazem o usuário ter suas visões constantemente reafirmadas. “O algoritmo produz um efeito circular para oferecer mais conteúdos similares aos consumidos pelo usuário, o que facilita a formação de circuitos fechados”, explica Bruna Della Torre, pós-doutoranda do departamento de Sociologia da Unicamp, que pesquisa a agitação de extrema-direita, em entrevista ao TecMundo.

Segundo ela, essas plataformas favorecem a extrema-direita tanto por reduzir o mundo ao binarismo do “like/dislike” quanto por equiparar todas as posições políticas, inclusive as antidemocráticas e golpistas. “Como se elas fossem uma mercadoria qualquer no mercado de opiniões”, afirma a pesquisadora.

Para Bruna, para diminuir a disseminação desses conteúdos antidemocráticos, a suspensão de contas e a desmonetização dos canais que disseminam ódio podem ser ações mais práticas para serem realizadas. Mesmo assim, ela ressalta que o caminho ainda é longo. Ambas as ações estão entre os pedidos de Alexandre de Moraes para as plataformas de redes sociais.

Uriã Fancelli, autor de “Populismo e Negacionismo”, aponta que os governos precisam se atentar ao poder alienador das redes sociais. Ele destaca que, quando a liberdade de expressão é usada para pregar a saída sem máscara em uma pandemia que mata 5 mil pessoas por dia ou para pregar a invasão de órgãos de governo, o conceito deixa de fazer sentido. “Esses momentos servem para que façamos uma autoanalise e possamos construir um futuro melhor com as ferramentas que temos.”