Aquela sensação de corpo dolorido no dia seguinte a um treino intenso é comum após atividade física e tem nome: dor muscular de início tardio, conhecida como DOMS (Delayed Onset Muscle Soreness, em inglês). Embora frequente, ainda gera dúvidas sobre sua origem e como lidar com ela.
De acordo com o doutor em ciências do esporte Everton Crivoi, responsável pela preparação física no Espaço Einstein Esporte e Reabilitação, a DOMS aparece entre 12 e 24 horas após o exercício, atinge o pico entre 24 e 72 horas e desaparece gradualmente nos dias seguintes. É diferente da dor aguda, que surge durante ou logo após o esforço, e também das lesões musculares, que têm início súbito e geralmente são intensas e localizadas.
“A dor muscular tardia é mais difusa, afeta áreas musculares amplas e ocorre especialmente após exercícios mais intensos ou movimentos aos quais o corpo não está habituado”, explica Crivoi.
A principal hipótese é que a DOMS seja causada por microlesões nas fibras musculares e tecidos conjuntivos, provocando uma resposta inflamatória. Substâncias como histamina e prostaglandinas são liberadas e sensibilizam os receptores de dor nos músculos. Exercícios que envolvem contrações excêntricas — como descer escadas ou realizar agachamentos — são os mais associados a esse tipo de dor.
Apesar da crença popular, sentir dor muscular não significa que o treino foi melhor ou mais eficaz. “A ideia de que ‘sem dor não há ganho’ é um mito”, alerta Crivoi. “É possível ganhar força e massa muscular sem sentir dor. A DOMS indica apenas que houve estresse muscular, não que o treino foi eficiente.”
Dor excessiva e persistente, no entanto, pode indicar sobrecarga e até riscos mais graves, como a rabdomiólise — condição em que há liberação de proteínas musculares na corrente sanguínea, com risco de dano renal. Casos com dor prolongada, febre ou urina escura exigem avaliação médica.
Os grupos musculares mais afetados costumam ser posteriores de coxa, quadríceps e panturrilhas, especialmente após corridas, saltos ou agachamentos. Pessoas mais experientes tendem a sentir menos dor, mas novos estímulos ou retorno após pausa também podem causar DOMS.
Como prevenir e aliviar
A melhor forma de evitar a dor tardia é seguir uma progressão gradual de intensidade nos treinos. Estudos demonstram que sessões leves iniciais ajudam a reduzir a dor em exercícios futuros — um fenômeno conhecido como “Repeated Bout Effect”. Aquecimento e alongamento não previnem a DOMS, e métodos como massagens, gelo ou calor não têm comprovação científica, mas podem melhorar o bem-estar.
Quando a dor aparece, a recomendação é recorrer à recuperação ativa. Atividades leves, como caminhadas ou movimentos suaves, ajudam a aumentar o fluxo sanguíneo e reduzem o desconforto. Em casos de dor intensa, o descanso nas primeiras 24 a 48 horas pode ser necessário. O uso de anti-inflamatórios não é indicado, pois pode atrapalhar a adaptação muscular. Analgésicos como o paracetamol podem ser usados com cautela.
“O uso de analgésicos como o paracetamol pode ser uma alternativa para aliviar o desconforto sem afetar tanto esse processo, mas se chegou ao ponto de precisar de remédio, é sinal de que o treino foi mal planejado”, alerta o especialista.
Além disso, manter-se hidratado e consumir proteínas ao longo do dia favorece a recuperação muscular, mesmo sem atuar diretamente na dor.
“A dor muscular tardia faz parte do processo de adaptação do corpo, mas não deve ser usada como parâmetro de desempenho. Treinar com inteligência, respeitar os limites e observar os sinais do corpo é o caminho mais seguro”, conclui Crivoi.