Pesquisa revela importância de acompanhante para idosos; ‘traduzir o que o doutor fala’, diz médico

Segundo a pesquisa da Universidade de Michigan, a maioria dos acompanhantes é formada por cônjuges (71%) e filhos adultos (20%)

Nove em cada 10 idosos se beneficiam ao levar acompanhante em consultas, diz pesquisa

Um levantamento feito pela Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, apontou que a presença de um acompanhante nas consultas médicas pode melhorar o cuidado com a saúde de pessoas idosas. O apoio ajuda a formular perguntas, entender as orientações e seguir o tratamento corretamente.

A pesquisa ouviu mais de 2,8 mil adultos com 50 anos ou mais. Entre os participantes, 92% disseram que o acompanhante teve um papel importante durante a consulta, 83% relataram se sentir mais à vontade para conversar com o médico e 79% afirmaram que o apoio facilitou o cumprimento das recomendações médicas.

Estudos anteriores já mostravam que informações claras e compreensão sobre os medicamentos aumentam as chances de adesão ao tratamento. “O acompanhante muitas vezes ajuda o paciente a entender o que o médico fala, repete as instruções e lembra o que foi dito depois em casa”, explica o médico de família e comunidade Gustavo Shikanai Kerr, do Programa Acompanhante de Idosos (PAI) da Unidade Básica de Saúde Campo Limpo, em São Paulo

Além de facilitar a comunicação, de acordo com a pesquisa, a presença de alguém próximo oferece apoio emocional diante de diagnósticos e tratamentos. Esse suporte é ainda mais importante em casos de doenças que afetam a memória, como a demência. Um levantamento brasileiro de 2023 mostra que 11,5% dos idosos apresentam algum grau de comprometimento cognitivo.

Desafios para o cuidado

Entre os fatores que dificultam o acompanhamento médico estão o uso de muitos medicamentos, dificuldades financeiras, problemas de locomoção e baixa escolaridade. No Brasil, 18% dos idosos tomam cinco ou mais remédios, segundo um estudo de 2023, publicado na Research, Society and Development. O uso de vários medicamentos pode dificultar o entendimento das orientações e o acesso aos remédios.

“O uso de linguagem técnica também é uma barreira, já que muitos pacientes têm baixo nível de compreensão sobre saúde”, afirma Kerr. Ele explica que a falta de recursos para transporte também interfere nas consultas. “Mesmo com passe de ônibus ou metrô, alguns pacientes não conseguem se deslocar e acabam recorrendo a aplicativos, o que gera custo”, acrescentou

Um outro estudo, de 2017, também mostrou que idosos com maior renda e escolaridade fazem até quatro vezes mais consultas médicas por ano do que os que dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS).

Quem acompanha

Segundo a pesquisa da Universidade de Michigan, a maioria dos acompanhantes é formada por cônjuges (71%) e filhos adultos (20%). Entre os participantes com mais de 50 anos que atuaram como acompanhantes, 28% disseram ter ido a consultas com um dos pais. “Há cada vez mais idosos cuidando de outros idosos. Uma pessoa de 80 anos acompanhando alguém de 90, por exemplo”, comenta Kerr.

Entre os idosos que costumam ir sozinhos às consultas (62%), 80% disseram não sentir necessidade de ajuda, 20% preferem ir sozinhos, 11% não querem ser um fardo e 6% não têm ninguém disponível para acompanhá-los.

Envelhecimento e políticas públicas

O número de idosos no Brasil vem crescendo rapidamente. Dados do Censo do IBGE mostram que, entre 2000 e 2023, a proporção de pessoas com 60 anos ou mais passou de 8,7% para 15,6%. A previsão é que esse grupo represente mais de 37% da população em 2070.

Para Kerr, esse cenário exige políticas públicas voltadas ao envelhecimento. “Precisamos fortalecer o sistema público de saúde e criar condições para que as equipes consigam acompanhar os idosos com mais qualidade”, afirma. Ele defende o trabalho em rede, a capacitação de profissionais e a integração entre os serviços.

Uma revisão publicada em 2023 no Brazilian Journal of Health Review apontou que a falta de profissionais especializados, a fragmentação das ações preventivas e a pouca comunicação entre os diferentes níveis de atenção continuam sendo desafios do SUS. Mais da metade dos idosos avaliados usava medicamentos considerados inadequados, e 35% apresentavam sintomas de depressão.

“Faltam programas de fisioterapia, alimentação saudável e prevenção de doenças. Precisamos de profissionais preparados para lidar com necessidades complexas e de políticas que acompanhem o envelhecimento da população”, conclui Kerr.

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Estudante de jornalismo pela PUC Minas. Trabalhou como repórter do caderno de Gerais do jornal Estado de Minas. Na Itatiaia, cobre Cidades, Brasil e Mundo.

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