Alvo da PF, ex-assessora de Lira é apontada como operadora central do Orçamento Secreto

Participação de Tuca no esquema foi denunciada por parlamentares de diferentes partidos no âmbito da ação de apura desvio de verbas nos repasses

Mariângela Fialek, conhecida como ‘Tuca’, é apontada como a pessoa responsável por operar os desvios no ‘Orçamento Secreto’

A investigação conduzida pela Polícia Federal (PF) e autorizada pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), aponta que a servidora da Câmara dos Deputados, Mariângela Fialek, conhecida como ‘Tuca’, exercia um papel central na manipulação e distribuição clandestina de emendas parlamentares, em um esquema que teria funcionado durante e após a gestão do ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL).

Nesta manhã, ela foi o principal alvo de uma operação da Polícia Federal que cumpriu dois mandados de busca e apreensão em sua residência, em Brasília, e no gabinete onde ela trabalha, na Câmara dos Deputados.

Segundo a PF, Tuca era responsável por organizar, controlar e direcionar verbas oriundas das emendas de comissão e das antigas emendas de relator - mecanismo que ficou conhecido como “orçamento secreto”.

Como a servidora atuava?

Segundo as investigações da Polícia Federal, Tuca era responsável por organizar e distribuir verbas de emendas parlamentares de maneira completamente informal e sem transparência. Ela produzia planilhas em nome da Presidência da Câmara indicando valores que deveriam ser enviados a estados e municípios - mas essas listas não identificavam qual deputado havia indicado a verba, nem qual era a finalidade do recurso. Tudo circulava de forma sigilosa.

Tuca também enviava, diretamente aos presidentes das comissões, minutas de ofícios e listas de distribuição com valores já definidos, sem que houvesse debate ou deliberação dentro das comissões. Dessa forma, atuava como um canal direto da Presidência da Câmara para o repasse das verbas, inclusive após a troca de comando na Casa, ocorrida no início deste ano.

De acordo com a PF, ela mantinha controles internos de “reservas” de emendas para determinados parlamentares, armazenando tabelas em nuvem que mostravam uma distribuição desigual e sem critérios oficiais - um método tão improvisado que os investigadores compararam a uma “conta de padaria”.

Outro ponto revelado pelas investigações é que Tuca redirecionava verbas entre municípios apenas com base em pedidos verbais de parlamentares. Essas mudanças eram feitas por meio de anotações informais, muitas vezes escritas à mão, o que reforça a suspeita de que ela operava um sistema paralelo e pouco transparente de controle das emendas.

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O material apreendido dos dados telemáticos de Tuca também aponta que a servidora possuía acesso privilegiado ao sistema de distribuição de verbas e que esse fluxo passava por ela de forma sistemática. Para os investigadores, isso demonstra que sua atuação era “longeva”, estruturada e com amplo conhecimento interno da mecânica orçamentária da Câmara.

Ligação direta com Arthur Lira

Diversos depoimentos citados na investigação atribuem a Tuca a função de executar determinações do então presidente da Câmara, Arthur Lira. Parlamentares ouvidos pela Justiça afirmaram que irregularidades relacionadas às emendas eram diretamente orientadas por Lira e operacionalizadas por sua assessora informal.

O deputado José Rocha (União-BA), por exemplo, entregou à PF mensagens que mostram Tuca enviando planilhas prontas para que ele assinasse ofícios de repasse de recursos - documentos que ele afirma ter recusado por falta de identificação dos autores e destinos. Rocha relatou ainda ter recebido pressões do próprio Lira, que teria cobrado a liberação de dezenas de milhões de reais para Alagoas.

Já o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) afirmou que Tuca era amplamente conhecida na Casa por atuar como “a secretária do presidente” que operava o orçamento secreto, mencionando inclusive que sua participação era citada em reportagens da imprensa e dentro do Parlamento.

Mesmo após o fim do mandato de Lira e a troca no comando da Câmara, as investigações mostram que Tuca permaneceu com influência sobre o fluxo das emendas, sugerindo a existência de um esquema contínuo de manipulação, mesmo após decisões do STF que proibiram mecanismos semelhantes.

E pra onde o dinheiro ia?

As investigações apontam que o esquema beneficiava especialmente municípios de Alagoas ligados a Arthur Lira, como Rio Largo, Barra de São Miguel e Maragogi. Depoimentos de parlamentares relacionam o envio atípico de verbas a prefeitos aliados do deputado.

Em Rio Largo - município com cerca de 70 mil habitantes - mais de R$ 90 milhões teriam sido liberados por meio de emendas de relator e de comissão entre 2019 e 2022. Um ex-prefeito do município, aliado de Lira, foi flagrado em investigações anteriores recebendo dinheiro vivo em esquemas envolvendo empresas de fachada.

Há ainda registros de que a Comissão de Turismo, que não possuía nenhum deputado de Alagoas, destinou milhões para municípios alagoanos, reforçando a suspeita de interferência externa. Tuca seria a responsável por operacionalizar essas distribuições.

Medidas autorizadas pelo STF

Com base nos indícios, o ministro Flávio Dino determinou:

  • busca e apreensão nas residências e salas usadas por Tuca na Câmara;
  • quebra de sigilo telefônico e telemático;
  • busca pessoal e veicular;
  • e seu afastamento de todas as funções relacionadas a emendas parlamentares.

A defesa de Mariângela e do deputado Arhur Lira foram procuradas para comentar, mas ainda não se manifestaram.

Supervisor da Rádio Itatiaia em Brasília, atua na cobertura política dos Três Poderes. Mineiro formado pela PUC Minas, já teve passagens como repórter e apresentador por Rádio BandNews FM, Jornal Metro e O Tempo. Vencedor dos prêmios CDL de Jornalismo em 2021 e Amagis 2022 na categoria rádio

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