Assembleia aprova privatização da Copasa em primeiro turno

O Governo de Minas defende a privatização da empresa como uma prerrogativa para a universalização do serviço de distribuição de água e coleta de esgoto, com a consequente adequação do estado ao Marco Legal do Saneamento

Sede da Copasa no bairro Santo Antônio, região Centro-Sul de BH

A Assembleia Legislativa de Minas Gerais (PL) aprovou em primeiro turno a privatização da Copasa. Por 50 votos a 17, nesta terça-feira (2), a base do governador Romeu Zema (Novo) na Casa deu aval ao Projeto de Lei (PL) 4.380, que prevê a venda da companhia de saneamento. O texto agora retorna à Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (FFO) antes de poder retornar ao plenário para a votação definitiva em segundo turno.

A reunião em plenário começou às 9h com deputados da oposição utilizando seu tempo de fala para tentar obstruir a pauta. Cerca de uma hora e meia depois, o bloco retirou os requerimentos apresentados à mesa diretora na tentativa de acelerar o início da votação.

O movimento foi feito para tentar fazer com que a votação acontecesse sem que a base governista reunisse os 48 votos necessários para aprovar o projeto, que constitucionalmente exige maioria qualificada de três quintos dos parlamentares da Casa.

No entanto, Amanda Teixeira Dias (PL) e Gustavo Valadares (PSD), ambos membros da situação, pediram o uso de seu tempo de fala pra protelar o início da votação e garantir que mais deputados governistas chegassem ao plenário.

Nas últimas semanas, ao longo da tramitação do projeto nas comissões, emendas foram adicionadas ao projeto original. Destaca-se a determinação da manutenção do emprego dos servidores por ao menos 18 meses; a exigência da meta de universalização dos serviços de água e esgoto em todos os municípios atendidos pela Copasa; e a manutenção da tarifa social prevista em lei federal para a população vulnerável.

Como tem ocorrido na Casa desde setembro — quando projetos relativos à venda da Copasa começaram a tramitar na Casa — as galerias do plenário e os corredores da Assembleia ficaram lotados de servidores da companhia em protesto por sua manutenção como uma empresa estatal.

O Governo de Minas defende a privatização da empresa como uma prerrogativa para a universalização do serviço de distribuição de água e coleta de esgoto, com a consequente adequação do estado ao Marco Legal do Saneamento.

A gestão de Zema ainda destaca que a venda da empresa resultará em recursos para investimentos no estado e o cumprimento de um dos requisitos estabelecidos no Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) para suprimir um ponto percentual de juros cobrados sobre o parcelamento do pagamento do débito de R$ 175 bilhões do estado com a União em até 30 anos.

Por outro lado, a oposição argumenta que iniciativas de privatização do serviço de saneamento foram frustradas mundo afora, com queda na qualidade do atendimento, aumento nas tarifas e negligência com regiões mais pobres.

O bloco Democracia e Luta ainda critica o alinhamento do governo estadual com investidores durante a tramitação dos projetos relacionados à privatização da Copasa na Assembleia. Em novembro, Romeu Zema teve reuniões com representantes do grupo BTG Pactual e da XP Investimentos. Além disso, a companhia contratou a consultoria da Ernst & Young Por R$ 5,5 milhões para a construção de um plano de lobby pela venda da empresa e a produção de relatórios de monitoramento de imprensa e autoridades.

A Copasa no Propag

O PL 4.380/2025 teve sua tramitação precedida por uma atribulada discussão da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/2023, também de autoria de Zema, que derrubou a exigência de um referendo popular para autorizar a privatização da Copasa.

A privatização da Copasa, bem como da Gasmig e da Cemig, já integrava a pauta do governo Zema desde o primeiro mandato, mas ganhou novo fôlego com a criação do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag). Com o projeto permitindo a privatização e federalização de ativos como forma de pagar a dívida com a União, vários projetos da pauta privatista do Executivo andaram na Assembleia após anos parados, incluindo os imóveis do estado.

O Propag prevê que estados refinanciem em 30 anos a dívida com a União e estabelece mecanismos para reduzir os juros cobrados sobre as parcelas. O projeto do Executivo Estadual é ingressar no programa abatendo 20% do estoque devido. Para obter o valor necessário na amortização da dívida, o Executivo enviou projetos para federalizar ou privatizar estatais à Assembleia.

Hoje os juros são indexados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mais 4% ao ano. Se o estado conseguir amortizar 20% do estoque da dívida, dois pontos percentuais da cobrança adicional são abatidos.

O que é o Propag

O Programa de Pleno pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) foi criado a partir das dificuldades encontradas pelo governador Romeu Zema (Novo) em aprovar a adesão de Minas Gerais ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) na Assembleia Legislativa (ALMG). Principal pauta do Executivo Estadual para lidar com a situação da bilionária dívida com a União, a medida foi considerada excessivamente austera pelos parlamentares e não caminhou na Casa.

O RRF foi instituído durante a presidência de Michel Temer (MDB) como uma forma de adequação orçamentária dos estados endividados. Durante nove anos de vigência do regime, os estados precisam conter investimentos, limitar os reajustes salariais dos servidores e congelar novos concursos para o funcionalismo público, por exemplo.

Sem conseguir aderir ao regime via Legislativa, Zema conseguiu o ingresso via Supremo Tribunal Federal em 2024. Minas, então, se somou a um grupo formado por Goiás, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, todos operando sob o RRF. Paralelamente à empreitada jurídica do governador, membros da oposição na Assembleia, o presidente da Casa, Tadeu Martins Leite (MDB), e o então presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), começaram a costurar o que viria a ser o Propag.

O projeto de lei complementar que propunha a criação do Propag foi aprovado no Congresso Nacional em dezembro de 2024, sancionado parcialmente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em janeiro do ano seguinte e regulamentado em abril.

O programa prevê a criação de condições para que os estados endividados com a União consigam parcelar o pagamento do débito em até 30 anos. Neste contexto, o Propag estabelece mecanismos para a redução dos juros cobrados sobre as parcelas, hoje calculados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) — que estabelece a inflação — mais 4% do estoque da dívida ao ano.

O ingresso no Propag deve ser decidido pelos estados até o fim deste ano e pode ser feito em diferentes modelagens, todas elas com a possibilidade da redução dos juros reais com a eliminação dos quatro pontos percentuais cobrados além da inflação.

O modelo escolhido pelo governo mineiro e em discussão com um pacote com mais de uma dezena de projetos enviados à Assembleia prevê a redução de dois pontos percentuais a partir do abatimento de ao menos 20% do estoque da dívida. Hoje, Minas deve cerca de R$ 175 bilhões à União e, portanto, precisaria pagar R$ 35 bilhões para atingir seu objetivo.

Esse pagamento pode ser feito a partir da federalização de ativos estatais para amortizar a dívida com seu repasse ao governo federal ou via privatização dos bens com uso do recurso para o abatimento do débito. Neste contexto estão os polêmicos debates de venda de imóveis do estado e da Copasa e da federalização da Codemig, há meses monopolizando a discussão no Legislativo mineiro.

Outro ponto percentual pode ser abatido com o compromisso de que a economia obtida com essa redução de juros seja reinvestida no estado. O uso do valor que não será pago em forma de dívida deve, portanto, ser aplicado em ações de segurança pública, ensino profissionalizante, infraestrutura e outras áreas nevrálgicas da estrutura do estado.

Por fim, mais um ponto percentual pode ser suprimido com a contribuição com o Fundo de Equalização Federativa. Instituído pelo próprio Propag, essa medida foi tomada como uma forma de negociar a aprovação do texto no Congresso junto a parlamentares de estados que não estão em dívida com a União e que viam no programa de refinanciamento uma iniciativa de favorecimento das unidades federativas em débito. Os valores destinados ao fundo serão redistribuídos entre os estados do país.

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Repórter de política da Itatiaia, é jornalista formado pela UFMG com graduação também em Relações Públicas. Foi repórter de cidades no Hoje em Dia. No jornal Estado de Minas, trabalhou na editoria de Política com contribuições para a coluna do caderno e para o suplemento de literatura.

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