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Custo estradas: pedidos de duplicação e décadas de espera

Quarta reportagem da série da Itatiaia aborda planejamento e recursos para estradas

Em Minas, a BR-367, que corta o Vale do Jequitinhonha, tem vários trechos de terra e aguarda pavimentação há décadas.

Um pedido e décadas de espera. A duplicação da BR 381, que liga Minas Gerais e o Espírito Santo, é uma das principais e mais antigas reivindicações de motoristas e mineiros que perderam amigos e familiares no trecho conhecido como rodovia da morte.

Também há décadas, as melhorias na 381 fazem parte de discursos políticos nas três esferas do poder. Constitucionalmente é de responsabilidade do setor público resolver as questões de infraestrutura do país, mas, por enquanto, foram só promessas.

A obra de duplicação da BR ensaiou sair do papel em 2014, durante o governo Dilma Rousseff (PT), quando o trecho de 303 quilômetros entre BH e Governador Valadares, em solo mineiro, foi dividido em oito lotes para serem licitados. Na época, apenas dois avançaram, os outros lotes foram abandonados pelas empresas que venceram as licitações.

Após 8 anos, somente 60 quilômetros do projeto foram concluídos.

Parceria público-privada

Desde 2018, o governo federal aposta no formato de parceria público-privada para duplicar a 381. Mas a sorte, até agora, parece não estar do lado da sociedade. A estrada, já ignorada pelo poder público, também não consegue atrair os olhares do setor privado. Por duas vezes o leilão para a concessão da BR-381 fracassou. Neste ano, uma nova esperança, como destaca o Ministro de Infraestrutura, Renan Filho.

“Conversei com o conselheiro relator do acordo de Mariana no CNJ. Ele garantiu que tem uma reserva de três a quatro bilhões para os investimentos da 381 e da 262. É um recurso que vai possibilitar duas coisas: ou aumentar o volume de obras ou baixar as tarifas da região. Porque como o trecho requer altos investimentos, ele também precisa ter um suporte de uma tarifa mais elevada do que a média. Então, esse recurso Mariana poderá ser utilizado para baixar a tarifa”, explicou. .

A tarifa deve ficar em torno de 18 reais, de acordo com o Ministro. Como não houve leilão, ainda não se sabe qual o desconto que será dado no leilão. Por isso a ideia de usar recursos do acordo de Mariana. “A gente entende que é uma tarifa cara, mas é um trecho que precisa ser concedido”, explica Renan Filho.

O edital para a concessão da BR-381, entre Belo Horizonte e Governador Valadares, foi publicado no início deste mês de Julho de 2023 e prevê investimentos de R$ 10 bilhões na estrada, que recebeu o apelido de ‘Rodovia da Morte’ pelos altos índices de acidentes fatais. O governo marcou a data do leilão da rodovia mineira para 24 de novembro, na B3, a Bolsa de Valores de São Paulo.

Planejamento

Ao longo da série, a Itatiaia ouviu especialistas para avaliar o impacto das estradas ruins na qualidade dos alimentos. Desperdício, custo alto das refeições, insegurança alimentar e menor tempo de prateleira foram alguns dos problemas já destacados. Mas também existe o impacto antes da produção no campo: na fase do planejamento. O presidente da Comissão de Agropecuária e Agroindústria, deputado estadual de Minas, Raul Belém, afirma que as estradas emperram o desenvolvimento de estratégias para o setor.

“Hoje nós demandamos estradas extremamente melhores e estamos enfrentando uma situação de termos estradas piores do que tínhamos há 20 anos, então é preciso investir, né? É preciso o governo estadual investir, o governo federal investir, é preciso entregar algumas estradas à iniciativa privada. Já entendemos que quandofalta recurso é importante essa essa parceria público-privada para poder fornecer a estrada em condições para que o Agro se desenvolva”, defendeu.

Na esfera municipal, mais impacto. Orlando Amorim, prefeito de Itabirito, na região Central de Minas, fala sobre os prejuízos financeiros para os cofres públicos da cidade.

“A logística é a coisa mais importante para qualquer negócio. Se você não tiver logística, saber onde tem que levar, a distância média de transporte, é lógico que ele não vai ser vantajoso no mercado se você não tiver condições de fazer um transporte de maneira que barateie o seu custo. Como que você vai colocar seu produto no mercado hoje?”, questiona.

Se a solução ainda não saiu da esfera das promessas, para tentar amenizar os prejuízos das estradas em condições ruins, empresas têm sido obrigadas a colocar a mão no bolso para se manterem competitivas no mercado. Isso consta em um recente estudo feito pela Confederação Nacional dos Transportes. O diretor executivo da CNT, Bruno Batista, afirma que as empresas têm arcado com contas que deveriam ser pagas pelos governos.

“Há três tipos de riscos. Primeiro, os riscos relacionados ao ambiente de negócios têm uma forte relação com o governo. A gente tá falando da cobrança de impostos, que pode aumentar, da insegurança jurídica e também da burocracia. Um segundo risco é o risco social, sobretudo aquele relacionado ao Crime Organizado. Aqui a gente tá falando de roubo de cargas, que é uma atividade ilícita que tem crescido muito sobre o setor. Então hoje, se furtam cargas do transporte rodoviário, nas hidrovias, nos portos e agora até mesmo no setor ferroviário. E por fim o terceiro grande risco é o risco econômico. Aqui nós estamos falando da falta de investimentos por parte do governo, das dificuldades de acesso ao crédito. Então tudo isso pode fazer com que o empresário se sinta menos seguro e invista menos. O que nós percebemos é que, de forma geral, as empresas têm algum nível de preparação, até porque elas precisam sobreviver no mercado concorrencial e também superar esses grandes riscos que acabam impactando a sua atuação, em maior ou menor escala”, explicou.

Enquanto a sociedade e o setor produtivo cobram melhorias, Governos de Minas e Federal trocam acusações e responsabilidades. Recentemente, o Governador de Minas Gerais, Romeu Zema, do Partido Novo, e o Ministro do Governo Lula, Alexandre Silveira, do PSD, trocaram farpas em decorrência das estradas. Zema criticou a falta de investimentos nas rodovias federais, de responsabilidade do Governo petista. Já Silveira reconheceu que há problemas nas rodovias federais, mas disse que o problema é mais amplo e engloba também as MGS, de responsabilidade do Governo Zema.

Investimento

Mais problema e menos dinheiro. O investimento do Estado para obras rodoviárias caiu 50% nos últimos anos. Em 2015, foram destinados quase 592 milhões de reais, quando 9,8% das estradas estaduais estavam em mau estado de conservação. Esse percentual subiu para 15,9% em 2018, mas os investimentos na área caíram para cerca de R$ 300 milhões. O diretor-presidente do DER –Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais, Rodrigo Tavares, destaca as prioridades do Governo.

“O triângulo, realmente, é uma é uma área bastante afetada, já que tem uma produção agropecuária bastante pujante, o que demanda muitas nossas rodovias. De forma geral, é a condição da malha, ela tá bem desgastada no estado inteiro, o que o exige da gente investir em todas as regiões. Então a gente tem investimentos na região Norte, Jequitinhonha, Mucuri, Zona da Mata, Leste, Sul de Minas. A gente tem procurado investir um pouco em cada região para poder, de forma global, atender todo o estado”, completou.

O Governo de Minas afirma que, quando 2023 terminar, o Estado terá investido 800 milhões nas estaduais e anunciado lotes de privatizações de estradas em diferentes pontos do Estado.

As privatizações também foram a saída encontrada pelo governo Federal. Além da 381, abordada no início da matéria, a 040 também entrou no pacote.

Apesar dos discursos e desencontros, o Governo Zema e o Governo Lula encontram pontos comuns para otimizar as estradas. Após quatro adiamentos, a União anunciou que vai lançar no dia 11 de agosto o PAC 3, Programa de Aceleração do Crescimento. A expectativa é que o governo reserve cerca de R$ 60 bilhões para investimentos em infraestrutura no país, no entanto, o montante não deve ser suficiente para atender a todas as demandas apresentadas pelos estados.

Minas apresentou uma lista de demandas que contempla, além da 381 e da 040, a BR-262, entre Betim e Uberaba no Triângulo Mineiro, e para melhorias nas BR-s 251, 116, 135 e 352.

Também pediu a pavimentação da BR-367, que atravessa o Vale do Jequitinhonha. Apesar de ser uma rodovia federal, ela tem trechos ainda que são de terra.

Repórter de política na Rádio Itatiaia. Começou no rádio comunitário aos 14 anos. Graduou-se em jornalismo pela PUC Minas. No rádio, teve passagens pela Alvorada FM, BandNews FM e CBN, no Grupo Globo. No Grupo Bandeirantes, ocupou vários cargos até chegar às funções de âncora e coordenador de redação na BandNews FM BH. Na televisão, participava diariamente da TV Band Minas e do BandNews TV. Vencedor de 8 prêmios de jornalismo. Já foi eleito pelo Portal dos Jornalistas um dos 50 profissionais mais premiados do Brasil.