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Inteligência artificial pode prever surtos de doenças tropicais

Sistema é mais abrangente que similares e usa dados do Brasil

Estudo usou dados de bairros do Rio de Janeiro

Indicadores ambientais (temperatura e nível de precipitação), de saúde (casos confirmados da doença nos últimos meses), demográficos e espaciais podem ajudar a prever surtos de doenças tropicais, como dengue, zika e chikungunya, com até três meses de antecedência. Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal do ABC (UFABC) criaram o sistema de aprendizado de máquina que vai permitir isso.

A inteligência artificial foi treinada com informações públicas de 160 bairros do Rio de Janeiro — provenientes de diferentes bases da prefeitura —, coletadas entre 2015 e 2020, e, no futuro, poderá ser usada por prefeituras de todo o país. Ela vai ser capaz de calcular as probabilidades de epidemias. O estudo, intitulado “Predicting Dengue Outbreaks with Explainable Machine Learning”, foi premiado na Itália durante o Workshop Internacional AI4Health.

Segundo os cientistas, já existem algoritmos similares tanto no Brasil quanto em outros países tropicais (como Indonésia, Tailândia e Malásia), mas a nova criação é mais abrangente. “Essas pesquisas, em geral, apresentam pouca variedade de dados, poucas análises para a validação dos resultados e os modelos, em sua maioria, utilizavam regressão linear, com baixa quantidade de métricas”, conta Robson Aleixo, pesquisador da USP.

Além disso, ele destaca que não havia muitas análises sobre a interpretabilidade dos modelos. “O objetivo deste trabalho foi lidar com as correlações não lineares e com um modelo que pudesse ser aplicado em diferentes cenários, avaliado em diferentes perspectivas, considerando quatro métricas de desempenho e explicando suas previsões.”

Principais indicadores de uma epidemia

Novas epidemias de dengue, zika ou chikungunya estão relacionadas com:

  • número de casos da doença registrados no último mês;

  • histórico de casos em um bairro em comparação com o restante da cidade;

  • avaliação dos índices de precipitação, ou seja, se choveu muito ou não na região.

Raphael Yokoingawa de Camargo, da UFABC, diz que a avaliação das condições dos bairros vizinhos é igualmente importante. “Inclusive se existem bairros muito próximos em que houve muitos casos. Tudo isso será usado para obter um conjunto de predições para cada bairro”, aponta. Para os pesquisadores, a ferramenta pode ajudar gestores a repensarem estratégias e redirecionarem recursos para as áreas mais afetadas.

A tecnologia ainda precisa de uma interface que torne os resultados compreensíveis para quem não domina linguagens da programação. “Precisaríamos aprimorar o modelo com melhores características como, por exemplo, pensar como os sorotipos da dengue e outros indicadores da doença poderiam interferir”, diz Camargo. Para isso, são necessárias novas parcerias para que o desenvolvimento da solução continue.