Ao longo dos últimos anos, especialistas ocupados dos desafios climáticos têm feito um esforço crescente para mostrar que o aquecimento do planeta, além de questão ambiental urgente, embute também uma variável econômica que não pode ser desprezada. E uma fatia cada vez maior da comunidade de negócios parece aderir à ideia de que a transição para uma economia verde pode ser lucrativa.
“Already a Multi-Trillion-Dollar Market: CEO Guide to Growth in the Green Economy” (“Um Mercado de Trilhões de Dólares: Guia do CEO para o Crescimento na Economia Verde”) é um estudo que acaba de ser finalizado e tornado público por CEOs que formaram uma aliança pelo clima no âmbito do World Economic Forum, em parceria com a consultoria Boston Consulting Group (BCG).
O relatório mostra casos reais de como empresas visionárias conseguiram transformar a participação naquele segmento em vantagem competitiva.
O trabalho estima que o ritmo de crescimento nesse campo em nível global já ultrapassou a barreira dos US$ 5 trilhões anuais, podendo superar os US$ 7 trilhões até 2030. Seu ritmo de crescimento perde apenas para o setor de tecnologia e as oportunidades de negócios que proporciona se multiplicam duas vezes mais rápido que as receitas obtidas em transações convencionais.
Mais do que isso, empresas engajadas com os princípios ambientais frequentemente garantem capital mais barato e são avaliadas de forma mais positiva. As organizações que geram mais de 50% de suas receitas nesse ambiente de consumo frequentemente desfrutam de prêmios de avaliação de 12% a 15% nos mercados de capitais, refletindo a confiança dos investidores em sua resiliência e lucratividade a longo prazo.
Ao comentar os resultados, Pim Valdre, chefe de Economia do Clima e da Natureza do Fórum Econômico Mundial, diz: “Dois anos atrás, no livro Winning in Green Markets: Scaling Products for a Net Zero World, do Fórum Econômico Mundial, argumentamos que ser pioneiro em mercados verdes é uma aposta que daria certo (...). Apesar dos atuais ventos contrários para a ação climática global, este relatório mostra que esta não é uma oportunidade distante, mas um dos principais motores de crescimento desta década”.
A queda no custo de tecnologias que permitem avançar nessa direção tem ajudado bastante. Desde 2010, o custo da energia solar fotovoltaica e das baterias de lítio caiu cerca de 90% e o do sistema de energia eólica offshore outros 50%, tornando as soluções de baixo carbono cada vez mais competitivas. O relatório calcula também que 55% das reduções globais de emissões necessárias para a descarbonização podem ser alcançadas com soluções já competitivas.
Os investimentos mais pesados em relação a energias limpas tem a liderança da China, que aportou US$ 659 bilhões nesse caminho e já é responsável por mais de 60% das novas camadas de soluções renováveis a serem incorporadas globalmente até 2030. O país lidera com folga o número de patentes para energia solar, veículos elétricos e tecnologias de baterias, criando cadeias de suprimentos eficientes que permitem exportar suas soluções para diferentes continentes.
Outro peso pesado global do setor de consultorias, a McKinsey é ainda mais otimista ao considerar o potencial dos negócios da economia verde: estima que eles podem alcançar um patamar entre US$ 9 trilhões e US$ 12 trilhões em 2030. Essa é uma das conclusões do seu Green Business Building (GBB) Global Summit realizado em meados deste ano em Estocolmo. O encontro contou com 350 participantes (executivos de grandes empresas e startups, empreendedores e investidores) que compõem todo um ecossistema relacionado aos negócios verdes.
Um recorte específico sobre as empresas europeias mostrou que elas precisarão encurtar os ciclos de inovação e reconhecer que baixar custos é imprescindível na corrida por esse mercado onde os chineses são os maiores protagonistas.
O encontro de Estocolmo, a propósito, fez menções não apenas aos competidores asiáticos mas também aos americanos, considerados mais rápidos e eficientes do que os europeus quando se trata de boa gestão para atuar em nichos verdes.
As condições do setor de veículos elétricos (EV) foram amplamente discutidas como fonte de lições sobre como reforçar a competitividade do continente e evitar a erosão de sua fatia de mercado em áreas estratégicas nos próximos anos. As empresas chinesas de EV superam as concorrentes europeias na capacidade de produzir com menores recursos, com uma vantagem estimada em 20%. Resultado disso são carros elétricos mais baratos que já levaram as montadoras asiáticas em 2025 a uma participação de 8% no continente naquele segmento, mesmo com tarifas de importação de 45% impostas a elas pela União Europeia.
Criar parcerias em lugar de bater de frente na briga por consumidores tem sido um caminho. O grupo Stellantis (que congrega as marcas Fiat, Jeep, Peugeot, Citroen,
Alfa Romeo, Chrysler, RAM) se tornou acionista da fabricante chinesa de veículos elétricos Leapmotor em 2023, ampliando assim seu portfolio nesse segmento.
Já a Renault fechou parceria estratégica com a chinesa Geely, cujos modelos elétricos serão produzidos na fábrica da marca francesa no Paraná.
Ambas, Leapmotor e Geely, estiveram presentes com estandes próprios no Salão do Automóvel realizado em novembro em São Paulo.
Delloite, outro gigante global do ramo das consultorias, entende que o Brasil está bem posicionado para se tornar efetivo protagonista no ambiente de uma economia verde, graças a sua biodiversidade, matriz energética e disponibilidade tanto de água quanto de solo fértil.
Pesquisa realizada com lideranças do cenário corporativo mostra, no entanto, que apesar daquele potencial, 26% dos respondentes afirmam que o país ainda não está bem preparado para um processo efetivo de transição. Uma limitada percepção acerca do retorno financeiro da adoção de práticas sustentáveis e uma cultura organizacional que privilegia o curto prazo são apontados pela maioria dos participantes como obstáculos naquela direção.
A necessidade de investir na transição verde ainda não é tratada como prioridade estratégica, ainda que 70% dos executivos reconheçam que as mudanças climáticas já impactam seus mercados indica ainda a Deloitte. Em outras palavras, mesmo quando existe o entendimento de que soluções inovadoras podem ser lucrativas e as mudanças positivas, as apostas nessa direção são lentas, graduais e cautelosas.
Apresentado em Nairobi, no Quênia, nesta segunda semana de dezembro, o Global Environment Outlook GEO 7, relatório do Programa das Nações Unidas sobre Meio Ambiente (Pnuma) evidencia números e conclusões preocupantes. O documento, resultado das visões de 287 especialistas de 82 países, aponta que mantido o cenário atual, as mudanças climáticas reduzirão o Produto Interno Bruto (PIB) global anual em 4% até 2050, aumentarão a migração forçada e causarão milhões de mortes.
E defende o trabalho conjunto de governos e sociedade civil para mudar o curso de abordagens econômicas e financeiras tradicionais, além da necessidade de se repensar o uso de energia, a questão da alimentação e a gestão de resíduos.
Um esforço amplo dessa natureza poderia “até 2050 evitar nove milhões de mortes prematuras relacionadas à poluição, tirar 200 milhões de pessoas da subnutrição e erradicar a pobreza extrema de 150 milhões de indivíduos”, calcula o relatório. Ao mesmo tempo, o Pnuma sinaliza: benefícios macroeconômicos em
nível global resultantes de uma guinada verde começariam a aparecer em 2050, permitindo ganhos equivalentes a US$ 20 trilhões por ano até 2070.